A reboque das eleições diretas, trazidas de volta pela redemocratização da nossa republiqueta, veio o anacrônico, oneroso e ominoso “horário eleitoral gratuito”.
Vereadores são eleitos com base no sistema proporcional, que não prevê votação em dois turnos. No caso dos prefeitos. é usado o sistema majoritário, no qual vence o candidato mais votado. Mas aqui cabe uma ressalva: nos municípios com mais de 200 mil eleitores registrados, serão considerados eleitos os candidatos a prefeito que obtiverem mais da metade dos votos válidos (ou seja, descontados os votos brancos e nulos). Se nenhum dos candidatos atingir a meta, os dois mais votados disputarão o segundo turno (que, neste ano, acontecerá no dia 29 do mês que vem), e a diarreia da propaganda no rádio e na TV recomeçará cinco dias após o primeiro escrutínio e perdurará até a antevéspera do segundo.
Desde o último pleito municipal que a propaganda eleitoral
em bloco foi limitada aos candidatos a prefeito e veiculada de segunda a sábado
— no rádio, das 7h às 7h10 e das 12h às 12h10; na TV, das 13h às 13h10 e das
20h30 às 20h40. Além disso, 70 minutos diários são reservados para inserções de
30 e 60 segundos durante a programação (inclusive aos domingos), sendo 60% do tempo
(42 minutos) destinados aos candidatos a prefeito e 40% (28 minutos) aos
candidatos a vereador. As inserções podem ocorrer das 5h à 0h e a divisão do
tempo é calculada com
base na representação da sigla no Congresso.
Observação: Passou a valer este ano a cláusula de
barreira instituída pelo Congresso em 2017, que exclui do horário eleitoral os
candidatos dos partidos que, na eleição geral anterior, não obtiveram um mínimo
de votos para a Câmara dos Deputados.
Apesar do nome, não há nada de gratuito nessa aberração. A
não ser, naturalmente, para os partidos e candidatos. Portanto, toda vez que
seu programa de rádio ou de TV for interrompido pela conversa mole dessa caterva, comemore: quem está pagando a conta é você.
O rádio e a televisão são concessões públicas que,
segundo a Constituição, a União pode explorar diretamente ou mediante outorga.
A emissora que detém uma concessão, seja de rádio, seja de televisão,
está autorizada a explorá-lo por tempo determinado — 10 anos no caso do rádio e
15 no caso da TV. Em tese, ao receber a concessão o empresário estaria obrigado
a arcar com o ônus da propaganda eleitoral, mas nossos políticos embutiram na
Carta de 1988 a compensação fiscal pela cedência do “horário gratuito”.
Assim, as emissoras calculam quanto faturariam se vendessem o tempo cedido à
propaganda eleitoral a anunciantes e agências de publicidade e descontam o valor do imposto a pagar no acerto de contas com o Leão (IRPJ).
A propaganda eleitoral obrigatória foi implementada
pela Lei
nº 9.504/1997, artigo 47, caput, e artigo 51. Naquela
época, contavam-se nos dedos quantos usuários domésticos de PC tinham acesso à
Internet, e a propaganda política via rádio e televisão fazia algum sentido.
Hoje, insistir nesse anacronismo incomodante é a quintessência da
falta de absolutamente.
De acordo com levantamento, pela FGV-SP, há
atualmente no Brasil 424 milhões de dispositivos móveis (notebooks, smartphones
e tablets). Segundo a mais recente pesquisa realizada pelo IBGE, o celular
é atualmente o
principal meio de acesso à rede mundial para os brasileiros e o meio
exclusivo de comunicação e acesso à Internet para 78% daqueles com renda
familiar de até 1 salário mínimo. Incluídas no cálculo as classes D e E, a
porcentagem sobe para 85%; isolado somente o uso da Internet, os números são
ainda mais impressionantes: 97,9% acessam a rede através do aparelho nas áreas
rurais, contra 98,1% nas cidades.
Torça para seu candidato a
prefeito liquidar a fatura no próximo dia 15. Ou não haverá cotonete que baste.