Nem todo mundo sabe que, na origem da expressão conto-do-vigário, não há um golpista de
batina. O vigário entrava na história apenas para agregar respeitabilidade à
lorota do trapaceiro. O sentido, que todo mundo conhece, é de trapaça, ou seja,
o vigarista tece uma história
rebuscada, geralmente envolvendo uma grande soma em dinheiro, com o intuito
de explorar a ingenuidade ou a cobiça das vítimas. Nada muito
diferente, aliás, do que fazem os políticos nos palanques, do alto dos quais buscam votos mediante
promessas que jamais irão cumprir.
Um bom exemplo é a autodeclarada alma viva mais honesta do Brasil, cuja
trajetória política, de tão imaculada, garantiu-lhe nada menos que 7 ações
criminais e (por enquanto) uma condenação a 12 anos e um mês de prisão. Concluindo
esse preâmbulo, segue a transcrição da coluna de J.R. Guzzo, que foi publicada na edição impressa de Veja desta semana.
Está sendo feita hoje
no Brasil o que talvez seja a maior campanha pela ilegalidade já tentada neste
país desde que os acionistas majoritários da vida pública nacional resolveram
que isso aqui deveria ficar com cara de lugar sério e fizeram uma Constituição
com 250 artigos e mais de 100 emendas — sendo que boa parte dessa maçaroca não
foi regulamentada até hoje, de maneira que não dá para saber direito o que vale
e o que não vale. Escreveram mais leis do que qualquer outro país do planeta.
Criaram uma espécie de Espírito Santo
chamado “instituições”, ente invisível que flutua em cima de tudo e de todos,
embora muito pouca gente saiba realmente o que vem a ser isso.
O tempo e os fatos
mostraram que esse esforço para montar um Brasil civilizado se transformou numa
piada — na verdade, a democracia moderna que se pretendia criar foi sendo
desmanchada, na prática, a cada artigo da Constituição que ia sendo escrito. A
ofensiva, agora, é para desmontar de vez o princípio básico segundo o qual a
lei tem de ser obedecida por todos. É isso, e apenas isso, que quer dizer a
campanha para soltar o ex-presidente Lula da cadeia, achar um jeito para ele
concorrer à próxima eleição presidencial e garantir que volte ao Palácio do
Planalto.
Trata-se de um conto
do vigário de tamanho inédito, a começar pela ambição da mentira contada ao
público. Nada do que o sistema de apoio a Lula
pretende, e que a mídia divulga diariamente como a coisa mais normal do mundo,
pode ser feito sem desrespeitar a lei. É como se alguém quisesse participar de
um concurso popular para ser escolhido imperador vitalício do Brasil, ou algo
parecido — não dá para fazer uma coisa dessas, não é mesmo? Mas é este o tema
número 1 do debate político do momento.
Lula, como se sabe, está
no xadrez, condenado a doze anos de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro.
Recebeu sua sentença de condenação na 13ª. Vara Criminal da Justiça Federal em
Curitiba, no dia 12 de julho de 2017, e de acordo com a lei, recorreu em
liberdade da decisão. Essa sentença foi confirmada e aumentada seis meses
depois, em 24 de janeiro de 2018, por unanimidade de votos, por três
desembargadores do TRF-4 de Porto
Alegre, o tribunal superior encarregado de julgar o caso. No último dia 7 de
abril, enfim, não havendo mais nada a se fazer, Lula foi preso. Ao longo dessa história, seus advogados entraram
com mais de 70 recursos; não dá para dizer, em nenhum momento, que qualquer dos
direitos do réu para se defender foi violado.
O ex-presidente está
na cadeia porque não poderia, muito simplesmente, estar em nenhum outro lugar —
é para lá que a lei penal manda os criminosos depois de condenados em segunda
instância. Fazer o quê? Muita gente pode achar que a sentença foi injusta,
assim como há muita gente achando que foi justíssima. Mas achar uma coisa ou a
outra não muda nada. Só a Justiça, e
ninguém mais, tem autorização para resolver, no fim de todas as contas, se
alguém é culpado ou não. Em algum momento, mais cedo ou mais tarde, o
sistema judiciário precisa dizer se as provas apresentadas contra o réu são
válidas ou não; se forem consideradas válidas, o sujeito vai para a
penitenciária. Isso não depende da opinião de quem gosta de Lula ou de quem não gosta. É a lei que
decide ─ e ela é igual para todos. Ou se faz assim ou ninguém é condenado
nunca, porque os advogados vão continuar dizendo até o fim da vida que seus
clientes não fizeram nada de errado.
Só que Lula e os seus fiéis não aceitam isso.
Obviamente, um indivíduo que está preso não pode, ao mesmo tempo, ser
presidente da República. A saída da esquerda, então, tem sido manter de pé
uma fake news monumental — Lula é um “preso político” que tem de ser solto para candidatar-se
à Presidência, ganhar a eleição e recomeçar os seus “programas sociais” em
favor dos pobres. Além do mais, “todas as pesquisas” dizem que o presidente tem
de ser ele. Onde já se viu uma bobagenzinha como a aplicação da lei penal, mais
a Lei da Ficha-Suja, ficarem atrapalhando tamanho portento?
É essa novena que vem
sendo pregada todos os dias pelo Brasil
pró-Lula ─ artistas, “intelectuais”, “celebridades”, a maior parte da
mídia, a Rede Globo, os
empreiteiros de obras, os fornecedores de lixo enferrujado para a Petrobras e
todos os que estão impacientes para voltarem a roubar em paz. Não há nem sequer
uma sombra de presença do povo brasileiro, não do povo de verdade, em nada
disso aí. É pura sabotagem contra o que ainda sobra de nossa escassa
legalidade.
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