A pouco mais de dois meses do final do ano, ainda não se tem uma posição definitiva sobre a maracutaia das operadoras de telefonia (encabeçadas pela VIVO), que decidiram empalar seus clientes com absurdas franquias na banda larga fixa (limitação de tráfego de dados), como já faziam na conexão móvel via rede de telefonia celular.
Essa novela,
que se arrasta há mais de seis meses, provocou revolta entre os usuários e
propiciou abaixo-assinados e ações judiciais movidas por órgãos de defesa do
consumidor, que resultaram na proibição temporária da implementação das franquias
(para mais detalhes, clique aqui).
No último
dia 14, o Comitê de Defesa dos Usuários
de Serviços de Telecomunicações voltou a debater a questão (foi a terceira
reunião do comitê em 2016 para tratar desse tema; veja mais detalhes no site da ANATEL). Na oportunidade, Abrint e Sinditelbrasil se alinharam às operadoras, ao passo que Intervozes e Sintel e se posicionaram contra, por entenderem que a limitação do
tráfego de dados obstrui o desenvolvimento da economia, restringe o uso
educacional e o compartilhamento do sinal em estabelecimentos comerciais (Wi-Fi) e contraria o Marco Civil da Internet.
Observação: A neutralidade da rede imposta pelo Marco Civil dá ao consumidor a liberdade de usar a internet para o que quiser, e as franquias tiram essa liberdade. O problema é que, embora determine que a suspensão do serviço só pode ocorrer em caso de falta de pagamento a Lei 12.965/14 é omissa em relação a franquias, deixando a questão aberta a interpretações. Usuários que se sentirem injustiçados podem se respaldar no Código de Defesa do Consumidor para acionar o Procon ou entrar com uma ação no juizado de pequenas causas.
Para a
maioria dos especialistas, franquias na banda larga fixa não se justificam técnica
ou juridicamente, além do que, de 190 países, 68% não possuem limitação de
dados. O senador peemedebista Eunício Oliveira propôs uma
alteração no Marco Civil, visando
assegurar aos internautas o direito à não limitação no volume de dados nas
conexões fixas, mas em meio à crise política e diante da prisão de Eduardo Cunha e da possibilidade de ele
delatar mais de uma centena de parlamentares, seus pares parecem mais
preocupados em salvar a própria pele do que tratar dos interesses de seus
eleitores.
Por
enquanto, as operadoras devem respeitar a medida da ANATEL e não suspender a conexão, independentemente do que diz o
plano contratado. Para Juarez Quadros,
atual presidente da agência, nem sequer existe previsão para uma decisão
definitiva (para saber mais, siga este
link).
Antes de ser recolhido à carceragem da PF em Curitiba, Cunha desdenhava a delação (“só faz delação quem cometeu crime, e eu não cometi”, dizia ele), demonstrando que, como Lula, Dilma e tantos outros investigados pela Justiça Penal, tem inequívoca vocação para comediante, pois continua negando os atos espúrios que lhe são imputados, mesmo sob a cachoeira de indícios que apontam justamente o contrário. Mas nada como uma noite no xilindró para colocar as coisas em perspectiva: na manhã da última quinta-feira, ele contratou os serviços do criminalista Marlus Arns de Oliveira ― que alinhavou os primeiros acordos de empreiteiros enrolados na Lava-Jato e já integrava a banca de defesa de sua esposa, a jornalista Cláudia Cruz.
CUNHA JÁ LÁ... E LULA LÁ JÁ, JÁ. E DILMA, E RENAN...
Um mês depois de ter sido cassado ― no processo mais longo da
história da Comissão de Ética da Câmara
― e menos de uma semana após a ação penal que se arrastava no STF ter passado a tramitar na 13ª Vara Federal de Curitiba, Eduardo Cunha foi preso preventivamente
devido a indícios de "prática
habitual e profissional de crimes contra a administração pública" e uso de contas secretas no exterior para
ocultar o produto de desvios que teriam ocorrido não só nos contratos com a
Petrobras, mas também em outras áreas, não raro "com o emprego de extorsão
e de terceiros para colher propinas" e visando evitar a obstrução da
justiça, prevenir a reiteração do delito, dificultar a dispersão de montantes
não recuperados e impedir a fuga do ex-deputado, que tem dupla cidadania e
dispõe de passaporte italiano.
O peemedebista vê esse
fato como uma estratégia da Lava-Jato
para desmontar a tese abilolada (*) de perseguição a Lula e ao PT, embora antevisse
a possibilidade acabar atrás das grades ― tanto é que, a pretexto de escrever
um livro de memórias com sua versão
sobre o impeachment e revelações bombásticas sobre os bastidores do Congresso
(detalhes nesta postagem), vinha reunindo
munição para um eventual acordo de delação.
A título de ilustração, vale transcrever um resumo do que
disse Roberto Pompeu de Toledo em
sua coluna, em Veja desta semana: “A audácia, apanágio de Eduardo Cunha,
permitiu-lhe insinuar-se, abrir caminho e avançar. Nomeado presidente da TELERJ por PC Farias, no governo Collor, seria derrubado numa roubalheira, mas eis que
no governo fluminense de Anthony Garotinho ressurge como presidente da
Companhia Estadual da Habitação, até ser destituído em outra roubalheira, e nem
por isso deixou de ir em frente, deputado estadual, depois federal, finalmente
presidente da Câmara, a golpes de bajulação, chantagem e cara-de-pau. Cunha
serviu-se da audácia para se aninhar do poder. Não há coragem no audacioso.
Animavam o ex-deputado a ambição sem medida e a generosa rede de proteção a que
se dá o nome de impunidade. Até que lhe atravessou o caminho a Lava-Jato”.
“Obrigado por não ter
vindo antes”, teria dito ao assassino o magnata da imprensa americana e
fundador da CNN Ted Turner, numa
fase depressiva em que era incomodado pela ideia fixa de que acabaria sendo
assassinado. Tanto era bola cantada a prisão de Cunha que ele poderia ter dito o mesmo para os agentes da PF, que, depois do capitão do time José Dirceu, do empresário estrela Marcelo Odebrecht e de outras figuras
de destaque, detiveram o mais ardiloso, manobreiro e temido político da última
safra. E quanto à “alma viva mais honesta do Brasil”, quem sabe esse episódio tenha
lhe trazido à memória um antigo comercial da vodca Orloff, que consagrou o bordão “eu sou você amanhã”. Até porque o petralha e cachaceiro de marca
maior não demora a seguir pelo mesmo caminho. E outros ― viu, Renan (e outras, viu, Dilma) ― depois dele. Resta saber se
haverá espaço para tanta gente na carceragem
da PF em Curitiba.
(*) Para os “heróis da resistência democrática” Eduardo Cunha era o grande vilão do golpe, a mente perversa que arquitetou
a destituição da mulher honesta, o lastro da lenda, a prova de que estava tudo
armado para arrancar do governo os quadrilheiros do bem. E agora? Cunha era a reserva moral do PT, do PSOL, da Rede e seus
genéricos. Com a impunidade dele, a militância podia defender Lula e Dilma numa boa, por mais que eles roubassem o Brasil na caradura.
Bastava dizer que era contra o Cunha
— o fiador do golpe, o homem do sistema. Mas
que sistema é esse que põe seu articulador no xadrez? Os juros começaram a
cair depois de quatro anos. A inflação de outubro é a menor em sete anos, e ano
que vem o desemprego começa a baixar. Isso
não é mágica, é governo. A vida no Brasil vai melhorar, e o que será
daquelas almas puras que gritam “fora Temer” e se tornam instantaneamente
grandiosas? O que será dos corações valentes que ficam bem na foto denunciando
a entrega do país ao bando do Cunha?
Talvez só uma Bolsa Psicanálise para
fazer frente a tanto sofrimento. Na época do Plano Real foi igualzinho. Na privatização da telefonia, que
libertou a população dos progressistas retrógrados de sempre, esses mesmos que
gritam contra o golpe (ou seus ancestrais) estavam lá nas barricadas —
apedrejando quem chegava para os leilões. Eram os heróis da resistência
democrática contra a ganância capitalista. Aí a privatização se consumou, a
vida de todo mundo melhorou, e os heróis foram combinar a próxima narrativa —
pelo celular. (Com excerto do texto de Guilherme Fiúza).