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terça-feira, 17 de setembro de 2019

SUTILEZAS DO MOTOR DE CICLO OTTO — CURSO DO PISTÃO, BIELA E TAXA DE COMPRESSÃO


NÃO SAQUE A ARMA SE NÃO FOR ATIRAR. SE ATIRAR, ATIRE PARA MATAR. MORTOS NÃO VOLTAM PARA SE VINGAR.

Os componentes de um motor de combustão interna moderno são basicamente os mesmos que eram usados em meados do século passado. O ciclo Otto, patenteado em 1877, não só continua presente nos propulsores atuais como ainda é o mais utilizado em veículos de passeio (motores de ciclo Diesel são comuns na Europa, mas não no Brasil, onde o preço do óleo é subsidiado e, portanto, essa opção é restrita a caminhões, ônibus e outros utilitários).

O fato de nos mantermos fiéis a uma tecnologia dos tempos de antanho não significa a evolução tecnológica não cumpriu seu papel, mas apenas que os princípios básicos continuam valendo, já que o funcionamento do motor pode ser descrito como a transformação da energia química do combustível na energia mecânica resultante da compressão e queima da mistura ar-combustível, no interior da câmara de explosão, mediante a movimentação dos pistões. Para gerar torque e potência (volto a esses conceitos oportunamente), os pistões dos motores de ciclo Otto realizam quatro fases a cada volta completa do virabrequim (também chamado de eixo de manivelas).

Já vimos que os cilindros — que podem ser em número de 3, 4, 5, 6, 8, 10 e até 12 — ficam no bloco do motor, e que, no interior de cada um deles, um pistão, ligado ao virabrequim pela respectiva biela, percorre seu curso milhares de vezes por minuto, alternando movimentos ascendentes e descendentes. Por curso, entenda-se a distância que o êmbolo percorre do ponto morto superior até o ponto morto inferior (ou vice-versa). O PMS corresponde à posição mais próxima do cabeçote que o êmbolo alcança, e o PMI, à mais distante. Ao longo das quatro fases (ou quatro tempos) do ciclo Otto, o pistão percorre 4 vezes a distância entre esses dois pontos. 

A taxa de compressão de um motor à combustão corresponde ao número de vezes que a mistura ar-combustível é comprimida. Esse parâmetro depende diretamente do curso do pistão: quanto mais longo ele for, mais vezes a mistura será comprimida no interior da câmara de combustão, que é espaço entre remanescente entre cabeça do pistão, quando este alcança o ponto morto superior (PMS) do curso, e a base do cabeçote — mais exatamente o rebaixo circular, com diâmetro correspondente ao do cilindro, onde ficam as válvulas de admissão e de escapamento.

curso do pistão depende diretamente do tamanho da biela (vide figura), que é o componente responsável por transformar o movimento de sobe e desce do êmbolo (retilíneo, portanto) no movimento circular contínuo do volante do motor (disco metálico que fica na extremidade posterior do virabrequim). Explicando de outra maneira: cabe à biela transmitir a força gerada na câmara de combustão (recebida pelo pistão) para a árvore de manivelas (ou virabrequim), cuja função é gerar e enviar (através do volante) torque, força e rotação ao sistema de transmissão.

A parte superior da biela, chamada de , é presa ao pistão por meio de um pino. Isso permite que a peça oscile lateralmente enquanto se move para cima e para baixo. A parte inferior, chamada de cabeça, é presa ao virabrequim, que transforma em rotação o movimento retilíneo do pistão. Como a biela é um componente "físico", a compressão é sempre a mesma, independentemente do regime do regime de giros do motor (RPM), do combustível utilizado e das exigências do veículo em cada situação específica. Daí os engenheiros terem de adequar, em nível de projeto, a taxa de compressão do propulsor ao combustível que será utilizado, levando em conta o desempenho que se pretende extrair do mecanismo.

Nos modelos à gasolina a mistura é comprimida cerca de 10 vezes, em média (taxa de compressão de 10:1), ao passo que as versões a etanol trabalham com relações entre 14:1 e 16:1.

Observação: Em tese, quanto maior for a taxa de compressão, tanto maior será a energia resultante da expansão dos gases durante a combustão (ou seja, mais força será repassada ao virabrequim e deste, através do volante, para o sistema de transmissão). Na prática, porém, há limites a observar, a começar pelo ponto de detonação do combustível. Vale lembrar que nossa gasolina é de péssima qualidade, e que a batida de pino provocada por uma taxa de compressão muito elevada pode produzir sérios danos aos componentes internos do motor.

Uma vez que a biela é um componente "físico", o grande desafio dos projetistas está nos motores flexíveis. Como vimos, gasolina e etanol funcionam melhor com taxas de compressão diferentes, e a solução, pelo menos por enquanto, consiste em estabelecer um meio-termo, embora o ideal fosse alterar a compressão em tempo real, da mesma maneira que o sistema de injeção eletrônica de combustível faz com a taxa estequiométrica (volto a esse assunto mais adiante).

Nissan vem trabalhando num projeto nesse sentido, e a Porsche já registrou a patente de uma biela com cabeça articulada num excêntrico, cujo movimento ascendente e descendente, controlado por dois tirantes hidráulicos, permite variar o volume da câmara de combustão, elevando a taxa de compressão quando o turbo está funcionando com pressão máxima. No caso dos motores flex aspirados, essa tecnologia possibilitará ajustar a compressão ao etanol, à gasolina ou à mistura de ambos, com sensíveis melhorias tanto no desempenho quanto no consumo e na emissão de poluentes.

Continua no próximo capítulo.

quarta-feira, 28 de agosto de 2019

AINDA SOBRE MOTORES DE COMBUSTÃO INTERNA DO CLICO OTTO (CONTINUAÇÃO)

TUDO QUE SOBE TEM QUE DESCER.

Destrinchando melhor o que vimos nos capítulos anteriores, motores de quatro tempos (ciclo Otto) dividem-se, grosso modo, em três partes: Cabeçote, bloco e cárter.

O número de cilindros — que ficam no bloco — varia conforme o projeto; aqui pelas nossas bandas, a maioria dos veículos de fabricação recente utiliza motores com 3 ou 4 cilindros, mas isso não significa que não existam modelos com 5, 6, 8 e até 12 cilindros.

No interior cada cilindro, um pistão (ou êmbolo), ligado ao virabrequim por uma biela, sobe e desce milhares de vezes por minuto, conforme o regime de rotações (RPM) do motor. À distância que ele percorre do ponto morto superior (PMS) ao inferior (PMI) e vice-versa dá-se o nome de "curso", e esse curso é determinado pelo tamanho da biela.

Como o êmbolo sobe e desce duas vezes a cada volta do virabrequim, são quatro as fases (ou tempos) do ciclo Otto: admissão, compressão, explosão e descarga, mas apenas a fase de explosão (ou combustão) que produz energia — daí ela ser considerada como o ciclo de força ou ciclo ativo do motor (mais detalhes na postagem anterior).

Para sincronizar o movimento dos pistões com a abertura e o fechamento das válvulas, engrenagens posicionadas nas extremidades dianteiras do eixo-comando de válvulas e do virabrequim trabalham interligadas por uma correia sincronizadora (feita de borracha combinada com cintas de aço). Alguns fabricantes optam pela "corrente de sincronização", que, por ser de metal e trabalhar com lubrificação, têm vida útil superior, mas costuma ser barulhenta e custar mais caro na hora da troca. 

Tanto num caso como no outro, deve-se substituir esse componente e seu respectivo atuador de tempos em tempos (consulte o manual do seu veículo para saber a frequência indicada pelo fabricante). Em caso de quebra, o sobe e desce dos pistões e o abre e fecha das válvulas perdem o sincronismo. Além de deixar o motorista a pé, isso pode causar entortamento de válvulas, empenamento do cabeçote e danos a outros componentes internos do motor.

Voltando às válvulas nos quatro tempos do ciclo Otto:

1) Na fase de admissão, somente as válvulas de admissão se abrem, fazendo com que a mistura ar-combustível seja aspirada para o interior do cilindro pelo movimento descendente do pistão;

2) Na fase de compressão, tanto as válvulas de admissão quanto as de escapamento se fecham, garantindo que o movimento ascendente do êmbolo comprima a mistura dentro da câmara de combustão (por câmara de combustão, entenda-se o espaço que sobra entre a base do cabeçote e cabeça do pistão quando este último alcança o PMS);

3) Na fase de combustão, as válvulas de admissão e de descarga permanecem fechadas enquanto a centelha produzida pela vela de ignição inflama a mistura e a "explosão" resultante empurra o êmbolo de volta ao PMI, produzindo a energia mecânica que é transmitida pela biela ao virabrequim;

4) Na fase de exaustão (ou descarga), as válvulas de escapamento se abrem, fazendo com que o movimento novamente ascendente do pistão expulse do cilindro as sobras dos gases produzidos pela combustão, dando início a um novo ciclo, e assim sucessivamente.

Amanhã continuamos daqui.

segunda-feira, 12 de novembro de 2018

VEÍCULOS FLEX: MELHOR USAR GASOLINA OU ÁLCOOL? (Parte 7)


VIVA COMO SE FOSSE MORRER AMANHÃ. APRENDA COMO SE FOSSE VIVER ETERNAMENTE.

Como vimos ao longo desta sequência, o grande atrativo dos veículos Flex é a possibilidade de abastecê-los com gasolina, etanol ou uma mistura de ambos em qualquer proporção. Usar álcool tende a ser mais vantajoso quando seu preço na bomba é igual ou inferior a 70% do preço da gasolina, mas há outras vantagens. Para citar um exemplo notório, sua octanagem é 20% superior à da gasolina comum, o que resulta em mais torque e potência. A título de ilustração, o motor 1.6 Flex que equipa o New Fiesta gera 127,6 cv no álcool e 125,2 cv na gasolina. No Prisma 1.4 Flex, essa diferença é um pouco maior — 97 cv contra 89 cv —, e no Corolla 2.0, maior ainda — 154 cv conta 143 cv (volto a esse assunto mais adiante).

Via de regra, o motor atinge sua potência máxima em regimes (rotações por minuto) elevados. Nos exemplos do parágrafo anterior, isso significa algo entre 6.000 rpm e 6.500 rpm. O torque máximo é obtido em regimes inferires, o que é positivo: mais força em baixas rotações proporciona melhor aceleração e, por tabela, favorece as retomadas de velocidade. Portanto, ao esquadrinhar a ficha técnica do seu veículo (ou do modelo que você tem em vista), observe o valor do torque máximo (expresso em kgfm ou Nm) e a faixa de rotação na qual ele surge. Quanto mais “plana” for a “curva de torque”, tanto melhor.

Devido ao poder calorífico menor que o da gasolina, o etanol requer uma mistura “mais rica” — ou seja, sua taxa estequiométrica (proporção entre o combustível e o ar que compõem a mistura) é de aproximadamente 8,4:1, o que corresponde, em números redondos, a oito partes de ar para uma de combustível. Na gasolina, a taxa é de 14,6:1 (catorze partes de ar para uma de combustível, também em números redondos).

Nos veículos carburados, a dosagem da mistura ar-combustivel pulverizada no coletor de admissão era estabelecida pelos giclês (ou gargulantes) do carburador, o que resultava numa relação estequiométrica invariável. Já a injeção eletrônica — que, como vimos, é a grande responsável pelo desenvolvimento dos motores bicombustível — faz ajustes em tempo real, estabelecendo quantidades e proporções de ar e combustível adequadas a cada momento específico. O etanol custa mais barato, mas rende menos e resulta numa autonomia enferior à da gasolina. Em outras palavras, gasta-se menos para abastecer, mas as paradas no posto são mais frequentes — o que pode ser um problema em viagens, sobretudo se os postos ficarem muito distantes entre si.

Motores à gasolina produzem melhores resultados com taxas de compressão em torno de 10:1, ao passo que o álcool (a exemplo das gasolinas premium) requer taxas mais elevadas — entre 11,5:1 e 14:1. Atualmente, os engenheiros precisam definir uma relação intermediária, que atenda às exigências dos dois combustíveis. Mas isso deve mudar com a tecnologia que vem sendo desenvolvida pela Nissan com vistas a uma taxa de compressão variável. Quando ela se tornar comercialmente viável, será possível explorar o melhor de cada combustível (mais detalhes nesta postagem).

Observação: Eu já disse, mas não custa repetir que a taxa de compressão corresponde ao número de vezes que a mistura ar-combustível é comprimida pelo movimento ascendente do pistão no ciclo de compressão, até ser inflamada pela centelha produzida pela vela de ignição (no ciclo de explosão), e que esse parêtro depende precipuamente do curso do pistão — para mais detalhes sobre o funcionamento do motor de quatro tempos (ciclo Otto), releia esta postagem.

Amanhã eu conto o resto.

quarta-feira, 7 de novembro de 2018

VEÍCULOS FLEX: MELHOR USAR GASOLINA OU ÁLCOOL? (Parte 4)


SÓ APAGUE O FÓSFORO QUANDO TIVER CERTEZA QUE A VELA ESTÁ ACESA.

Vimos nos capítulos anteriores que não há problema algum em abastecer veículos flex com gasolina, etanol ou a mistura de ambos em qualquer proporção. Vimos também o que são taxas estequiométrica e de compressão, que a primeira pode ser ajustada em tempo real pela injeção eletrônica e que a segunda é imutável, pois corresponde ao número de vezes a mistura ar-combustível é comprimida pelo movimento ascendente do pistão antes de ser inflamada pela centelha produzida pela vela de ignição uma fração de segundo antes de o êmbolo atingir o PMS (ponto morto superior). Como isso tende a ser nebuloso para quem não tem noção de como funciona um motor de combustão interna, passemos a um breve resumo.

Os principais componentes de um motor de quatro tempos atual (ciclo Otto) são, basicamente, os mesmos do início do século passado: cilindros, cabeçote, cárter (uma espécie de “depósito” de óleo lubrificante), pistões (ou êmbolos), bielas, virabrequim (ou árvore de manivelas) e válvulas (e respectivo mecanismo de acionamento).

Os cilindros ficam no bloco, entre o cabeçote e o cárter. Sobre cada um deles, duas ou mais válvulas acionadas pelo “eixo-comando” abrem e fecham a comunicação entre a câmara de explosão e os dutos de admissão e escapamento. Abaixo dos cilindros, os mancais (apoios) suportam o virabrequim, que é ligado aos pistões por meio de bielas e acoplado a um “volante” metálico cuidadosamente balanceado. No interior de cada cilindro, um pistão faz movimentos de vai-e-vem (vertical nos motores “em linha”, em ângulo nos modelos “em V” e horizontal nos propulsores “boxer”, como os do velho fusquinha, cujos pistões são contrapostos e trabalham horizontalmente).

O “espaço” entre o cabeçote e a parte superior do pistão corresponde à câmara de explosão, cujo volume varia conforme a posição do êmbolo. A relação entre os volumes medidos antes e depois da compressão define a taxa de compressão do motor, enquanto sua capacidade cúbica (ou cilindrada) é obtida pela multiplicação do volume da câmara (com o pistão no ponto morto inferior) pelo número de cilindros: nos motorzinhos “1.0” que equipam nossos carros “populares”, ela corresponde a aproximadamente um litro (nos saudosos V8 da década de ’70, chegava a mais de 7 litros).

Motores de combustão interna transformam a energia calorífica produzida pela queima da mistura ar/combustível na energia mecânica que faz o carro se movimentar. Para isso, o combustível líquido precisa ser vaporizado e combinado com certa quantidade de ar. Antigamente — conforme, aliás, a gente já mencionou nos capítulos anteriores — essa tarefa cabia ao carburador; hoje, ela fica a cargo de um sofisticado sistema conhecido como “injeção eletrônica”.

Observação: A alimentação dos cilindros determina o regime do motor: quanto maior a quantidade de mistura introduzida nas câmaras, maior a força produzida. No entanto, como o volume aspirado é sempre inferior à cilindrada — já que os gases sofrem uma perda de carga e não enchem completamente as câmaras —, propulsores mais sofisticados se valem de compressores para otimizar a alimentação e produzir mais potência. Mas isso já é outra conversa.

Um ciclo de força simples num motor de quatro tempos requer quatro cursos sucessivos do pistão. Durante a admissão, a depressão criada no interior do cilindro pelo movimento descendente do êmbolo enche a câmara de explosão com a mistura. Na etapa seguinte (compressão), enquanto ambas as válvulas no cabeçote (correspondentes àquele cilindro, naturalmente) permanecem fechadas, o pistão retorna a seu ponto morto superior (PMS), comprimindo a mistura. Em seguida (explosão) uma centelha produzida pela vela de ignição inflama os gases e empurra o embolo para baixo, produzindo o chamado “trabalho útil”. Finalmente, dá-se o curso de descarga, quando o pistão torna a subir, expulsando os gases do cilindro através da(s) válvula(s) de escapamento.

Observação: As válvulas não abrem nem fecham no exato instante em que os pistões atingem os pontos extremos de seu curso, pois uma pequena antecipação na abertura e um breve retardo no fechamento facilitam tanto a admissão da mistura quanto a expulsão dos gases.

O vai-e-vem retilíneo dos pistões, transmitido pelas bielas ao eixo de manivelas (ou virabrequim) produz um movimento circular no volante do motor, que, com o auxílio da embreagem e do sistema de transmissão (câmbio/diferencial), transfere o movimento para as rodas motrizes, fazendo o veículo se movimentar. O processo se repete milhares de vezes por minuto — conforme as características do motor e seu regime de rotação, cada pistão pode realizar centenas de ciclos por segundo!

À luz dessas informações, releia os capítulos anteriores e veja como os conceitos lá expendidos lhe parecerão bem mais palatáveis. 

Amanhã a gente continua. 

quinta-feira, 1 de novembro de 2018

VEÍCULOS FLEX: É MELHOR USAR GASOLINA OU ÁLCOOL? (Parte 2)


NADA INSPIRA MAIS CORAGEM AO MEDROSO DO QUE O MEDO ALHEIO.

Se ter um carro movido a álcool nos anos 80 e 90 era uma provação (a ponto de o slogan do governo “Carro a Álcool — Você ainda Vai Ter Um — soar como “praga de madrinha”), ter um veículo flexível (ou bicombustível) de hoje em dia é tudo de bom, sobretudo porque a maior parte dos problemas verificados nas primeiras safras das versões a álcool já foi sanada há tempos. Assim, a liberdade de escolher entre os dois combustíveis na hora de abastecer vem conquistando os motoristas e estimulando os fabricantes a aumentar a produção dos veículos “flex” e a “tropicalizar” alguns modelos importados, de modo a lhes garantir a mesma prerrogativa.

Como eu disse na postagem anterior, esse “prodígio” só foi possível depois que a indústria finalmente aposentou o pré-histórico carburador, que dosava a mistura queimada nas câmaras de combustão do motor através de gargulantes (também chamados de “giclês), resultando numa proporção estequiométrica invariável — em torno de 14,6:1 nos modelos à gasolina e 8,4:1 nos modelos a álcool. Já na injeção eletrônica, sensores estrategicamente posicionados realizam diversas medições em tempo real e enviam os dados a um módulo que realiza ajustes na mistura, no ponto de ignição, etc., de maneira a otimizar a queima. Daí por que os veículos “flexíveis” podem ser abastecidos com gasolina, álcool ou a mistura de ambos em qualquer proporção.

Por proporção estequiométrica, entenda-se a relação entre a quantidade de ar e combustível que chega até a câmara de combustão, é comprimida pelo movimento ascendente do pistão e inflamada pela centelha produzida pela vela de ignição. A “explosão” resultante gera o movimento descendente do êmbolo, cuja biela faz girar o eixo de manivelas responsável por transmitir essa “força” para as rodas motrizes, mas não sem o concurso do sistema de embreagem, das engrenagem da caixa de câmbio, do diferencial, etc. (A quem interessar possa, tudo isso foi detalhado numa matéria iniciada nesta postagem).

Uma proporção estequiométrica de 14,6:1 — como a que é usada nos motores à gasolina — indica que a mistura é composta de 14,6 vezes mais ar do que combustível (ainda bem que não pagamos pelo ar). No álcool, a proporção é de 8,4:1, e a razão de essa mistura ser mais “rica” é o menor poder calorífico do etanol.

Observação: Não confunda proporção estequiométrica com taxa de compressão, pois esta última indica quantas vezes a mistura ar-combustível é comprimida pelo pistão. Uma taxa de compressão em torno de 10:1 (como a que é utilizada nos motores à gasolina) significa que a mistura é comprimida 10 vezes antes de a centelha produzida pela vela de ignição provocar sua queima. Nos veículos a álcool, essa taxa aumenta para 12:1. Tenha em mente que a taxa de compressão reflete diretamente no rendimento térmico do motor, mas é limitada pela capacidade de detonação do combustível (voltarei a esse assunto oportunamente).

Via de regra, um carro flex “roda menos quilômetros por litro” com álcool do que com gasolina, mas isso não significa necessariamente maior custo por quilômetro — embora exija abastecimentos mais frequentes, o que pode ser um problema em viagens longas por estradas nas quais os postos ficam muito espaçados entre si. Se a diferença de preço entre os dois combustíveis for de 30%, o custo empata; se for maior, será mais vantajoso abastecer com etanol, como reza a tal regrinha dos 70% que que eu mencionei no início do capítulo anterior.

Mas vantagens de usar álcool não param por aí, como veremos na postagem da próxima segunda-feira. Até lá.

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