quarta-feira, 18 de dezembro de 2019

A INDECÊNCIA QUE POSA DE INOCÊNCIA



Legislativo e Judiciário já estão em clima de recesso de final de ano — o que é no mínimo imoral: considerando a situação que o país atravessa, deixar para fevereiro assuntos de grande relevância, como as reformas pós-Previdência e a autorização para a prisão de condenados em segunda instância, é uma irresponsabilidade. Mas incluir no Orçamento a proposta aprovada pela Comissão Mista do Congresso, que aumenta consideravelmente o valor do fundão eleitoral em relação ao ano passado, é cuspir na cara do contribuinte tupiniquim, que é obrigado a sustentar calado essa verdadeira farra do boi.

Chegou-se a cogitar um valor de quase R$ 4 bilhões para financiar as campanhas eleitorais no ano que vem, mas, diante da indignação popular, suas insolências valeram-se do velho truque do bode, reduzindo a mordida R$ 2,5 bilhões. Assim, lucrariam meio bilhão de reais e confirmariam que enxergam no povo brasileiro um bando de idiotas. Ao final, o texto que foi aprovado noite de ontem destina R$ 2 bilhões para o fundo eleitoral, prevê R$ 1.031 para o salário mínimo e estima em até R$ 124 bilhões o déficit das contas públicas.

Nunca é demais lembrar que uma coisa é viabilizar eleições e outra, bem diferente, é sustentar partidos e respectivos candidatos.

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O cangaceiro das Alagoas sonha em ver na cadeia o procurador federal Deltan Dallagnol. Renan, um prontuário ambulante disfarçado de parlamentar, é estimulado pela simpatia dissimulada de um bando de colegas de Dallagnol, pela omissão covarde de cardeais do MPF e pelo apoio ostensivo da bancada suprapartidária dos cafajestes. Mas a prisão do coordenador da Lava-Jato no Paraná é tão viável quanto a substituição do Exército por tropas de cangaceiros chefiados por Fernando Collor.

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Sobre a investigação de Lulinha pela Lava-Jato, disse Lulão: “O espetáculo produzido pela Força Tarefa da Lava Jato é mais uma demonstração da pirotecnia de procuradores viciados em holofotes que, sem responsabilidade, recorrem a malabarismos no esforço de me atingir, perseguindo, ilegalmente, meus filhos e minha família”. Na versão do picareta dos picaretas, foi por coincidência que a Oi, amparada no critério da meritocracia, doou mais de 130 milhões de reais ao "Ronaldinho dos Negócios" pouco antes de seu papai presidente ter assinado o decreto que permitia à empresa fazer exatamente o que queria.

Um e-mail de 13 de novembro de 2007, incluído pela Lava-Jato na representação que fundamentou as buscas da operação da semana passada, revela muito sobre como funcionava a rede de proteção que mantinha — não com muito sucesso, diga-se — a vida de luxos de Fábio Luís Lula da Silva no anonimato. Em mensagem batizada de “Mocó dos Pica-Pau”, endereçada a Kalil Bittar e Jonas Suassuna, o "menino de ouro", preocupado com o apartamento que estava prestes a alugar em São Paulo por R$ 7 mil reais, pede que todas as contas relacionadas ao imóvel sejam registradas no nome da Gol, empresa de Jonas Suassuna

Para justificar o repasse, Lulinha usa os porteiros do prédio: “Como eu disse ao Jonas, na semana passada, acho ruim tudo relacionado ao apartamento ficar em meu nome. Não é nada demais, mesmo porque eu atualmente tenho condições de arcar com os custos do mesmo, mas quando as contas começam a chegar em meu nome, em menos de uma semana os porteiros se comunicam, que contam para as empregadas, que contam para os vizinhos, que estudam em frente, que contam para deus e o mundo, ou seja, vai ser um inferno”. Na mesma mensagem, o ex-catador de bosta de elefante deixa claro que “o Jonas concordou comigo que podemos fazer tudo em nome da Gol”.

A Lava-Jato separa um capítulo da investigação para detalhar quantas mordomias semelhantes ao apartamento foram bancadas pelo sócio de Lulinha. Compras de toda natureza estão listadas na investigação. “A percepção de benefícios por Fábio Luís, assumidos e pagos por Jonas Suassuna, remonta o ano 2007. E-mails apreendidos comprovam que desde esta época Jonas, com o auxílio de Kalil Bittar, foi responsável por custear despesas de locação em imóvel ocupado por Fábio Luís, da ordem de 7.000 reais por mês”, registram os investigadores. A mensagem, por reveladora, mostra que Lulinha só conseguiu dinheiro depois do milagre da Gamecorp. Mostra também que não era só Lula que usava amigos para esconder a vida de bacana em São Paulo.

Observação: A PF chegou a pedir, em representação que culminou na Operação Mapa da Mina, fase 69 da Lava Jato, a prisão temporária de Lulinha e dos empresários Kalil Bittar e Jonas Suassuna, sócios do grupo Gamecorp/Gol. O documento foi apresentado à 13.ª Vara Federal do Paraná em junho de 2018, mas só foi analisado pela juíza substituta Gabriela Hardt em setembro passado, após manifestação do MPF. Hardt negou o pedido, levando em consideração o tempo decorrido desde a representação e também acolhendo o parecer da força-tarefa no Paraná, de que não havia necessidade de decretação de reclusão dos investigados. Curiosamente, a mídia "cumpanhêra" não fez alarde dessa decisão, ao contrário do que fez quando o TRF-4 anulou uma sentença em que a magistrada reproduziu, como se fossem seus, argumentos do MPF, copiando peça processual sem indicação da fonte (note que essa decisão não remete a processo da Lava-Jato).
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Por último, mas não menos afrontoso: Felipe Santa Cruz — que também parece ter especial predileção por menosprezar a inteligência alheia — saiu-se com a seguinte pérola: “Estou convencido e vou falar uma coisa dura: quem segue apoiando o governo é porque tem algum desvio de caráter”. Na valiosa opinião do presidente da OAB, só não tem desvio de caráter quem, como ele próprio, segue apoiando Lula, Dilma e o resto da quadrilha que saqueou o país por 13 anos consecutivos.