domingo, 1 de março de 2020

DOMINGO PÓS CARNAVAL



A pandemia do COVID-19 ainda não foi reconhecida como tal pela OMS. Mas o que é uma pandemia senão uma epidemia de doença infecciosa que se espalha pela população de uma grande região geográfica, como um continente, e daí para o resto do mundo?

Enfim, o ponto que eu quero abordar é outro: a despeito do pânico causado pelo SARS-CoV-2 (esse é o nome do vírus responsável pela doença batizada de COVID-19) e do abalo sísmico registrado nos mercados financeiros do mundo inteiro — na Brasil, depois do recesso carnavalesco o dólar disparou e a Bolsa despencou —, o carnaval prossegue neste final de semana, na base do "quanto riso, oh!, quanta alegria!": Aqui na cidade que Vinícius de Moraes apelidou de “túmulo do samba”, só ontem, oitenta blocos desfilaram, e outros setenta devem se apresentar neste domingo.   

Como diz o ditado, cozinheiros demais entornam o caldo. Pelo visto, o rei Momo ainda reluta em devolver o cetro e a coroa ao legítimo mandatária desta banânia. Resta saber quem se sai melhor no comando desta nau de insensatos, se o alegórico Rei Momo ou se o prosaico ex-capitão do Exército e ex-deputado federal que se elegeu com 57,8 milhões de votos.

Observações:

1 -  Nunca é demais lembrar que a vitória de Bolsonaro se deve em grande medida aos eleitores que só o apoiaram para evitar que o PT voltasse ao Palácio do Planalto, desta feita encarnado no patético bonifrate escaldo para representar o verdadeiro candidato, um criminoso que é réu em uma dezena de processos criminais e já foi condenado em três instâncias no do tríplex e em duas no do sítio, que estava inelegível por ocasião do pleito e como tal deve permanecer até 2035, quando terá 89 anos se ainda não tiver batido a cachuleta e ido infernizar os domínios de Baʿal Zəvûv.

2 -  Bolsonaro de bobo não tem nada. Depois que sobreviveu (miraculosamente) ao atentado em Juiz de Fora, o então candidato seguiu a regra (clichê, mas enfim...) segundo a qual "se a vida lhe dá um limão, faça uma limonada" (ou, como dizia meu ex-cunhado, "já que está no inferno, dê um abraço no capeta"). Mesmo liberado pelos médicos para participar dos debates, o capitão se fez de vítima e não compareceu, evitando um inevitável desgaste. Em suma, três agentes tiveram importância fundamental na sua eleição: Gustavo Bebianno, o publicitário Marcos Carvalho e, por incrível que pareça, Adélio Bispo de Oliveira.

E já que falamos no diabo, o capitão vem sendo chamado jocosamente de Bozo por seus muitos opositores e desafetos. No último sábado (22), a escola de samba carioca Acadêmicos de Vigário Geral exibiu em seu carro alegórico a representação do palhaço Bozo com a faixa presidencial, fazendo o tradicional gesto da arma. Wanderley Tribeck, intérprete do Palhaço Bozo no Brasil (e atualmente é pastor evangélico; como se costuma dizer, quem já foi rei nunca perde a majestade), saiu em defesa do presidente (ou em autodefesa, dependendo do ponto de vista):

“[…]As pessoas vêm chamando o presidente da República de palhaço Bozo. Eu sou o primeiro palhaço Bozo do Brasil, fiz todo aquele sucesso nos anos 80, conquistei cinco troféus imprensa, conquistei três discos de ouro e três de platina. Fui embaixador da Boa Vontade da Unesco nos EUA. O meu nome foi parar na calçada da fama, em Los Angeles, porque fui considerado o maior palhaço do mundo. Portanto, a esquerda está elogiando o nosso presidente quando chama ele de Bozo. Porque o Bozo conquistou uma legião de amigos. As crianças que hoje têm os seus 40, 45 anos amaram o Bozo e continuam amando. O Bozo não fazia nada de maldade. Portanto, Bolsonaro, tenha orgulho quando te chamam de Bozo, porque estão te chamando de uma pessoa boa”.

Pelo menos alguém (além da nova secretária da Cultura, Regina Duarte) defendeu o presidente. Depois de ter sido ameaçado de impeachment devido a um trocadilho de cunho sexual envolvendo a repórter Patrícia Campos Mello — acusada por um ex-funcionário da Yacows (agência de disparo de mensagens em massa por WhatsApp) de “assediá-lo sexualmente” em troca de informações sobre Fake News na campanha presidencial de 2018 — Bolsonaro vem recebendo críticas de figuras políticas, do judiciário e de personalidades por atiçar sua milícia digital contra a jornalista Vera Magalhães — que divulgou pela primeira vez, no Estadão, a notícia de que o capitão compartilhara um vídeo convocando o asfalto para roncar num ato de repúdio ao Congresso, marcado para o próximo dia 15.

Em retribuição à gentileza presidencial, Vera levou às redes uma declaração feita por Bolsonaro em 2018: "Se caísse uma bomba H no Parlamento, pode ter certeza, haveria festa no Brasil."

Em defesa do papai, o pimpolho zero três postou no Twitter: "Esse é o abismo que separa não o presidente de você, Vera. Mas sim a bolha em que você vive da percepção da população em geral Se houvesse uma bomba H no Congresso você realmente acha que o povo choraria? Ou você só faz isso p TENTAR criar atrito entre o presidente e o Congresso?

Vera respondeu: "Acho que se houver uma bomba H no Congresso, do qual o senhor e seu irmão fazem parte, será um ato terrorista. E se o povo não se preocupar com isso, a democracia acabará. A mesma que o seu pai jurou respeitar. Sim, o senhor está certo: há um abismo a nos separar.

Bolsonaro & Filhos perceberam que a imprensa que os imprensa não é parte da crise, apenas se alimenta dela. Após 27 de mandato parlamentar e 14 meses de exercício da Presidência, o capitão caverna continua agindo como um homem de Neandertal, imune a noções mínimas de civilidade e sem qualquer noção do decoro exigido pelo cargo que ora ocupa. Decorridas três décadas do fim de uma ditadura que se dizia proclamada em nome de ideais democráticos, o capitão ainda supõe que o povo está disposto a aceitar uma democracia de fachada, isenta de contraditório. Outros tiveram a mesma ilusão... e se deram mal.

Mais detalhes desse e outros bochichos nos comentários bem-humorados de Maria Cevada e Felipe Xavier no Rolê de Notícias da última sexta (afinal, rir ainda é o melhor remédio):