Deitado eternamente em berço esplêndido, o Gigante Adormecido não tem motivos para despertar — não quando realidade parece pior que o pior dos pesadelos.
A boa notícia, ou o que parece ser uma boa notícia, é que lideranças do Centrão decidiram tentar "baixar a temperatura" da crise. A conversa ocorreu em um jantar realizado no domingo na residência oficial de Rodrigo Maia, que quer acalmar os ânimos e seguir com os trabalhos para a aprovação da reforma da Previdência. O presidente da Câmara se diz defensor do projeto independentemente do governo, mas avalia que arregimentar votos para a aprovação não é de sua competência, mas dos líderes do governo.
Em entrevista ao Estado, Maia havia dito que o governo não tem projeto para o País além da reforma da Previdência, fez várias críticas e advertiu que o presidente Bolsonaro precisa deixar o Twitter de lado, além da “disputa do mal contra o bem”, e se empenhar para melhorar a vida da população. Até aí, não há como discordar.
Embora eu tenha aditado a postagem anterior com a informação da soltura do ex-presidente Michel Temer, vale transcrever a nota também neste post:
Contrariando as expectativas, o desembargador Ivan Athié determinou nesta
segunda-feira a soltura de Michel Temer,
que havia sido preso na última quinta-feira (clique aqui para
ler a íntegra da decisão). O magistrado havia pedido que o caso fosse incluído
na pauta de julgamento do tribunal na
próxima quarta-feira, para que a decisão sobre o habeas corpus fosse colegiada, mas resolveu se antecipar: “Mesmo que se admita existirem indícios que
podem incriminar os envolvidos, não servem para justificar prisão preventiva,
no caso, eis que, além de serem antigos, não está demonstrado que os pacientes
atentam contra a ordem pública, que estariam ocultando provas, que estariam
embaraçando, ou tentando embaraçar eventual, e até agora inexistente instrução
criminal, eis que nem ação penal há, sendo absolutamente contrária às normas
legais prisão antecipatória de possível pena, inexistente em nosso ordenamento,
característica que tem, e inescondível, o decreto impugnado”.
O MPF vai recorrer da liminar de Athié, que tirou da pauta da 1ª turma especializada em direito penal, previdenciário e da propriedade industrial do TRF-2 e determinou a soltura Temer e seus asseclas pode ser revertida mais adiante, ainda que não amanhã. Outro detalhe: Embora boa parte dos jornais tenha publicado a notícia sob o título "JUSTIÇA MANDA SOLTAR TEMER", é bom não confundir as coisas: Primeiro, porque a justiça é cega; segundo, porque quem mandou soltar o emedebista foi o presidente a 1ª Turma do TRF-2, que ficou afastado do cargo durante sete anos devido a uma ação no STJ por estelionato e formação de quadrilha (em 2004). Um inquérito contra ele, com as mesmas acusações, foi arquivado em 2008 pelo STJ a pedido do MPF, que alegou não ter encontrado provas de que o desembargador tivesse proferido sentenças em conluio com advogados. O magistrado retornou às atividades em 2011, depois que o STF trancou a ação contra ele.
O MPF vai recorrer da liminar de Athié, que tirou da pauta da 1ª turma especializada em direito penal, previdenciário e da propriedade industrial do TRF-2 e determinou a soltura Temer e seus asseclas pode ser revertida mais adiante, ainda que não amanhã. Outro detalhe: Embora boa parte dos jornais tenha publicado a notícia sob o título "JUSTIÇA MANDA SOLTAR TEMER", é bom não confundir as coisas: Primeiro, porque a justiça é cega; segundo, porque quem mandou soltar o emedebista foi o presidente a 1ª Turma do TRF-2, que ficou afastado do cargo durante sete anos devido a uma ação no STJ por estelionato e formação de quadrilha (em 2004). Um inquérito contra ele, com as mesmas acusações, foi arquivado em 2008 pelo STJ a pedido do MPF, que alegou não ter encontrado provas de que o desembargador tivesse proferido sentenças em conluio com advogados. O magistrado retornou às atividades em 2011, depois que o STF trancou a ação contra ele.
Devido à síndrome do macaco, encerro por aqui. Fiquem com mais um texto brilhante do igualmente brilhante J.R. Guzzo:
Está na hora, mais uma vez, de falar algumas coisas sobre as
guerras sem pausa, sem cavalheiros e sem regras a que o público pode assistir
nestes tempos de cólera descontrolada entre os meios de comunicação e o governo
do presidente Jair Bolsonaro. É o
caso de indagar: será que o leitor já não está enjoado de continuar ouvindo a
mesma ladainha? A única opção disponível, enquanto não se consegue uma resposta
decente para a pergunta, é ir adiante — não vale fazer de conta que está tudo
bem, pois nada está bem. Na verdade, nunca esteve tão mal, e quem paga o preço
é o cidadão que sustenta as duas partes, governo e imprensa. Ele teria o
direito de ser informado sobre como o seu país está sendo governado. Não é o que
acontece. O que lê, ouve ou vê na mídia só está servindo para lhe mostrar que
os dois lados não estão aí para explicar, mas para se detestar — e parecem
perfeitamente satisfeitos em continuar assim.
É cansativo, e principalmente inútil, ficar queimando válvula
na tentativa de explicar quem está com a razão. Para quê? Bolsonaristas e
comunicadores acreditam que estão certíssimos, e a última coisa que querem
ouvir nesta vida é alguma modalidade de argumento racional. Além disso, tanto
faz — as realidades, como sempre, se encarregarão de mostrar quem acertou e
quem errou. Nas próximas eleições, daqui a dois e a quatro anos, os eleitores
vão tomar a única decisão que realmente importa — vão reeleger as forças do
governo, caso achem que Bolsonaro
está fazendo um bom trabalho, ou mandar todos para o olho da rua, caso achem
que o seu trabalho foi ruim. Essas decisões serão tomadas em cima de resultados
concretos, que a população possa perceber; o resto é conversa fiada,
neurastenia e pesquisa de opinião. A mídia, do seu lado, estará com a razão se
tiver, neste mesmo período, aumentado o seu público pagante; estará errada se
continuar perdendo leitores, ouvintes e espectadores.
O pior dos mundos, de qualquer forma, é a briga de rua na
qual se vive hoje. É uma dessas situações que não têm nada de bom, de um lado,
e têm tudo de ruim, de outro — e coisas assim, como mostra a experiência, têm
as melhores perspectivas de continuar exatamente como estão. O que se pode
dizer, neste momento, é que o governo faria um grande favor a si próprio, e
provavelmente aos governados, se pusesse na cabeça de uma vez por todas que os
meios de comunicação deste país odeiam o presidente da República, seus
ministros, seus generais, seus programas, seus valores, suas crenças, seus
defeitos e suas virtudes; odeiam, sobretudo, que cerca de 60 milhões de
eleitores tenham colocado Bolsonaro na Presidência por estarem a favor das
posturas que ele defende. Quando a coisa fica assim, não tem mais conserto. Game over. Se Bolsonaro descobrir a cura
do câncer, amanhã ou depois, a mídia vai ficar contra; ainda não sabe direito
como faria um negócio desses, mas com certeza acabará encontrando um jeito de
fazer.
Esse espírito de guerra religiosa que se desenvolveu dentro
da mídia é formicida puro. Está na cara, entre outros efeitos tóxicos, que,
agindo como têm agido em relação ao governo, os meios de comunicação abrem uma
avenida inteirinha para serem acusados de uma coleção completa de pecados
mortais. A mãe de todos eles, no fundo, talvez seja a hipocrisia — a tentativa
de mostrar que está apenas cumprindo o seu dever de informar e opinar, quando
muitas vezes falsifica ambas, informação e opinião, com o propósito de fazer
oposição política. Não dá para negar, com base na observação dos fatos, que a
imprensa brasileira de hoje está decidida a não mudar de ideia e não mudar de
assunto; acha que o governo está sempre errado, em tudo, e que o único
interesse do público é ficar ouvindo isso todos os dias. Há, comprovadamente, a
divulgação de notícias coladas a suposições sem fundamento, conclusões
fantasiosas e interpretações sem pé nem cabeça. Utiliza-se todos os dias o
expediente de chamar “especialistas” para dizer, a respeito de qualquer coisa,
unicamente aquilo que os jornalistas querem que seja dito. Há as
mentiras, enfim — publicadas de propósito ou, então, por negligência, imperícia
ou imprudência. Uma criança de 10 anos de idade sabe mentir. Por que raios uma
pessoa crescida não mentiria — só porque trabalha na imprensa? Ah, vai. Em todo
caso, por um caminho ou por outro, fica evidente a existência de um
generalizado, banal e agressivo descaso pela verdade.
O fato, comprovado pela memória digital onde tudo se grava,
é que a mídia nacional resolveu participar da campanha eleitoral de 2018
tomando partido contra a candidatura de Bolsonaro – e contra a maioria do
público, também. Perdeu as eleições, já que o eleitorado decidiu fazer
precisamente o oposto do que os comunicadores queriam que fizesse. A essa
altura, em vez de parar um pouco para perguntar se não havia nada a corrigir no
roteiro seguido até ali, a imprensa dobrou a aposta. Ficou ainda mais brava do
que já estava durante a campanha; desde a eleição, trata o governo Bolsonaro
como ilegítimo. Não há sinais de que nada disso vá mudar nos próximos quatro
anos.
Um exemplo que talvez ajude a entender melhor as coisas é a
convicção, manifestada por Bolsonaro e muitos dos seus seguidores, de que a
mídia deveria estar cobrando quem é o mandante da tentativa de assassinato que
quase o matou no final da campanha eleitoral. Acham que o seu caso merece tanta
atenção, pelo menos, quanto o da vereadora Marielle. O presidente pode esperar
sentado; não vai rolar. Na opinião da imprensa, não há mais nada a perguntar
sobre o assunto. A polícia já não disse que o criminoso é um débil mental que
agiu sozinho? Pois então: qual é a dúvida? Se a polícia falou, está falado.
Além disso, há os “laudos técnicos”, que garantem que o homem não deve nem ser
julgado, pois não tem culpa nenhuma pelo que fez, coitado. Laudo de peritos, na
tradição da Justiça brasileira, é algo que se compra como um pastel de feira,
mas tudo bem. O nosso jornalismo investigativo também não é de ferro; não vai
sair por aí procurando coisas que não gostaria de encontrar.
É por histórias como essa que o governo se acha na obrigação
de dar o troco. Em sua maneira de ver as coisas, Bolsonaro e parte do seu
sistema de apoio acham que é indispensável reagir. Não se ganha uma guerra com
retiradas, não é mesmo? Além do mais, estão convencidos de que brigar com a
imprensa dá cartaz junto ao eleitorado; deu certo na campanha e, portanto, vai
dar certo de novo. “O Trump” não faz assim? Etc. etc. etc. Só que nada disso
vai resolver a vida de ninguém. A obrigação do governo é governar, e não
demonstrar que a imprensa está errada; seu dever é ser aprovado pela população,
e não pelos jornalistas. A imprensa é ruim? Problema dela. A questão toda, na
verdade, é bem simples. Basta levar em consideração que a imprensa não tem
nenhuma obrigação legal de ser boa, ou equilibrada, ou de dizer a verdade; o
que está dito na lei, apenas, é que tem de ser livre. Ou se convive com esse
princípio, ou não há jogo. Quem tem de julgar a qualidade da mídia, e decidir
se vale a pena pagar pelo seu conteúdo, é o público — e o governo pode ter
certeza que ele está fazendo exatamente isso. Trata-se de um juiz muito mais
cruel do que os bolsonaristas imaginam; quando pune um veículo, vai embora e
não volta nunca mais. Não há salvação para quem é condenado.
Bem que o presidente poderia se contentar com isso.