sexta-feira, 10 de julho de 2020

DA PRAGA DA CASERNA AO CAPITÃO CAVERNA — QUINTA PARTE


Vimos que a monarquia foi sepultada pela proclamação da República, em 1889, e que esse foi o primeiro dos muitos golpes de Estado que ocorreram em nossa querida republiqueta de bananas. 

No período republicano — que já dura respeitáveis 130 anos —, 38 políticos foram alçados à Presidência via eleições diretas (por voto popular) ou indiretas (pelo Congresso Nacional), golpe de Estado ou linha sucessória. Oito deles — entre os quais Júlio Prestes, que nem chegou a assumir — foram, em algum momento de seus mandatos, defenestrados do poder. E Jair Messias Bolsonaro pode ser o próximo.

Entre o apagar das luzes imperiais, em 1889, e a posse de Prudente de Morais, em 1894, somente militares ocuparam o assento mais cobiçado dos palácio presidencial, daí esse período ser chamado de República da Espada

O Marechal Deodoro da Fonseca, a quem coube desfechar o golpe de misericórdia no regime monárquico e entrar para a história como o primeiro presidente do Brasil, governou interinamente por cerca de dois anos. Promulgada a Constituição de 1891, foi realizada uma eleição indireta, na qual o marechal derrotou seu adversário — o candidato civil Prudente de Morais — por 129 votos a 97. Sua gestão, marcada pelo autoritarismo, foi encerrada prematuramente por um levante da Marinha, conhecido como Revolta da Armada

Tão logo passou de vice a titular, o também marechal Floriano Peixoto demitiu todos os governadores que apoiaram seu antecessor (e que defendiam a realização de nova eleição, à luz do previsto no art. 42 da Constituição de 1891). Graças a sua postura ditatorial — parece que isso seria moda entre os mandatários tupiniquins — Floriano foi apelidado de “Marechal de Ferro”. Para se manter no poder, ele teve de debelar sucessivas rebeliões, como a Revolução Federalista e a Segunda Revolta da Armada

Em abril de 1892, diante de protestos de opositores e divulgação de manifestos na capital federal, Peixoto decretou estado de sítio, prendeu e desterrou desafetos para a Amazônia. Quando Rui Barbosa ingressou com habeas corpus no Supremo Tribunal Federal em favor dos detidos, Peixoto ameaçou os magistrados: "Se os juízes concederem habeas corpus aos políticos, eu não sei quem amanhã lhes dará o habeas corpus de que, por sua vez, necessitarão". O Supremo negou o habeas corpus por dez votos a um. 

Em novembro de 1894, muito a contragosto, Floriano Peixoto passou o bastão para o paulista Prudente de Morais — que obteve 90% dos votos na primeira eleição direta da nossa história. A exemplo do que faria o General Figueiredo daí a quase um século, o marechal se recusou a transmitir pessoalmente o cargo a seu sucessor.   

Observação: Figueiredo não compareceu à cerimônia de posse nem passou a faixa presidencial ao oligarca maranhense José Sarney, que ele considerava "traidor" e "ilegítimo" por ter deixado a Arena (partido que apoiava o governo durante a ditadura) para disputar a vice-presidência na chapa de oposição, encabeçada por Tancredo Neves. 

Prudente de Morais foi não só o primeiro presidente civil do Brasil, mas também o primeiro eleito pelo voto direto. Seu governo se estendeu de 1894 a 1898 e deu início à política do café com leite — assim chamada devido à aliança nas indicações para presidentes entre São Paulo e Minas Gerais. Dada a presença substantiva de militares ligados a seu antecessor, temia-se a volta dos fardados ao poder — possibilidade que ganhou força com a morte de Floriano, em junho de 1895: no enterro do ex-presidente, cerca de 30 mil pessoas seguiram o cortejo fúnebre gritando “Viva, Floriano! Morra, Prudente!”.

Problemas de saúde levaram Prudente a transferir o cargo ao vice Manuel Vitorino, soteropolitano e adepto ao florianismo, e reassumiu o posto em 4 de março de 1897 (a despeito dos esforços de Vitorino, que, de olho no cargo, conspirava contra o presidente). Mas o restante de seu governo foi marcado por turbulências e dificuldades — entre as quais uma tentativa de assassinato e a (sempre presente) ameaça de golpe militar. Em 1899, após decretar estado de sítio e promover intensa perseguição aos opositores, Prudente transferiu o cargo ao também paulista Campos Sales, que seria sucedido pelo conterrâneo Rodrigues Alves — mais um integrante das oligarquias cafeeiras —, que, por seu turno, seria sucedido pelo também paulista Afonso Pena.

Em junho de 1909, com a morte de Pena no exercício da presidência, coube a Nilo Peçanha concluir o mandato tampão e dar posse ao gaúcho Hermes da Fonseca, que era sobrinho de Deodoro e derrotara o soteropolitano Rui Barbosa. Na sequência, mediante um acordo costurado por paulistas e mineiros, assumiu o posto Venceslau Brás

Em 1918, o paulista Rodrigues Alves foi eleito presidente, mas a Dona Morte o impediu de assumir o posto pela segunda vez vez. Quem assumiu foi o mineiro Delfim Moreira, que governou até a eleição e posse do paraibano Epitácio Pessoa, em 1919. Pessoa ocupou a poltrona presidencial até 1922, quando então foi sucedido pelo mineiro Arthur Bernardes, que foi sucedido pelo carioca Washington Luiz, que foi o último presidente da chamada República Velha e cuja gestão será abordada de forma mais detalhada no próximo capítulo.