sexta-feira, 4 de setembro de 2020

BYE, BYE, WITZEL

 


Brasilha das Maravilhas vai bem, obrigado. Já o Brasil, nem tanto. Mas quem se importa? Não os ministros de Estado, certamente. Nem os deputados, senadores e outros servidores de alto coturno. O “deles” está garantido. E essa seleta confraria continua e continuará mamando nas tetas do Erário durante e depois da pandemia. Senão vejamos.

Nos moldes propostos por Bolsonaro, a reforma administrativa acaba com benefícios como licença-prêmio, aumentos retroativos, férias superiores a 30 dias por ano e adicional por tempo de serviço. Serão eliminadas ainda a aposentadoria compulsória como punição, o pagamento de parcelas indenizatórias sem previsão legal, adicional ou indenização por substituição não efetiva, redução de jornada sem contrapartida na remuneração (salvo em casos de saúde), progressão ou promoção baseada exclusivamente em tempo de serviço e incorporação ao salário de valores referentes ao exercício de cargos e funções.

O problema que isso só passará a valer para quem ingressar no serviço público depois que a proposta, se aprovada, entrar em vigor. Em outras palavras, o que menos quer o presidente que só pensa em se reeleger (deveria pensar em governar, mas enfim...) é se indispor com 12 milhões de servidores em ano eleitoral. E nós, trouxas, continuamos pagando essa conte e mais uma feira de despesas absurdas, como as  lagostas e vinhos premiados dos ministros do STF, as viagens de Toffoli, Maia e Alcolumbre nas asas da FAB (e a custas dos contribuintes), e por aí segue a procissão.

No seu afã populista eleitoreiro, Bolsonaro arrombou uma trava colocada por Guedes para conter a expansão de gastos com funcionalismo. Segundo a Folha, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional mudou um parecer que restringia recrutamentos até o final do ano que vem, passando a permitir novos concursos para preencher cargos abertos. A PF já anunciou concurso para contratar 2 mil agentes, e o "mito" deve autorizar a Polícia Rodoviária Federal a seguir o mesmo caminho.

Já os milhões de trabalhadores informais e assalariados que perderam o emprego devido à pandemia ou tiveram seus vencimentos reduzidos em até 75% para evitar a demissão, esses, sim, estão preocupados. De acordo com o IBGE, cerca de 45% dos 211,8 milhões de brasileiros estão nessa situação. E só lhes resta agradecer a “bondade” do governo federal, que prorrogou o coronavoucher até o final do ano, embora tenha cortado pela metade o valor do benefício.

Observação: O valor definido para as próximas parcelas — R$ 300 — é pouco para quem recebe, mas muito para quem paga, já que aumenta em quase R$ 100 bilhões o rombo nas contas públicas. E é bom lembrar que “orçamento de guerra de enfrentamento à pandemia” não passa de um eufemismo para “endividamento” — daí eu ter dito no post anterior que se Guedes jogar a toalha Bolsonaro se tornará a versão masculina da anta sacripanta que quase quebrou o país para se reeleger.

No Rio, o vice-governador Cláudio Castro comemorou o apoio do senador Flávio Bolsonaro para a renovação do Regime de Recuperação Fiscal do estado. “Diálogo! Todos pelo Rio!”, postou o político em sua conta no Twitter

Castro assumiu interinamente o lugar de Witzel, que foi afastado após ter sido apontado como líder de uma organização criminosa acusada de lotear secretarias do governo fluminense. Tanto o titular quanto o vice são filiados ao PSC, cujo presidente é o Pastor Everaldo, que está preso desde a última sexta-feira. Os três são alvo da operação Tris in Idem.   

O saudoso maestro Tom Jobim descrevia Cidade Maravilhosa "entre o mar e a montanha". Hoje, seria mais apropriado defini-la como espremida entre milícias e quadrilhas, e cercada de políticos desonestos por todos os lados políticos desonestos por todos os lados. Ganha um doce quem apontar algum dos inquilinos recentes do Palácio Laranjeiras que não passou um tempo em cana, que não esteja em cana ou que não tenha tudo para estar em breve desde que o semideus togado e pontífice da seita dos laxantes não meta o bedelho, naturalmente.

No última quarta-feira, a Corte Especial do STJ referendou a decisão do ministro Benedito Gonçalves. Assim, Witzel reassumirá o cargo se a Alerj não julgar seu impeachment no prazo de 180 dias — ou julgar e absolvê-lo das acusações. O fato de ele ter sido afastado por um despacho monocrático foi criticado, já que decisões dessa natureza deveriam ser tomadas pelo colegiado. Por outro lado, as evidências expostas e a grande operação da PF criaram ambiente favorável, sem mencionar que, além do apoio do Planalto, o ministro contava com maioria na Corte Especial.

As chances de o afastamento imposto pelo STJ ser anulado pelo Supremo são remotas. A defesa de Witzel já havia questionado a (até então) decisão monocrática do ministro Benedito Gonçalves — aspecto, inclusive, repudiado por alguns ministros no julgamento de quarta-feira, mesmo entre os que votaram pelo afastamento do governador —, mas Toffoli rejeitara o recurso, donde se pode inferir que são mínimas as chances de um novo apelo prosperar.

A decisão do STJ favoreceu o clã Bolsonaro, pois caberia Witzel escolher o substituto de Eduardo Gussem na procuradoria-geral de Justiça do Rio — as investigações sobre o célebre esquema de “rachadinhas” envolvendo Zero Um estão sob responsabilidade do MP-RJ. Mas essa “ajuda” pode ser serôdia, pois a coleta de provas foi encerrada e os dados já foram enviados a Gussem, a quem cabe apresentar a denúncia contra o filho do general da banda ou determinar o arquivamento do inquérito.

Paralelamente, a ministra Rosa Weber rechaçou a tese de “mandatos cruzados” (situação em que o político emenda um mandato no outro) defendida pela AGU em favor de Flávio Bolsonaro. Em decisão assinada no mês passado, mas tornada pública dois dias atrás, a ministra determinou a abertura de inquérito para apurar indícios de utilização irregular da cota para exercício de atividade parlamentar por parte de dez congressistas, entre os quais o senador emedebista Márcio Bittar, que, no entendimento da magistrada, deve ser remetido para a primeira instância porque os fatos não envolvem seu mandato no Senado, mas sua atividade pregressa na Câmara.

Rosa pontuou que a 1ª Turma já foi chamada a decidir sobre o tema, “tendo ratificado a compreensão de que o foro por prerrogativa de função no Supremo Tribunal Federal não se perpetua nas hipóteses em que os fatos criminosos imputados estejam relacionados com um determinado cargo e o imputado posteriormente passa a ocupar cargo diverso”. No caso de Flávio Bolsonaro, os fatos apurados não se enquadram na nova regra do foro privilegiado, porque os episódios sob investigação dizem respeito a suspeitas envolvendo não o atual cargo, mas o de deputado estadual. Assim como Bittar, ele foi “promovido” a um cargo de maior envergadura.

Resumo da ópera: Witzel e Bolsonaro rezavam pela mesma cartilha quando candidatos e foram meio que aliados até o governador revelar numa entrevista que poderia disputar a Presidência da República em 2022 — a exemplo do Demo, o Messias que não miracula odeia concorrência e não admite que subalternos ofusquem sua popularidade. Agora, o risco de perder o cargo e a denúncia feita pela MP contra Witzel e sua mulher certamente mudarão a escala de prioridades do governador fluminense.

Por último, mas não menos importante: Na segunda-feira, após a publicação de reportagens que denunciaram a suposta prática de crimes, por parte do prefeito, pela criação do grupo "Guardiões de Crivella", o presidente da Casa, Jorge Felippe recebeu dois pedidos de impeachment contra o prefeito carioca Marcelo Crivella (que é bispo licenciado da Universal e sobrinho do todo-poderoso Edir Macedo). O pedido inicial foi feito pela bancada do PSOL e ganhou anexo de outra solicitação feita pelo vereador Atila Nunes 

As discussões, iniciadas na noite de ontem duraram quase 4 horas, numa sessão híbrida (presencial e remota), em meio à pandemia de coronavírus. Houve momentos inusitados, como um vereador usando uma camisa do Flamengo, uma vereadora participando remotamente da sessão em um carro e outra comendo pipoca no plenário da Câmara. Ao final, o irmão gêmeo do Alfred E. Neuman escapou pela segunda vez de um impeachment (por 25 votos a 24, os vereadores rejeitaram o pedido de abertura do processo

Muitos sofrem por imposição, mas alguns sofrem por opção. O Rio virou um estado falido por culpa do dedo podre do eleitorado: quem vota em ladrão e incompetente travestido de político merece o governo que tem perde o direito que reclamar.