quinta-feira, 1 de novembro de 2018

VEÍCULOS FLEX: É MELHOR USAR GASOLINA OU ÁLCOOL? (Parte 2)


NADA INSPIRA MAIS CORAGEM AO MEDROSO DO QUE O MEDO ALHEIO.

Se ter um carro movido a álcool nos anos 80 e 90 era uma provação (a ponto de o slogan do governo “Carro a Álcool — Você ainda Vai Ter Um — soar como “praga de madrinha”), ter um veículo flexível (ou bicombustível) de hoje em dia é tudo de bom, sobretudo porque a maior parte dos problemas verificados nas primeiras safras das versões a álcool já foi sanada há tempos. Assim, a liberdade de escolher entre os dois combustíveis na hora de abastecer vem conquistando os motoristas e estimulando os fabricantes a aumentar a produção dos veículos “flex” e a “tropicalizar” alguns modelos importados, de modo a lhes garantir a mesma prerrogativa.

Como eu disse na postagem anterior, esse “prodígio” só foi possível depois que a indústria finalmente aposentou o pré-histórico carburador, que dosava a mistura queimada nas câmaras de combustão do motor através de gargulantes (também chamados de “giclês), resultando numa proporção estequiométrica invariável — em torno de 14,6:1 nos modelos à gasolina e 8,4:1 nos modelos a álcool. Já na injeção eletrônica, sensores estrategicamente posicionados realizam diversas medições em tempo real e enviam os dados a um módulo que realiza ajustes na mistura, no ponto de ignição, etc., de maneira a otimizar a queima. Daí por que os veículos “flexíveis” podem ser abastecidos com gasolina, álcool ou a mistura de ambos em qualquer proporção.

Por proporção estequiométrica, entenda-se a relação entre a quantidade de ar e combustível que chega até a câmara de combustão, é comprimida pelo movimento ascendente do pistão e inflamada pela centelha produzida pela vela de ignição. A “explosão” resultante gera o movimento descendente do êmbolo, cuja biela faz girar o eixo de manivelas responsável por transmitir essa “força” para as rodas motrizes, mas não sem o concurso do sistema de embreagem, das engrenagem da caixa de câmbio, do diferencial, etc. (A quem interessar possa, tudo isso foi detalhado numa matéria iniciada nesta postagem).

Uma proporção estequiométrica de 14,6:1 — como a que é usada nos motores à gasolina — indica que a mistura é composta de 14,6 vezes mais ar do que combustível (ainda bem que não pagamos pelo ar). No álcool, a proporção é de 8,4:1, e a razão de essa mistura ser mais “rica” é o menor poder calorífico do etanol.

Observação: Não confunda proporção estequiométrica com taxa de compressão, pois esta última indica quantas vezes a mistura ar-combustível é comprimida pelo pistão. Uma taxa de compressão em torno de 10:1 (como a que é utilizada nos motores à gasolina) significa que a mistura é comprimida 10 vezes antes de a centelha produzida pela vela de ignição provocar sua queima. Nos veículos a álcool, essa taxa aumenta para 12:1. Tenha em mente que a taxa de compressão reflete diretamente no rendimento térmico do motor, mas é limitada pela capacidade de detonação do combustível (voltarei a esse assunto oportunamente).

Via de regra, um carro flex “roda menos quilômetros por litro” com álcool do que com gasolina, mas isso não significa necessariamente maior custo por quilômetro — embora exija abastecimentos mais frequentes, o que pode ser um problema em viagens longas por estradas nas quais os postos ficam muito espaçados entre si. Se a diferença de preço entre os dois combustíveis for de 30%, o custo empata; se for maior, será mais vantajoso abastecer com etanol, como reza a tal regrinha dos 70% que que eu mencionei no início do capítulo anterior.

Mas vantagens de usar álcool não param por aí, como veremos na postagem da próxima segunda-feira. Até lá.

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