quinta-feira, 20 de fevereiro de 2020

IMPRENSA BRASILEIRA - DOIS PESOS E DUAS MEDIDAS



Dias atrás, ao comentar numa entrevista o caso de Hans River do Rio Nascimento — o ex-funcionário da Yacows (agência de disparo de mensagens em massa por WhatsApp) que acusou uma jornalista da Folha de “assediá-lo sexualmente” em troca de informações sobre Fake News na campanha presidencial de 2018 — Bolsonaro disparou: "Ela [Patrícia Campos Mello, repórter da Folha] queria um furo. Ela queria dar o furo a qualquer preço contra mim".

A imprensa faz o maior carnaval (sem trocadilho). A Folha emitiu nota afirmando que o presidente da República agrediu a profissional e todo o jornalismo e vilipendiou a dignidade, a honra e o decoro que a lei exige do exercício da Presidência.

Entidades de jornalismo repudiaram e classificaram como um ataque aos jornalistas e à democracia o insulto presidencial. Para a ANJ (Associação Nacional de Jornais), a Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo) e a OAB, a fala de Bolsonaro desrespeita a imprensa e o seu trabalho essencial na democracia. A ABI (Associação Brasileira de Imprensa) chamou a agressão de "covarde" e pediu à PGR que denuncie a quebra de decoro do presidente. Para o Sindicato dos Jornalistas Profissionais de São Paulo, a fala pode ser classificada como injúria e é passível de responsabilização criminal, e a Fenaj (Federação Nacional dos Jornalistas), em nota assinada pela Comissão Nacional de Mulheres, disse que o episódio foi de "machismo, sexismo e misoginia".

Deputados e senadores de oposição discutem a abertura de um processo de impeachment por quebra de decoro. Embora a relatora da CPMI das Fake News, deputada Lídice da Mata, tenha enviado um pedido de investigação à PGR contra Hans, que é acusado de ter mentido durante depoimento à comissão na última terça-feira, e o presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia, ter cobrado punição ao "suposto assediado", o comentário jocoso do presidente assumiu ares de crime de lesa majestade às avessas, e passível de punição com execração pública e outros requintes de absurdez.

Curiosamente, num de seus inúmeros (e invariavelmente calamitosos) pronunciamentos de improviso, a ex-presidanta Dilma Rousseff deu à luz a seguinte pérola: “A mulher abre o negócio, tem seus filhos, cria os filhos e se sustenta. Tudo abrindo um negócio."

A patacoada viralizou nas redes e foi motivo de chacota, mas ninguém aventou a possibilidade de impichar a gerentona de araque por quebra decoro. Dilam acabou afastada do cargo e maio de 2016 e penabundada em agosto do mesmo ano — através de um processo de impeachment legítimo, ao longo do qual lhe foi garantido o direito à mais ampla defesa, embora ela ainda o qualifique de golpe no périplos que faz, a nossas expensas, para espalhar seu besteirol petista.

A rigor, a queda ex-grande-chefa-toura-sentada se deveu a sua falta de jogo de cintura com o Congresso e à maneira catastrófica como ela conduziu a Economia, ainda que as famosas “pedaladas fiscais” (operações orçamentárias não previstas na legislação, que consistem em atrasar o repasse de verba a bancos públicos e privados com a intenção de aliviar momentaneamente a situação fiscal do governo) e os “decretos de suplementação orçamentária” (autorizações de aumento de gastos sem prévio aval do Congresso) tenham sido o motivo oficial do impeachment.

Coisas do Brasil.