A Fiocruz, referência para diagnóstico molecular de SARS-CoV-2, confirma que recebeu e processou amostras enviadas pelo Palácio do Planalto, de acordo com o método de RT-PCR (em tempo real), mas que, como o material não estava identificado com os dados do paciente, somente o governo sabe realmente de quem eram as amostras. No ofício enviado ao STF, a AGU afirma que o nome de Bolsonaro foi preservado em razão "da grande repercussão pela mídia do estado de saúde do Sr. presidente".
Desde março, quando voltou dos EUA e mais de 20 integrantes de sua comitiva testaram positivo para o vírus, Bolsonaro vinha se negando a exibir os laudos dos três exames a que foi submetido, embora dissesse que todos eles deram negativo. Zero Três chegou a dizer à emissora de TV Fox News que o pai tinha contraído o vírus, mas voltou atrás.
O jornal Estado de São Paulo recorreu ao Judiciário para obrigar o Planalto a exibir os resultados (a saúde do presidente da República é bem de interesse público). Após decisões conflitantes nas instâncias inferiores, o togado supremo Ricardo Lewandowsky tornou públicos os resultados dos exames. Os testes deram negativo, mas, no Sabin, foram usados os pseudônimos "Airton Guedes" e "Rafael Augusto Alves da Costa Ferraz"; no laboratório da Fiocruz, a amostra foi identificada como "paciente 05". Apesar disso, foram informados corretamente o RG, o CPF e a data de nascimento de Bolsonaro.
O jornal Estado de São Paulo recorreu ao Judiciário para obrigar o Planalto a exibir os resultados (a saúde do presidente da República é bem de interesse público). Após decisões conflitantes nas instâncias inferiores, o togado supremo Ricardo Lewandowsky tornou públicos os resultados dos exames. Os testes deram negativo, mas, no Sabin, foram usados os pseudônimos "Airton Guedes" e "Rafael Augusto Alves da Costa Ferraz"; no laboratório da Fiocruz, a amostra foi identificada como "paciente 05". Apesar disso, foram informados corretamente o RG, o CPF e a data de nascimento de Bolsonaro.
Mudando de um ponto a outro, mas ainda tratando das aleivosias do luminar que, supostamente, preside este país, a defesa de Sergio Moro pediu que o STF
divulgue a íntegra do vídeo da reunião ministerial na qual, segundo o
ex-ministro, caracterizam a interferência de Bolsonaro na PF,
apesar de os ministros militares, nos depoimentos prestados na última terça-feira,
afirmarem que o presidente tratava da sua segurança e da de seus familiares no
Rio de Janeiro. O ministro Celso de Mello deu
prazo de 48 horas para Moro, a PGR e a AGU se
manifestaram sobre a retirada do sigilo do vídeo.
Os generais reagiram com indignada contundência às informações
veiculadas pela imprensa de que alinharam o discurso para reforçar a versão
do presidente (os arquivos .PDF com a transcrição dos
depoimentos podem ser acessados a partir da minha postagem de ontem). Augusto Heleno, ministro do GSI, escreveu no Twitter:
"Não alinhei minha versão com ninguém." Também pelo Twitter, o vice-presidente colocou a reputação dos companheiros de farda
nos seguintes termos: "Quem alinha discurso é bandido. Homens de honra,
como Augusto Heleno, Braga Netto e Ramos, falam a verdade e cumprem a missão."
Quando aceitaram participar do governo, os generais pareciam
encantados com a ideia de ensinar a um capitão rude como se comportar nos
salões do Poder. Imaginaram que, dividindo a mesa com o presidente,
conseguiriam convencê-lo a não comer mais com as mãos, passando a manusear
adequadamente os talheres. Deu errado. Além de não conseguir ensinar boas
maneiras a Bolsonaro, os generais foram colocados para lavar a louça. É
esse o papel que eles desempenharam como depoentes no inquérito sobre a
intervenção política na Polícia Federal.
A declaração de Mourão coloca os três ministros
quatro estrelas numa situação de tudo ou nada. Se ficar comprovado que
distorceram ou ocultaram a verdade dos fatos para dar veracidade à versão de Bolsonaro,
terão a imagem de "homens de honra" abalada.
Observação: Deve doer nos generais do governo
civil mais militar da história a ideia de desempenhar o papel de figurantes
obscuros num enredo confuso, em que o protagonista é um capitão incendiário e
cujo epílogo é um negócio fechado com os prontuários do centrão.
A estratégia do Planalto, corroborada pelos depoimentos dos
generais e pelas declarações públicas do capitão nos últimos dias, é a de alegar
que Moro entendeu mal a cobrança feita na tal reunião ministerial. A
reclamação seria geral e, na questão específica que foi interpretada como uma
cobrança à PF, se dirigia na verdade ao GSI.
O problema é que essa versão conflita com o conteúdo de
mensagens de celular em que Bolsonaro envia a Moro, horas antes
da fatídica reunião ministerial, o link para uma reportagem sobre as
investigações da PF sobre fake news, que estariam chegando a
deputados de sua base aliada (entre os quais o filho Zero Três), e
comenta: "Mais um motivo para a troca.”
Outro fato complicador é o de que o presidente foi
explícito, em outras ocasiões, em sua intenção de trocar o superintendente da PF
no Rio de Janeiro, Ricardo Saadi, sem apresentar qualquer justificativa
plausível. Bolsonaro diz que queria mais eficiência daquela
superintendência, mas o delegado demonstrou em seu depoimento que o índice
de produtividade melhorou sob sua gestão.
O ex-presidente FHC alertou para o risco de os
militares passarem "a ter gosto pelo poder". Na Venezuela, isso
levou
à corrosão dos valores das Forças Armadas e acabou dando
sustentação à ditadura chavista. Quanto mais comprometidos com os
meandros e conchavos dos bastidores do poder os militares se tornam, mais eles
se afastam de suas responsabilidades constitucionais — e se transformam em
alvos fáceis quando tentam recuperar sua reputação.
Vivemos em tempos de polarização fanática, embora nada seja mais cretino e cretinizante do que a paixão política, a única capaz de imbecilizar
o homem. Enfim, há quem diga que o vídeo da já folclórica reunião ministerial seja devastador, com há também quem o ache totalmente inócuo. E isso quando a transcrição ainda nem foi
divulgada. Para piorar, ambas as alas respaldam suas teorias em argumentos
convincentes. Com versões assim, os fatos se tornam dispensáveis, servem apenas para atrapalhar.
Segundo Josias de Souza, há quem diga que a
desavença inaugurada por Moro transformou Bolsonaro num fiapo
político, mas
não forneceu matéria-prima para uma denúncia criminal. Ao desembarcar
do governo com os lábios no trombone, o ex-ministro denunciou uma trama em fase
de execução: a conversão da PF num aparato político. Ao suspender a
nomeação de Alexandre Ramagem, amigo dos Bolsonaro, para o cargo
de diretor-geral da PF, o ministro Alexandre de Moraes evitou o
que poderia ser o início da execução da trama. Assim, na visão de quem deseja
acender o forno de assar pizzas, Moro e Moraes teriam iluminado o
caminho que Bolsonaro construía em direção ao abismo antes que o crime
fosse cometido.
Para outros, a narrativa do presidente, de que
estava se referindo à segurança pessoal de seus filhos e amigos, e não à PF, não para em pé. Se essa fosse realmente a preocupação do mito mitômano, ele demitira o general Heleno e o delegado Ramagem, chefe da ABIN. Nada bate com coisa alguma. O ministro Celso de Mello
precisa autorizar a divulgação do vídeo, pois só assim poderemos ver o
ambiente da reunião e o contexto em que aconteceram os diálogos.
Augusto Aras, depois de ouvir
todas as testemunhas e analisar o vídeo, poderá oferecer ou não a denúncia.
Mas, analisando toda a situação, juntando todas as peças desde agosto do ano
passado, quando Bolsonaro começou a falar em mexer na PF até
agora, o PGR vai ter que fazer muito malabarismo para justificar um
arquivamento. Até porque não encontrará apoio entre os procuradores para
arquivar.
O detalhe — e o diabo mora nos detalhes — é que Aras
é virtual candidato a ocupar a cadeira de Celso de Mello, que se
aposenta do STF agora em novembro. No
Planalto, dá-se de barato que seu namoro com o arquivo será
plenamente correspondido. É contra esse pano de fundo que os investigadores do
caso tentam trazer à tona elementos capazes de atenuar o cheiro de orégano que
começa a impregnar a atmosfera de Brasília.
Por último, mas não menos importante, na célebre reunião ministerial do dia 22, Bolsonaro disse que não aceitaria ser alvo de “impeachment” por causa da divulgação de uma “porcaria de exame” de Covid-19, e ressaltou que ele é quem “comanda as Forças Armadas” e as usaria se preciso “para evitar um golpe”.
A ver no que isso tudo vai dar.
Por último, mas não menos importante, na célebre reunião ministerial do dia 22, Bolsonaro disse que não aceitaria ser alvo de “impeachment” por causa da divulgação de uma “porcaria de exame” de Covid-19, e ressaltou que ele é quem “comanda as Forças Armadas” e as usaria se preciso “para evitar um golpe”.
A ver no que isso tudo vai dar.
Com Diogo Schelp, Josias de Souza e Merval
Pereira