Por uma série de motivos que não vou detalhar neste momento
(até porque seria chover no molhado), o Brasil se tornou o epicentro latino
americano da pandemia de Covid-19 e já ocupa o segundo lugar no ranking
mundial. Segundo dados da última quinta-feira, são 414.661 casos confirmados da doença, 166.647 pacientes recuperados
e 25.697 óbitos.
Mesmo que a norma culta da língua abomine o uso de chavões,
há situações em eles calçam tão bem quanto um chinelo velho num pé doente, o que os torna irresistíveis. É o caso da mais conhecida das “Leis de Murphy”,
segundo a qual nada é tão ruim que não possa piorar. E com efeito.
Depois de bloquear parcialmente a malha viária da capital paulista e de implementar um mega rodízio de veículos, o prefeito Bruno Covas resolveu torturar o calendário gregoriano transformando o dia 20 de maio em 11 de junho (feriado de Corpus Christi) e o dia seguinte em 20 de novembro (dia da Consciência Negra).
Para não ficar atrás, o governador João Doria repetiu a dose na segunda-feira subsequente, 25 de maio, que passou a ser 9 de Julho (feriado comemorativo da Revolução Constitucionalista de 1932). O motivo que levou ambos a essa estultice era, obviamente, aumentar a adesão da população ao isolamento, mas o resultado, obviamente, ficou muito aquém do desejado.
Depois de bloquear parcialmente a malha viária da capital paulista e de implementar um mega rodízio de veículos, o prefeito Bruno Covas resolveu torturar o calendário gregoriano transformando o dia 20 de maio em 11 de junho (feriado de Corpus Christi) e o dia seguinte em 20 de novembro (dia da Consciência Negra).
Para não ficar atrás, o governador João Doria repetiu a dose na segunda-feira subsequente, 25 de maio, que passou a ser 9 de Julho (feriado comemorativo da Revolução Constitucionalista de 1932). O motivo que levou ambos a essa estultice era, obviamente, aumentar a adesão da população ao isolamento, mas o resultado, obviamente, ficou muito aquém do desejado.
Manda quem pode e obedece quem tem juízo, diz outro
velho chavão. Ninguém tentou (ainda) antecipar o verão para o mês de junho — talvez
porque as crises nas regiões Norte e Nordeste sugiram que o calor não dificulta a propagação do Sars-CoV-2. Por outro lado, o frio (que
já deu o ar da graça por aqui, onde os termômetros registraram temperaturas
abaixo dos 10º C nas últimas madrugadas) leva as pessoas a se agrupar em ambientes
fechados. Isso sem mencionar que, com temperaturas mais baixas, os
movimentos ciliares no pulmão diminuem, prejudicando remoção de
impurezas, vírus e bactérias e, consequentemente, aumentando a incidência de doenças respiratórias — e o número de óbitos entre os infectados pelo coronavírus.
Mas a crise sanitária é "apenas" um dos nossos problemas. Igualmente preocupante é a recessão que se avizinha: a julgar pelo aumento do desemprego e pela projeção da queda do PIB (em torno de 4 pontos percentuais em 2020), a crise econômica tende a ser a maior da história recente. “Estamos no pior dos mundos: a adesão ao isolamento social é
baixa e os negócios estão fechados. Não se têm nem os benefícios de um nem de
outro”, afirma Alexandre Schwartsman, ex-diretor de Assuntos
Internacionais do Banco Central.
Para piorar o que já está bem ruim, ocupa a cabine de
comando da Nau dos Insensatos um capitão considerado pelo jornal The
Washington Post o pior
dos líderes globais no combate à pandemia da Covid-19. E não sem
razão: Bolsonaro nega desde o início a gravidade do problema (que qualificou de "gripezinha
de nada") e não perde uma oportunidade sequer de conclamar as pessoas a voltarem às ruas.
Com um governo hesitante e desorganizado no combate à doença, a média de respeito
à quarentena em território nacional vem caindo ao longo das semanas. Enquanto a
maior parte do Brasil ainda caminha no escuro, sem saber quando poderá retornar à normalidade, alguns estados à beira do colapso no sistema de saúde têm sido
obrigados a decretar o chamado lockdown — política que bloqueia e limita
drasticamente o trânsito de pessoas e veículos e suspende atividades não essenciais.
Em São Paulo, epicentro da pandemia no país, o governador tornou obrigatório o uso de máscara em locais públicos e já alertou diversas vezes para a possibilidade de decretar o lockdown, o que, em considerando o número moradores em situação de rua e de favelas (ou comunidades, como quer a polícia do politicamente correto), provavelmente seria outro tiro no pé.
Em São Paulo, epicentro da pandemia no país, o governador tornou obrigatório o uso de máscara em locais públicos e já alertou diversas vezes para a possibilidade de decretar o lockdown, o que, em considerando o número moradores em situação de rua e de favelas (ou comunidades, como quer a polícia do politicamente correto), provavelmente seria outro tiro no pé.
Fazer previsões de como estaríamos agora se essa
ou aquela medida tivesse sido adotada meses atrás — como o cancelamento do
carnaval, que muitos consideram um dos grandes responsáveis pelo
desembarque do vírus no Brasil e, principalmente, por acelerar sua disseminação
(por motivos cuja obviedade dispensa comentários) — não passa de mero e
infrutífero exercício de futurologia do pretérito (mais detalhes nesta
postagem).
Por outro lado, parece evidente que a entrada do Brasil nessa situação — em que todos perdem e ninguém ganha — deve-se sobretudo aos embates entre um presidente que prega a volta à normalidade, uma maioria de governadores que decretam quarentenas e dezenas de prefeitos que ora pendem para um lado, ora para o outro. Além, evidentemente, da gritante falta de educação e informação da população tupiniquim. Todavia, nada indica que a situação seria muito diferente (isso se não fosse pior) no caso de terem sido eleitos os adversários políticos dessa seleta confraria que hoje nos desgoverna.
Por outro lado, parece evidente que a entrada do Brasil nessa situação — em que todos perdem e ninguém ganha — deve-se sobretudo aos embates entre um presidente que prega a volta à normalidade, uma maioria de governadores que decretam quarentenas e dezenas de prefeitos que ora pendem para um lado, ora para o outro. Além, evidentemente, da gritante falta de educação e informação da população tupiniquim. Todavia, nada indica que a situação seria muito diferente (isso se não fosse pior) no caso de terem sido eleitos os adversários políticos dessa seleta confraria que hoje nos desgoverna.
Atribuir responsabilidades, a esta altura, é cretinice. Urge resolver os problemas. Mas o problema (mais um) é que o presidente Bolsonaro tanto é culpado por grande parte dos problemas quanto se torna parte ele próprio desses problemas ao criar cizânias com governadores ("Esse vírus
trouxe uma certa histeria e alguns governadores, no meu entender, estão tomando
medidas que vão prejudicar e muito a nossa economia"), dar caneladas no
presidente da Câmara Federal e em ministros do STF, boladas nas costas de
aliados, e por aí vai.
Observação: O caso de Sergio Moro (que Bolsonaro
fritou que
durante 16 meses) é emblemático, sem desmerecer os episódios
envolvendo Henrique
Mandetta (o capitão moveu montanhas para forçar a demissão do médico)
e Nelson
Teich (que, menos resiliente, pediu demissão antes mesmo de completar
um mês no cargo).
Duas trocas no comando na Saúde em pouco mais de três semanas — e isso em meio a uma pandemia viral de proporções épicas — só não é mais absurdo que deixar o Ministério acéfalo, sob a interinidade de um militar de alta patente que talvez seja expert em logística, mas não entende bulhufas de medicina. Dizendo de outra maneira, é como chamar um borracheiro para cuidar das unhas e uma manicure para consertar um pneu furado.
Em meio a tantos problemas, não existe uma definição sobre um novo titular para a pasta. Outros países fizeram trocas no comando da saúde por razões políticas pessoais ou de gestão, como Bolívia, Equador e Holanda. Mas a queda de dois ministros em curto espaço de tempo é uma triste exclusividade brasileira. Durante a maior tempestade sanitária dos últimos 100 anos, o país sofre com a falta de liderança e com os desmandos do presidente.
Quanto mais íngreme se torna a curva de contágio da Covid-19, mais o presidente sobe o tom das asnices e lustra os cascos das patas do coice. Quando o número de vítimas fatais ultrapassou a marca dos 5 mil, o desvairado posou para fotos num stand de tiro e reagiu à notícia com o sarcasmo habitual: “Vai morrer gente. E daí? Lamento. Quer que eu faça o quê? Eu sou Messias, mas não faço milagre”. E esse é só um exemplo dentre muitos que eu poderia citar — mas não vou.
Na terça, 19, o mesmo dia em que o número de mortos por aqui ultrapassou a barreira dos 1.000 casos, Bolsonaro gastou tempo em uma live fazendo piada com uma rima forçada de cloroquina com tubaína. Ele ri — e a nação chora uma tragédia diária, sob os olhares surpresos e preocupados do mundo inteiro com a catástrofe que vem acontecendo por aqui.
Em meio a tantos problemas, não existe uma definição sobre um novo titular para a pasta. Outros países fizeram trocas no comando da saúde por razões políticas pessoais ou de gestão, como Bolívia, Equador e Holanda. Mas a queda de dois ministros em curto espaço de tempo é uma triste exclusividade brasileira. Durante a maior tempestade sanitária dos últimos 100 anos, o país sofre com a falta de liderança e com os desmandos do presidente.
Quanto mais íngreme se torna a curva de contágio da Covid-19, mais o presidente sobe o tom das asnices e lustra os cascos das patas do coice. Quando o número de vítimas fatais ultrapassou a marca dos 5 mil, o desvairado posou para fotos num stand de tiro e reagiu à notícia com o sarcasmo habitual: “Vai morrer gente. E daí? Lamento. Quer que eu faça o quê? Eu sou Messias, mas não faço milagre”. E esse é só um exemplo dentre muitos que eu poderia citar — mas não vou.
Na terça, 19, o mesmo dia em que o número de mortos por aqui ultrapassou a barreira dos 1.000 casos, Bolsonaro gastou tempo em uma live fazendo piada com uma rima forçada de cloroquina com tubaína. Ele ri — e a nação chora uma tragédia diária, sob os olhares surpresos e preocupados do mundo inteiro com a catástrofe que vem acontecendo por aqui.
É de pequenino que se desentorta o pepino, diz outro
velho chavão. No caso do capitão caverna, deixamos um câncer evoluir para
metástase e tornar-se impossível de controlar senão mediante a extirpação dos órgãos atingidos e boa parte de seu entorno. Mas não há leito vago na clínica do Dr.
Rodrigo Maia, e 35 pedidos de impeachment correm sério risco de morrer
na fila por omissão de socorro. E recorrer ao Dr. Augusto Aras parece não fazer o menor sentido, já que interessa mais a esse douto senhor uma cadeira no "conselho
de administração do nosocômio" do que fazer seu trabalho. Assim, o risco de o carcinoma crescer a ponto de se tornar inoperável fica maior a cada dia.
Em setembro do ano passado, logo depois de indicar Aras para o cargo, Bolsonaro comparou o procurador-geral à figura da rainha em um jogo de xadrez. A peça tem a maior capacidade de movimentação e, por isso, é, ao mesmo tempo, a mais potente arma de ataque aos adversários e o mais importante esteio de defesa do rei no tabuleiro. Antes da posse, Aras comentou com um amigo o tamanho da responsabilidade que estava prestes a assumir. “O PGR tem mais poder que o papa”, brincou. É fato. Um procurador negligente pode proteger amigos e perseguir adversários. Um procurador justiceiro pode fulminar carreiras e destruir a biografia de inocentes. Um procurador omisso pode favorecer criminosos. Oito meses depois da posse, Aras terá a oportunidade de mostrar que não é negligente, justiceiro nem omisso diante das bombas que estão sobre sua mesa. É apenas um PGR responsável e meticuloso.
Em setembro do ano passado, logo depois de indicar Aras para o cargo, Bolsonaro comparou o procurador-geral à figura da rainha em um jogo de xadrez. A peça tem a maior capacidade de movimentação e, por isso, é, ao mesmo tempo, a mais potente arma de ataque aos adversários e o mais importante esteio de defesa do rei no tabuleiro. Antes da posse, Aras comentou com um amigo o tamanho da responsabilidade que estava prestes a assumir. “O PGR tem mais poder que o papa”, brincou. É fato. Um procurador negligente pode proteger amigos e perseguir adversários. Um procurador justiceiro pode fulminar carreiras e destruir a biografia de inocentes. Um procurador omisso pode favorecer criminosos. Oito meses depois da posse, Aras terá a oportunidade de mostrar que não é negligente, justiceiro nem omisso diante das bombas que estão sobre sua mesa. É apenas um PGR responsável e meticuloso.
Nesse entretempo, o inquérito das fake news, as investigações sobre o folclórico
gabinete do ódio (que a deputada Joice Hasselmann havia
cantado em prosa e verso, meses atrás, para parlamentares que se fizeram de moucos) e o imbróglio que teve como estopim a demissão do ex-ministro Sergio
Moro vêm contribuindo para azedar o humor
do general da banda.
Ontem, o ministro Fachin decidiu encaminhar para deliberação plenária o pedido de suspensão das investigações do inquérito das notícias falsas, feito pelo PGR após a deflagração de operação da PF para cumprir 29 mandados de busca e apreensão contra empresários, blogueiros e políticos aliados do presidente, supostamente vinculados a uma rede de disseminação fake news (o tal gabinete do ódio). O procedimento foi aberto em março por decisão monocrática de Dias Toffoli, sob a alegação de combater a veiculação de notícias que atingem a honorabilidade e a segurança da Corte, de seus membros e parentes.
Não é a primeira vez que a PGR defende fim das investigações. No ano passado, antes de deixar o comando da instituição, Raquel Dodge determinou o arquivamento do inquérito, mas decisão não foi aceita pelo ministro Alexandre de Moraes, que deu continuidade às investigações. O pedido de Aras foi feito no bojo de uma ação apresentada pela Rede Sustentabilidade, que questiona o inquérito e tem o ministro Fachin como relator.
Para Bolsonaro, que já estava irritado com Celso de Mello (por ter liberado o folclórico vídeo da reunião ministerial do dia 22 de março), a decisão de Alexandre de Moraes foi a gota: “Acabou,
porra”, esbravejou o capitão, na porta do Palácio da Alvorada, depois de ter afirmado que "ordens
absurdas não se cumprem".
O presidente da Câmara criticou as declarações do capitão sobre os ministros do STF e a operação da PF. Segundo Maia, isso “só
cria um ambiente de maior radicalismo entre as instituições". O deputado também reprovou a declaração de Eduardo Bolsonaro sobre a
necessidade de adoção de uma "medida enérgica" pelo pai: “A
fala é muito ruim, muito grave, e vamos continuar trabalhando para que as
instituições continuem trabalhando de forma independente e tentando ao máximo o
diálogo e a harmonia”, disse.
Sobre o pedido
do Planalto para suspender o depoimento
do ministro Abraham Weintraub à PF, Maia ponderou que as
decisões dos poderes têm que ser respeitadas para que a democracia seja
respeitada não apenas no país, mas internacionalmente, e que as decisões
judiciais podem até ser contestadas e criticadas, mas que, se o recurso não for
acatado, as determinações devem ser obedecidas.
Quando é cobrado a decidir sobre os mais de trinta pedidos de impeachment já apresentados contra Bolsonaro, o presidente da Câmara costuma dizer que pretende deixar como marcas de sua passagem pelo comando da Casa a moderação e a aprovação de uma agenda econômica prioritária para o país. A deflagração de uma guerra política, principalmente em meio à grave crise que o Brasil enfrenta, não estaria entre as suas prioridades. Evidentemente, sua ponderada posição não encerra apenas uma preocupação com o país, como Maia tanto faz questão de ressaltar. Ela traz também um cálculo político.
A moderação e a pauta econômica são as apostas do parlamentar para continuar se equilibrando como o principal interlocutor dos donos do dinheiro no Congresso mesmo quando ele deixar a presidência da Câmara. Mais: são suas apostas para figurar, pelo menos como vice, em alguma das chapas presidenciais de centro em 2022 — uma bela lição para quem acha que política é a arte de torcer pela desgraça alheia.
Quando é cobrado a decidir sobre os mais de trinta pedidos de impeachment já apresentados contra Bolsonaro, o presidente da Câmara costuma dizer que pretende deixar como marcas de sua passagem pelo comando da Casa a moderação e a aprovação de uma agenda econômica prioritária para o país. A deflagração de uma guerra política, principalmente em meio à grave crise que o Brasil enfrenta, não estaria entre as suas prioridades. Evidentemente, sua ponderada posição não encerra apenas uma preocupação com o país, como Maia tanto faz questão de ressaltar. Ela traz também um cálculo político.
A moderação e a pauta econômica são as apostas do parlamentar para continuar se equilibrando como o principal interlocutor dos donos do dinheiro no Congresso mesmo quando ele deixar a presidência da Câmara. Mais: são suas apostas para figurar, pelo menos como vice, em alguma das chapas presidenciais de centro em 2022 — uma bela lição para quem acha que política é a arte de torcer pela desgraça alheia.
A ver que merda isso vai dar. Por enquanto, a única certeza que se
tem é de que isso vai dar merda. Na atual conjuntura não dá para cantar a bola antes de ela cair na caçapa.