Após 31 anos no STF, Celso
de Mello vestirá o supremo pijama 18 dias antes de comemorar seu 75º
aniversário natalício, dando a Bolsonaro a oportunidade de fazer sua
primeira indicação para a Corte. E ele a fará usando a técnica da cenoura e vara.
Como só não veem as toupeiras igualmente incapazes de enxergar que seu endeusado "Mito" não é exatamente o obelisco da probidade, tornou-se uma questão de vida e morte para o dito-cujo (refiro-me ao mito de festim) empurrar para
dentro do Supremo um esbirro subserviente. E se por um lado faltam ao mandachuva respeito
à liturgia do cargo e competência para exercê-lo, por outro sobram
interessados em lamber-lhe as botas em troca da suprema toga.
Ainda que não seja o primeiro timoneiro da Nau dos Insensatos a priorizar as próprias conveniências em detrimento da neutralidade (e provavelmente não será o último), o indômito capitão cloroquina se destaca de seus predecessores ao pôr à prova a fidelidade dos pretendentes à toga antes da nomeação — detalhe para o qual nos chamou a atenção o impagável Josias de Souza, numa de suas recentes publicações.
Tal comportamento (refiro-me a Bolsonaro, não a Josias), apesar de um tanto inusitado, deve-se em grande
medida aos inquéritos que investigam possíveis improbidades cometidas pelo Messias,
por sua prole e pela suspeitíssima chusma que orbita seu clã como moscas o estrume.
Observação: Entre outros imbróglios cabeludos, merecem
menção o inquérito em que o Messias é acusado de aparelhar a PF, o foro
especial reivindicado pelo rebento Zero Um, os depoimentos de Zero
Dois e Zero Três, as aflições do amigo e gestor de rachadinhas Fabrício
Queiroz, os depósitos mal explicados que esse mesmo amigo e gestor de rachadinhas
e respectiva esposa efetuaram na conta bancária da primeira dama, e por aí
segue a mui suspeita procissão.
No mais, nada de novo no front. Em 2002, quando foi indicado
por FHC para o STF, Gilmar Mendes chefiava a AGU do
governo tucano. Em 2009, quando foi indicado por Lula, o asqueroso, para
ocupar a vaga aberta com a aposentadoria do ministro Menezes Direito, o
grande Dias Toffoli comandava a AGU do governo petralha. Em 2017,
quando foi indicado pelo vampiro do Jaburu para ocupar a cadeira deixada vaga
pelo mal
explicado acidente aéreo que limou do mundo dos vivos o ministro Teori
Zavascki, o dono da calva mais luzidia que abrilhanta nossa corte suprema corte
era Ministro da Justiça.
Para além de André Mendonça (ex-advogado-geral da
União, atual ministro da Justiça e “terrivelmente evangélico”)e de Jorge Oliveira
(assessor jurídico de Bolsonaro em seus tempos de deputado federal),
disputam a indicação do capitão para a cadeira do atual decano Augusto Aras,
atual o passador-de-pano-geral da República, João Otávio de Noronha
ministro do STJ e “caso de amor à primeira vista” de Bolsonaro,
nas palavras do próprio presidente, Willian Douglas, juiz federal e opção
preferida de Zero Um, Ives Gandra Filho, ministro do TST
ligado à Opus Dei, Benedito Gonçalves, ex-papiloscopista da PF, ex-delegado,
ex-juiz e desembargador do TRF-2ª desde 1998 (responsável pelo afastamento de Wilson
Witzel do cargo de governador fluminense em 28 de agosto), Maria
Elizabeth Rocha, ministra do STM, Luiz Felipe Salomão, ministro
do STJ e do TSE e, pasmem, Damares Alves, pastora e
ministra da Mulher, da Família e dos Direito Humanos.
Aras não se constrange em prestar vassalagem ao
presidente, como dão conta dois ofícios protocolados recentemente no STF.
Num deles o procurador se posicionou contrário ao acatamento de ação que
questiona o foro privilegiado concedido a Flávio Bolsonaro pelo TJ-RJ
no caso da rachadinha, e no outro, favorável ao pedido do presidente para depor
por escrito no inquérito em que é acusado de tramar o aparelhamento político da
PF.
Noronha também encantou Bolsonaro & Famiglia
ao transferir Fabrício Queiroz do ambiente inóspito de uma cela no
presídio carioca de Bangu 8 para o conforto da prisão domiciliar, além
de estender o benefício à foragida Márcia Aguiar, esposa do
ex-Gasparzinho — que, dizem as más línguas, flertava com a delação.
Na prática, diz Josias de Souza, trava-se uma
acirrada competição pela vaga de ministro do Supremo. Nada de novo sob o
Sol. A diferença é que a agora a disputa se desenvolve na frente das crianças. Mas
é bom lembrar que fidelidade prévia não assegura alinhamento futuro. Lula
indicou 8 togados e acabou na cadeia. No julgamento do mensalão, Joaquim
Barbosa e Ayres Britto portaram-se com rigor inaudito. Já a eterna
nefelibata da mandioca cobriu com a suprema toga os ombros de Edson Fachin,
Luís Roberto Barroso e Luiz Fux, e eles se notabilizaram pelo
apoio à Lava-jato — nos julgamentos sobre a prisão de condenados na
segunda instância, os três votaram invariavelmente a favor da tranca, inclusive
a de Lula.
Prevalece atualmente no Supremo, por 6 votos a 5, a
ala adepta da política de celas abertas. Afrouxou-se a regra sobre a prisão em segundo
instância quando aguardavam na fila por uma condenação políticos do quilate de Aécio
Neves e Michel Temer, ambos unha e carne com Gilmar Mendes. E
sonhava com a reconquista do meio-fio um personagem como Lula, que conta
com a gratidão imorredoura de Ricardo Lewandowski e de seu ex-esbirro Dias
Toffoli — ambos vestiram a suprema toga sobre a farda de militante petista.
Seria catastrófico se o futuro escolhido de Bolsonaro
se aliar à suprema banda dos garantista de ocasião, aumentando para sete o número
de togados laxantes. Mas novas mudanças ocorrerão em breve. Marco Aurélio,
que passará de vice-decano a titular com a saída de Celso de Mello, atinge
a idade de corte em julho de 2021, quando então Ricardo Lewandowski
assumirá o decanato. Em maio de 2023, ele transferirá a honraria para a
ministra Rosa Weber, que terá direito ao título durante apenas 5 meses.
E por aí segue a procissão, porque não há nada como o tempo para passar.
Marco Aurélio pode não ser (e não é) o ministro dos
sonhos de quem, como este que vos escreve, gostaria que mofassem na cadeia (na
impossibilidade de mandá-los para o paredão) todos os ladrões travestidos de
agentes públicos, sobretudo aqueles que vêm se aproveitando da Covid-19
para encher as burras (tanto as próprias quanto as de cúmplices e apaniguados)
com o suado dinheiro dos contribuintes que deveria ser destinado ao combate ao
vírus.
Quando por mais não seja, merece elogios o primo de Fernando
Collor por entender que “os magistrados não deveriam agradecer com a toga".
Aliás, ele próprio declarou-se impedido, por razões de consciência, de
participar de julgamentos que envolviam o ex-presidente impichado em 1992 e
hoje senador da República graças ou grande coração e cérebro de ameba do
eleitorado alagoano.
De um tempo a esta parte, honestidade, lisura e probidade tornaram-se
“virtudes”, conquanto devessem ser a regra geral, e não raríssimas (e por isso
honrosas) exceções. Parafraseando o próprio Marco Aurélio:
“São tempos estranhos, muito estranhos, geradores de
grande perplexidade nacional. E o Brasil, como nós estamos vendo, continua
sangrando”.