É sabido que os mesmos fatos podem
ter diferentes versões, e que todos temos direito às nossas próprias versões, mas
não a nossos próprios fatos. O que nos leva ao Oscar e ao
“documentário” da cineasta Ana Petra Costa — uma das herdeiras da
empreiteira Andrade Gutierrez —, que o disputou mas não levou (sorry,
esquerdopatas), embora merecesse, como prêmio de consolação, uma menção honrosa pelo exercício ficcional que buscou transformar certa ex-presidanta pedanta, arroganta e
incompetenta numa pobre vítima de um golpe de Estado que nunca existiu.
O “Academy Award of Merit” ganhou o apelido de Oscar
porque Margaret Herrick — que viria a ser secretária executiva da
Academia — achou a estatueta (que pretende representar um cavaleiro medieval com sua
espada) parecida com seu tio Oscar, e o crítico de cinema Sidney
Skolsky publicou o comentário da moçoila em sua coluna. O escultor responsável por dar forma ao troféu foi George Stanley, que se baseou no esboço rabiscado por um
diretor da MGM num guardanapo da badalada boate Brown Derby, em Los
Angeles.
As peças, que são fabricadas por uma empresa de Chicago chamada R. S.
Owens, medem cerca de 35 centímetros de altura, pesam 3,85 kg, são
feitas a partir de uma liga de estanho e cobre e banhadas em platina e ouro de 14
quilates. A cerimônia, realizada anualmente com a sempre imitada mas nunca igualada pompa e circunstância hollywoodiana, premia vinte e quatro
categorias: melhor ator; ator coadjuvante; melhor atriz; atriz coadjuvante; longa-metragem de animação; direção de arte; diretor de fotografia; figurino; direção; filme documentário; curta documentário; edição de filme; roteiro
(original); roteiro (adaptado); efeitos visuais; edição de som; som; curta-metragem – filme; curta-metragem – animado; melhor filme; música
(canção); música (trilha sonora); maquiagem; e filme em língua estrangeira.
Este ano, o Oscar de melhor documentário
foi para INDÚSTRIA
AMERICANA, que fala do esgarçamento das relações de trabalho que, a exemplo do que ocorreu no século 19 com a Revolução Industrial, trouxe novos modelos de relações que as regras antigas
não previam. Aliás, esse é o dilema da esquerda em geral e do PT em
particular, que não têm a menor ideia de como lidar com os desafios de uma nova
era onde portas de fábrica, cartões de ponto e funcionários de apito deram lugar home
offices, motoristas de aplicativo, empresas que entregam comida e pessoas que,
de dois pontos opostos do planeta, se associam para criar um aplicativo para
uma empresa instalada num terceiro ponto, a milhares de quilômetros outros dois.
Enquanto a cerimônia do Oscar acontecia e “DEMOCRACIA
EM VERTIGEM” perdia, o PT comemorava seu quadragésimo aniversário —
efeméride que não contou com a presença do ex-presidente do partido e
ex-ministro da Justiça Tarso Genro, que, num melancólico artigo
publicado no site UOL, disse com todos os “ff” e “rr” que o PT ficou
obsoleto.
“Não adianta, por exemplo, o PT prometer se renovar e
pregar a restauração da CLT. Os processos de trabalho foram fragmentados e hoje
temos autônomos, horistas, PJs, precários, intermitentes… Trata-se, neste caso,
de organizar um outro sistema público protetivo que envolva estes excluídos das
legislações trabalhistas, que irão aumentar”, escreveu Tarso. E concluiu:
“Acho que o PT não acompanhou essas mudanças”.
A propósito, o jornalista Augusto Nunes publicou em
sua coluna:
“Não existe a verdade de cada um. Existe a verdade factual,
que é o contrário da mentira. Se o resgate de um período histórico deforma os
fatos para ajustá-los à miopia ideológica do autor, vira peça de propaganda.
Chamar de ‘documentário’ a fantasia DEMOCRACIA EM VERTIGEM é coisa de
vigarista.
Infinitamente mais talentosa que Petra Costa, a alemã Leni
Riefenstahl esbanjou competência na sequência de filmes concebida para
exaltar a era nazista e louvar a superioridade da raça ariana. Os mesmos
jornalistas que agora concedem a Petra o direito de mentir
compulsivamente sempre viram nos filmes de Leni o que eles eram: peças
de propaganda esteticamente admiráveis, mas tão verdadeiras quanto as
discurseiras de Goebbels.
Em ‘O TRIUNFO DA VERDADE’, Leni
mostrou com singular criatividade como se induz uma nação a enxergar uma
linhagem de semideuses no bando de assassinos patológicos. Com ‘DEMOCRACIA
EM VERTIGEM’, uma longa e selvagem sessão de tortura dos fatos, Petra
conseguiu tapear os organizadores do Oscar. A diretora predileta de Dilma
está para Leni como Lula para Winston Churchill.”