segunda-feira, 13 de abril de 2020

SOB O COMANDO DE UM PSICOPATA? — PARTE 6



Na tarde da última segunda-feira, 6, Bolsonaro voltou a flertar com a demissão de Mandetta (detalhes nesta postagem). Dia seguinte, em entrevista ao Estadão, disse o ministro: "(...). Fui ler o Mito da Caverna, que tinha lido aos 14 anos pela primeira vez e já li umas 20 até hoje e não consigo entender e continuei sem entender (...) ".

O Mito da Caverna é uma alegoria sobre o conhecimento na qual Platão ensina que, acorrentados à ignorância, os homens são privados do aprendizado. Ele pode ser lida em A República e mostra o diálogo entre Sócrates e Glauco sobre ignorância e conhecimento — sobretudo sobre a importância de se ter acesso a conhecimento para sairmos da caverna (e para queremos ficar fora dela). Mandetta traçou um paralelo entre a caverna e o governo, onde, acorrentados a superstições, o capitão e seus súditos vivem num universo paralelo de sombras. A insistência do ministro em combater o coronavírus à luz da ciência faz dele o ex-acorrentado que viu a luz e foi morto ao tentar libertar os demais dos grilhões da ignorância.

Por enquanto, Mandetta fica — assim decidiram os ministros generais Walter Braga Netto (Casa Civil) e Luiz Eduardo Ramos (Governo), para os quais a melhor decisão é manter o ministro, pelo menos por enquanto. Mas a possibilidade de exoneração continua real. Para o ministro, que segue a linha defendida pela OMS e por cientistas e imunologistas do mundo inteiro (e adotada pela maioria dos países), a hidroxicloroquina não pode ser usada de maneira indiscriminada e não é hora de flexibilizar o isolamento. Para o presidente, o droga é a panaceia que varrerá o coronavírus da face da terra, e manter o lockdown é arrasar a economia e enterrar suas cada vez mais exíguas chances de se reeleger. Não há outra explicação para a teimosia de Bolsonaro que não essa divergência de opiniões. Para além disso, só ingressando no campo da psiquiatria. Ou no da aleivosia — poder-se-ia imaginar que o presidente esteja se valendo de uma estratégia genial e, ao mesmo tempo, sutil a tal ponto de ninguém se dar conta, mas eu não apostaria nisso.

Tudo somado e subtraído, são favas contadas — se é que existe alguma certeza até onde a vista alcança — a troca do comando da pasta da Saúde tão logo surja no horizonte a perspectiva de retorno à normalidade (ou a algum tipo de normalidade). E é possível as mudanças irem além da pasta da Saúde, como quem viver verá.  Isso se Bolsonaro não renunciar nem for deposto — aliás, talvez fosse a hora de entregar o timão aos sábios, já que os lunáticos não levaram a Nau dos Insensatos a bom porto. Enfim, mais cedo ou mais tarde teremos de sepultarmos os mortos, reabrir os portos e cuidar dos vivos (se o leitor me concede esta tosca adaptação do conselho que deu o Marquês de Alorna ao rei de Portugal Don José, em 1755, quando Lisboa foi devastada por um terremoto).

Voltando agora aos aliados de Bolsonaro que se tornaram desafetos, depois focar Bebianno e Janaína (na postagem anterior), dedico algumas linhas a Alexandre Frota — lembrando que seu currículo de ator pornô não está em discussão neste momento.

Frota foi um dos bolsonaristas mais aguerridos e, sem jamais ter disputado nenhum cargo público, elegeu-se deputado federal na esteira da expansão do PSL em 2018 (foi o terceiro mais votado da sigla em São Paulo, com 155 mil votos). Na Câmara, integrou a tropa de choque do governo e foi um dos parlamentares mais atuantes no processo de aprovação da reforma da Previdência, chegando mesmo a receber elogios de Paulo Guedes. Mas a lua-de-mel azedou em meados do ano passado, quando ele criticou a escolha de Eduardo Bolsonaro para a embaixada do Brasil nos Estados Unidos, e terminou quando, da tribuna da Casa, defendeu a prisão de Fabrício Queiroz. Expulso do PSL, filiou-se ao PSDB e, no dia 19 do mês passado, protocolou o segundo pedido de impeachment contra Bolsonaro (o primeiro havia sido protocolado dois dias antes pelo deputado distrital Leandro Grass).

Embora seja crítico de nove a cada dez frases e atos de Bolsonaro, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, dono e senhor da caneta que pode mandar seguir ou extinguir pedidos de abertura de impeachment contra o Chefe do Executivo, não fará nem uma coisa nem outra durante a pandemia. Segundo ele, só decidirá o que fará com os pedidos que já recebeu — e quaisquer outros que venham a chegar — após a Covid-19.

Conclui na próxima postagem...