O governador João Dória alterou mais uma vez o prazo
de validade das medidas restritivas de isolamento social no Estado, postergando
até o dia 31 a flexibilização que estava prevista para ser suspensa nesta segunda-feira. Já o prefeito da capital, Bruno Covas, ressuscitou
o rodízio de veículos, que volta a valer também a partir de amanhã, só que num
formato bem mais restritivo.
O alcaide tenta nos vender essa medida questionável como alternativa
menos traumática ao lockdown. Segundo sua equipe de luminares, o novo
modelo deve tirar das ruas, diariamente, cerca de 4 milhões de
veículos. Lembro de ter lido certa vez que, se 1/3 dos veículos
licenciados no município saíssem ao mesmo tempo, o trânsito viraria um nó
górdio que nem Alexandre, o grande, desataria.
Mas a pergunta
que importa é: que alternativa terá quem exerce atividades ditas
“essenciais” nos dias em que não poderá usar o carro? Trabalhar em dias alternados? Preencher um cadastro confuso num
daqueles sites que não carregam e, ao final, ser multado e ter de acessar outro
site que não carrega para interpor recurso, e torcer para que os membros das
JARIs (Juntas Administrativas de Recursos de infrações) não usem o formulário
como papel higiênico nos banheiros dos DETRANs?
Parece-me mais do que evidente que o risco de se
infectar usando o próprio carro é bem menor do que recorrendo ao ineficiente,
inseguro e insalubre transporte coletivo. A intenção do prefeito pode ser
louvável, mas seus elusivos pilotos de prova de escrivaninha deveriam levar em
conta que as pessoas precisam comprar medicamentos nas farmácias, víveres e
produtos de higiene nos supermercados, o pão nosso de cada dia nas padarias, e
por aí vai. E que muita gente, sobretudo entre os mais idosos, não sabe usar ou
não confia em aplicativos de delivery.
Outra absurdez é obrigar a população a usar máscara na rua, ao ar
livre e sob céu aberto. Um dos raros consensos entre os epidemiologistas,
virologistas, imunologistas, quando se trata da Covid-19, é a
recomendação de abrir as janelas de casa para manter os ambientes ventilados e
arejados. Se esse ar vem das ruas, então...
Aliás, se o poder público se arroga o direito
de tornar obrigatório o uso das máscaras, ele que as forneça, já que elas sumiram do mercado — quando se consegue encontrá-las, elas custam os olhos da cara. (Em meados de março,
uma caixa de máscaras cirúrgicas, que custava R$ 4,50 antes da pandemia, passara a custar R$ 140!)
Mudando o foco de São Paulo para BrasIlha da Fantasia, na
última quinta-feira, depois de afirmar que não pode passar por cima do Supremo — referindo-se à decisão que deu autonomia para estados e municípios estabelecerem restrições à circulação e ao comércio — o general da banda liderou um pelotão de ministros de Estado e empresários dos
setores têxtil, farmacêutico, de produção de cimento, automóveis, energia,
cimento, máquinas e calçados, que, à pé, atravessou a Praça dos
Três poderes para fazer uma “visita de cortesia” ao atual inquilino do gabinete
da presidência do STF.
O alegado objetivo dessa pantomima, que não constava nem na agenda de Toffoli, nem na de Bolsonaro, mas foi solicitada a toque de caixa pelo novo ministro da Justiça (com meia hora de
antecedência), era chamar a atenção dos togados para os efeitos nefastos das medidas de isolamento social na economia. Paulo Guedes comparou a situação à de um
paciente na UTI com sinais vitais estáveis, mas fadado a acabar no
cemitério (se as restrições não forem afrouxadas). Durante 30
minutos do mais puro constrangimento, falou-se até da possibilidade de o
Brasil se “transformar numa Venezuela” — do ponto de vista da economia,
não da política, com bem salientou o Posto Ipiranga.
Curiosamente, a
analogia da UTI se aplica ao próprio Guedes, que o presidente ora frita, ora
adula. Na semana passada, o deputado Major Vitor Hugo (líder do governo
na Câmara) reconheceu que defendeu o destaque do PDT — que reduziu a
economia para os cofres públicos de R$ 130 bilhões para R$ 43 bilhões
no âmbito do projeto de socorro a estados e municípios — por determinação
do
próprio Bolsonaro. Com amigos assim, quem precisa de inimigos?
Observação: A analogia também vale para a situação precária de Bolsonaro,
cujo governo pode evoluir da UTI para o cemitério se Rodrigo Maia
decidir dar andamento a um dos mais de 30 pedidos de impeachment que se
acumulam sobre sua mesa, ou se o inquérito aberto pela PGR sobre a tentativa
de interferência de Bolsonaro na Polícia Federal tiver o desfecho
esperado.
Por último, mas não menos importante: Depois de anunciar
um churrasco para este sábado no Alvorada, o capitão disse que a ideia era "fake", chamou os jornalistas de "idiotas" por
terem acreditado (?!) e criticou o MBL por acionar a Justiça na tentativa de
vetar o suposto evento.
Reportagem
da Folha informa que políticos aliados chegaram a receber convites para
o churrasco, o que indica que havia, de fato, a intenção de promover a efeméride, mas a onda de protestos resultantes de fazer uma churrascada justamente quando o número de mortes por coronavírus
no Brasil passava a ter cinco algarismos levou o presidente a voltar atrás.
Como se vê, tudo tem limite, inclusive a
estupidez.