segunda-feira, 17 de fevereiro de 2020

CARNAVAL, VASSOURA E PIPOCA


Eu havia programado outro assunto para hoje, mas mudei de ideia quando me lembrei que estamos a poucos dias do Carnaval. Em tese, o Reinado de Momo não deveria interferir na grade de postagens, mas na prática a teoria é outra.

Se até mesmo em Sampa — outrora chamada de “terra do trabalho”, e que Vinicius de Moraes definiu como o “túmulo do samba” — o início da folia vem sendo antecipado em pelo menos uma semana e estendido até o domingo subsequente, seria ilusão achar que os leitores, que já estão contando os minutos para os dias de folia ou de descanso, tenham ânimo para ler meus pitacos sobre o lamentável cenário político tupiniquim.

Diante do exposto, venho pensando (mas ainda não resolvi) em suspender as postagens  durante o feriadão que não é feriado, mas, curiosamente, até os Bancos emendam — as agências fecham às 16h00 da próxima sexta, 21, e só reabrirão ao meio-dia da quarta-feira de cinzas.

A portaria federal que regula os feriados e pontos facultativos não considera nem mesmo a terça-feira gorda como feriado, mas é prerrogativa dos estados e municípios criarem suas próprias regras. Demais disso, desde os tempos de antanho que os calendários registram a terça de Carnaval em vermelho, a exemplo dos feriados nacionais. E no Brasil, onde nem o passado é previsível, a única certeza que se tem sobre o futuro é que um dia ele vai chegar e até jabuti sobe em árvore, o buraco é mais embaixo.

Decimus Iunius Iuvenalis, que viveu no século primeiro da Era Cristã, dizia que dar panem et circenses à plebe ignara bastava para mantê-la sob controle. Mais conhecido como Juvenal, esse poeta satírico romana se valia dessa metonímia para criticar o desinteresse de seus compatriotas pela política, devido, segundo ele, à falta de cultura e ao desejo pantagruélico dos plebeus por comilança e diversão.

Passando da metonímia à metáfora, eu sua coluna em Veja do último dia 12 o economista Cláudio de Moura Castro ensina que “A Revolução Tecnológica varre o mundo!” é uma metáfora ruim, pois a vassoura carrega todo o lixo que está no caminho. Para aludir ao fato de a tecnologia avançar aqui e encolher acolá, melhor seria compará-la à panela de pipoca, na qual alguns grãos espocam e pulam longe, enquanto outros goram, recusando-se a se abrir. Dito isso, o texto corre assim:

Automóveis sem motorista já entregam pizza, e voou com sucesso um protótipo de avião sem peças móveis (impulsionado pelo movimento de partículas subatômicas). Mas na semana passada, em Belo Horizonte, vi uma carroça em plena função.

Os romanos já tinham torneiras adequadas. Por que então o chuveirinho higiênico sempre pinga? E as infiltrações no banheiro? E as lajes que vazam? Dormi na casa de um amigo, construída no século XIV. Embora chovesse, não havia goteiras. Por que as nossas têm?

Vaza a pilha que custa um par de reais. Arruína um aparelho caríssimo. O fogão do restaurante produz tanto uma chama estrondosa quanto uma ínfima. Os domésticos não têm nem uma chama forte nem uma fraquinha.

Apesar do emaranhado de aviões chegando e saindo das grandes cidades, o trânsito aéreo flui. Mas no terrestre, quando abre o sinal, é quase certo que o seguinte estará vermelho.
Falando de aeroportos, como se explica padecer em até cinco filas sucessivas antes de entrar em um avião, que é um dos maiores prodígios do engenho humano?

À mesa do hotel, deposito meu fulgurante smartphone ao lado das caixinhas de geleia e manteiga. Por que é impossível abri-las sem se lambuzar? E os enlatados que cortam nossos dedos e não se abrem? A proteção de plástico na tampa dos remédios parece desenhada para impedir seu uso. A embalagem da paçoquinha, ao ser aberta, esboroa todo o conteúdo. Algumas garrafas de água mineral só se abrem com alicate.

O maior perigo de pegar uma infecção está nos hospitais, para onde corremos ao ficar doentes. Às vezes, entra-se com um probleminha e sai-se no caixão. Tancredo Neves foi vítima de infecção hospitalar. Como sanar o problema? Fácil, médicos e enfermeiras devem lavar as mãos com mais frequência.

Uma pérola da burocracia: estava em Bogotá quando recebi a notícia de doença grave na família. Tinha reserva na Latam para o dia seguinte e resolvi antecipá-la. A empresa pediu a documentação do hospital. Ao recebê-la, afirmou que levaria sete dias para avaliar o caso. Ou seja, seis dias depois da passagem marcada e sete depois da data pretendida. Diante do absurdo, a funcionária sugeriu que comprasse uma passagem. O reembolso se resolveria depois. Assim fiz. Mais adiante, um e-mail informou que, como eu havia comprado uma passagem, perdera o direito a um reembolso. Eis a “experiência do cliente”, supostamente valorizada pela empresa. Espero que a burocracia funcione melhor na cabine de comando de seus aviões.

Por que será que algumas áreas são sacudidas pela tecnologia e outras travam, ad aeternum, com suas soluções imbecis? Será porque atraem gente mal educada?”