A certa altura em uma entrevista já como o próximo
presidente do Brasil, Jair Bolsonaro
disse que seu governo, entre diversas outras coisas, vai “diminuir” as verbas
que o Erário paga hoje a uma certa rede de televisão e a um certo jornal diário
para publicarem anúncios de propaganda oficial. Há pelo menos um erro sério
nessa promessa: o verbo “diminuir”. A única palavra correta no caso, já que ele
tocou no assunto das relações entre imprensa e governo, é “acabar”. Para os
dois, a televisão e o jornal? Sim, para os dois — e para todos os outros
veículos de comunicação do Brasil, sem nenhuma exceção.
Por que contentar-se em roubar menos da população que paga
por tudo isso, se há a oportunidade de não roubar nada? É a coisa mais fácil do
mundo. Não existe nenhuma lei que obrigue o governo a jogar dinheiro fora com a
imprensa. Não é preciso pedir licença ao STF
ou ao Congresso, por mais que ambos acabem passando mal com isso. Também não há
que pedir autorização da ONU, como o
PT poderia exigir. Basta decidir que
a partir de 1º de janeiro de 2019 o Tesouro Nacional não pagará mais nem um
tostão para publicar anúncios na mídia deste país.
O fato é que não poderia haver momento melhor para começar a
limpeza dessa usina de lixo que se chama “área de comunicação social do
governo”. A maioria dos jornalistas brasileiros, com a concordância de seus
empregadores, está combatendo há meses numa guerra sem quartel contra os
perigos de ditadura que, segundo eles, apareceram no Brasil com o novo
presidente. Então: propaganda para as massas, elites e tudo o que vem no meio
das duas é uma das armas mais perversas das tiranias em todo o mundo e em todas
as épocas. Que tal ficarmos livres dessa — pelo menos dessa?
Bolsonaro, ao acabar com tamanha
lavagem cerebral, estaria fazendo um gesto de paz para acalmar um pouco os
comunicadores. “Estão vendo?”, poderia perguntar. “Vou abrir mão dos bilhões
que tenho para comprar a aprovação da opinião pública”. Os jornalistas e seus
patrões, por seu lado, não poderiam reclamar por estar perdendo essa dinheirama
— fica ruim, de fato, falar mal da ditadura porque o ditador parou de lhes
pagar. Além do mais, por que não reclamam de nada hoje? Já recebem dinheiro
sujo. Não ficará limpo com o fascismo que anunciam.
O fato, para não ficar enganando o leitor com complexidades
que não existem, é que, de todos os 1.001 pés-de-cabra à disposição do governo
para roubar dinheiro do contribuinte, a propaganda oficial é um dos mais
hipócritas. Não tem nada de pública — ao contrário, é puro negócio privado, bom
só para quem manda no governo, os donos e empregados dos órgãos de imprensa e
todos os intermediários que se movem entre uns e outros. Não tem a menor
utilidade para o cidadão. Também não há ninguém pedindo “comunicação”.
Você já
viu alguma multidão sair à rua exigindo “publicidade já?”. Não existe em
democracia alguma do planeta; ninguém jamais ouviu falar em “Inglaterra para
Todos”, ou “Acelera, Holanda”. Em compensação, é oxigênio puro para ditaduras e
governos de países subdesenvolvidos pelo mundo afora. Fala-se, é claro, na necessidade
de publicar editais, leis, nomeações e outros atos do governo. Parem de fingir.
Tudo isso pode ser escrito no Diário Oficial, que já é do poder
público e tem de ser divulgado de qualquer jeito. Quem estiver interessado que
compre — ou que se paguem os trocados que a mídia privada cobra por esse tipo
de anúncio. Mas não é disso que estamos falando, não é mesmo? O que interessa é
o dinheiro grosso que os governos pagam para dizer como são bons para você.
Bolsonaro fala em “critérios técnicos” para distribuir a
publicidade em seu governo. Que piada. Não há aí nada de critério nem de
“técnico” — é puro desvio de dinheiro público para bolso privado. Esqueçam as
“campanhas de vacinação” que a mídia divulga em seu noticiário normal, ou “a
obrigação de prestar contas ao público”. Quem está interessado, ou acredita,
nisso?
E os “pequenos veículos”, ou grandes, que morreriam sem a propaganda
oficial? Problema deles — que arrumem leitores e anúncios privados para ganhar
sua vida. A verdade é uma só: o cidadão vai economizar bilhões com o fim da
“comunicação social transparente”, sem contar o que deixará de ser gasto com os
milhares de funcionários empregados nesse falso serviço. Um governo que tem
cerca de 800.000 servidores na ativa tem também a obrigação de tirar dali os
que são realmente necessários para o trabalho de comunicação que realmente deve
ser feito. O resto é safadeza.
Texto de J.R. Guzzo