O reinado de Momo começa na Sexta-feira Gorda e termina na Quarta-feira
de Cinzas. Mesmo assim, 136 blocos voltaram às ruas de São Paulo (e mais de 40
nas do Rio) no último final de semana. Talvez inspirado nessa zorra, o presidente Jair Bolsonaro, que já havia se esbaldado em
desatinos durante o Carnaval, voltou à carga no último domingo, desta feita
para investir contra dois veículos da imprensa com um só tuíte — como se vê, a prática leva à perfeição.
Baseado em informações falsas divulgadas por
um site chapa-branca, sua excelência endossou a tese que atribuiu à
jornalista Constança Rezende, do Estado, a declaração de que teria
"intenção" de "arruinar seu filho Flávio e o governo", além de mencionar que ela é filha de Chico Otávio, repórter de O Globo. A conversa, em inglês, tem frases truncadas e com pausas; só
trechos selecionados foram divulgados, mas em nenhum deles se ouve a jornalista dizer o
que Bolsonaro (Jair ou Carlos, sabe-se
lá) disse que ela disse. Sem embargo, apoiadores do Mito promoveram no Twitter uma série de postagens acusando
o Estado de "mentir" na
cobertura do caso Flávio Bolsonaro.
Se criar esse tipo de rebosteio (indesejável e totalmente
dispensável) é uma estratégia do presidente, como insinuou a líder do governo no
Congresso, deputada Joice Hasselmann,
à jornalista Renata Lo Prete, da Globo News, não cabe a mim dizer.
Pode até ser. Mas que sentido há em fomentar dissenções para agradar apoiadores atávicos
— fanáticos que aceitam qualquer coisa, a exemplo da militância petista e
outros devotos da seita do inferno, para quem qualquer flatulência verbal de Lula, Gleisi e distinta companhia é motivo de comemoração —, quando muita
gente (talvez a maioria) que votou em Jair
Bolsonaro não o fez por opção, mas por absoluta falta de alternativa?
Às vezes, a impressão que se tem é que o presidente, a
exemplo de alguns ministros supremos que vestiram a toga por cima da farda de
militante petista, vestiu a faixa presidencial sobre o terno de cerimônia, mas
não despiu a indumentária de candidato. Só que a eleição terminou em outubro,
já estamos em março, e a reforma da Previdência ainda patina. Se não for
aprovada, o governo corre
o risco de ir a pique ainda mais depressa que a gestão-tampão de Michel Temer. Mesmo assim, em míseros oito dias, Bolsonaro se desmanchou em
elogios ao ditador paraguaio Alfredo
Strossner, atribuiu às Forças Armadas a função de “baluarte” da Democracia,
tuitou um vídeo escatológico (a pretexto de chamar a atenção da população para
o poço de obscenidade que são os blocos carnavalescos — isso no país em que o
Carnaval é, talvez, o maior cartão postal), atacou jornalistas e cometeu mais
uma série de “deslizes” que eu prefiro nem relembrar.
É obrigação dos brasileiros de bem — parafraseando o próprio
presidente — apoiar o governo e torcer para que ele dê certo. À oposição, cabe
fazer sua parte, embora o que o PT
e os satélites dessa seita maldita consideram “oposição” está
mais para caso de polícia do que de política (o que não surpreende,
considerando que sumo pontífice da caterva está cumprindo pena e responde a
mais de meia dúzia de processos criminais). Mas não dá para aplaudir os excessos
presidenciais, sobretudo quando Bolsonaro flerta com a irresponsabilidade.
Felizmente, há um governo tomando conta do governo, formando
uma espécie de “cordão sanitário” em torno do presidente, buscando evitar
desvarios e aplicar as medidas corretivas possíveis quando a prevenção não é suficiente para evitar o mal. Mas é triste ver que o chefe do
Executivo e sua prole têm de ser mantidos na rédea curta por um núcleo militar,
e que o Congresso não se dê conta da importância do momento que vivemos — ou
não esteja à altura dele.
É certo que nosso Parlamento está apinhado de corruptos, mas
também é certo que houve uma renovação significativa nas últimas eleições. Com alguma
(ou muita) sorte, talvez tenhamos algumas surpresas (boas, para variar) e cheguemos
a 2022 sem maiores turbulências. Depois, Deus pensa.