sexta-feira, 3 de abril de 2020

ATÉ QUANDO, CATILINA, ABUSARÁS DA NOSSA PACIÊNCIA?


Bolsonaro está tentando destruir seu próprio governo, alerta Merval Pereira. Ao postar o vídeo de uma mulher pedindo o exército nas ruas, o presidente mostra que quer forçar uma confrontação. O STF já o proibiu de fazer propaganda que fuja à orientação da OMS e do Ministério de Saúde, mas ele não se emenda.

"Professora em comovente depoimento para o Presidente da República. PEÇO COMPARTILHAR", escreveu Bolsonaro nas redes sociais, alfinetando mais uma vez as medidas de restrições adotadas pelos governadores, embora a OMS e o próprio ministério da Saúde defendam a adoção do isolamento horizontal. Como todo fato tem três versões (a minha, a sua e a verdadeira), houve quem classificasse esse episódio como “o desabafo de uma professora clamando pela retomada da atividade econômica”, que sensibilizou ministros e o presidente Jair Bolsonaro, embora a mulher teça duras críticas à imprensa e peça uma ação dos militares (“uma fala dita no calor do momento”, interpretaram alguns integrantes do governo oriundos das Forças Armadas, que negam a possibilidade de qualquer ação intervencionista).


Como diz um aforismo lá da “terrinhas”, em casa onde falta o pão, todos gritam e ninguém tem razão.  Talvez mais tarde ou amanhã o presidente torne a mudar de ideia e volte a defender enfaticamente o afastamento social, para, em seguida, advogar contra sua própria causa, e então mudar de ideia outra vez. Mas, convenhamos: o comportamento do presidente tem tudo para ser um caso clínico. Não há outra explicação. Diante de 23 assessores próximos e ministros infectados, é impossível que ele não se convença da gravidade da situação e continue insuflando seus seguidores contra seu próprio governo.

Mudando de assunto: Ronaldo Fenômeno, rebatendo críticas sobre os gastos faraônicos para sediar o campeonato mundial de futebol em 2014, afirmou que “não se faz Copa do Mundo com hospitais”. O criminoso Lula não só foi na mesma linha, declarando que “ser contra a Copa por causa dos hospitais seria um retrocesso danado”, como se empenhou pela construção superfaturada da Arena Corinthians, popularmente conhecida como Itaquerão. Aliás, Lula só deixou a cadeia depois de cumprir míseros 580 dias de sua pena porque alguns ministros supremos não têm vergonha, o que nos leva a ter vergonha de nossa mais alta Corte de (In)Justiça, se não de sermos brasileiros (eu, particularmente, já passei da vergonha para o asco, o repúdio, o nojo).  

Para além da vexaminosa derrota por 7 a 1 para a Alemanha, a Copa de 2014 deixou de herança inúmeros elefantes brancos superfaturados, que geraram diversos processos criminais por corrupção. Como dizia o Conselheiro Acácio, personagem do romance “O PRIMO BASÍLIO”, de Eça de Queiroz, o problema com as consequências é que elas vêm depois.

Merval relembra que também deixamos de construir hospitais enquanto nos vangloriávamos de vencer a concorrência para realizar os Jogos Olímpicos de 2016 no Rio de Janeiro. Sabe-se agora que houve fraude na disputa pela indicação, tanto na Copa quanto nas Olimpíadas, e que o Brasil ganhou ambas com a ação de atravessadores e lobistas, comprando os votos de delegados.

Ao abrir a Copa de 2014, a então presidanta Dilma foi apupada com um formidável coro de vaias, num patético reprise do vexame ocorrido na abertura da Copa das Confederações. As manifestações contra a gerentona de araque, que levaram milhões de brasileiros às ruas em 2013, e os recorrentes panelaços que ecoavam cada vez que a mandatária de festim abria a boca em rede nacional, somados à exposição que a Lava-Jato daria início, mais adiante, das entranhas putrefatas das petistas, culminaram, em agosto de 2016, com o impeachment da calamidade em forma de gente.

Hoje, encontram-se espalhados pelo Brasil afora estádios (ou arenas, como passaram a ser chamados) que se transformaram em problemas para governadores de 12 Estados. A maioria não só foi superfaturada como não tem utilidade nem público que lote suas arquibancadas em jogos dos campeonatos locais. Ironicamente, a pandemia transformou várias dessas arenas em hospitais de campanha para atender pacientes infectados pelo coronavírus. É o caso do Pacaembu, em São Paulo, do Presidente Vargas, em Fortaleza, do Mané Garrincha, em Brasília, do Nilton Santos, no Rio, da Arena da Baixada, no Paraná, e da Ilha do Retiro, em Pernambuco.

Como se não bastasse a trágica necessidade de transformar arenas esportivas em hospitais — fenômeno que de resto acontece em diversos países pela gravidade da pandemia da Covid-19 — o presidente da vez continua fazendo bolsonarices, revivendo o FEBEAPÁ — Festival de Besteiras que Assola o País (do inesquecível Stanislaw Ponte Preta), durante a ditadura militar que Bolsonaro insiste em dizer que nunca existiu. E após ter feito um discurso equilibrado e ponderado na terça-feira, o capitão voltou a seu normal ao divulgar um vídeo fake sobre uma suposta falta de mercadorias na Ceasa de Belo Horizonte, para forçar uma mudança na política de isolamento horizontal.

Uma vez que o esclarecidíssmo eleitorado tupiniquim jamais dedicou um minuto sequer ao estudo da história — e quem não se atém ao passado está fadado a repetir os mesmos erros no futuro —, à parcela pensante da população resta sempre escolher de dois males o menos pior. No caso em tela, trocamos a corrupção financeira institucionalizada e roubalheira em larga escala pela falta de envergadura e excesso de teimosia e ignorância que levam à corrupção dos hábitos e costumes nacionais. E quem sempre sai perdendo é o povo e a democracia.