sábado, 3 de outubro de 2020

VAMOS DE BEM A MELHOR...


Longe de mim querer abusar da paciência do leitor relembrando (mais uma vez) a fatídica conjunção de fatores levou esse dublê de mau militar e parlamentar medíocre a obter quase 58 milhões de votos, mas não posso me furtar a comentar o que o dito-cujo disse, mais de uma vez e com todas as letras: “não nasci para ser presidente, mas sim para ser militar.” 

Bolsonaro parafraseava o último general-presidente da ditadura militar, naturalmente, que certa vez proferiu a seguinte pérola: “estou fazendo uma força desgraçada para ser político, mas não sei se me sairei bem, pois gosto mesmo é de clarim e de quartel". Mas até aí, nada de mais, pois “plagiar é, implicitamente, admirar”, como ensinou o intelectual lusitano Júlio Dantas. A pergunta que não quer calar é: se não nasceu para ser presidente, então por que diabos Bolsonaro fez da reeleição seu único projeto de governo?

Prometo que, se eleito, vou trabalhar noite e dia, durante os quatro anos do meu mandato… para ser reeleito”, teria sido a promessa mais sincera e verdadeira do então candidato, como bem destacou o ex-delegado federal Jorge Pontes em artigo publicado recentemente no site de Veja

Lula, relembra o policial, justificava seus tropeços culpando a herança maldita deixada por FHC. Já Bolsonaro, eleito com juras de grandes mudanças e discursos anti-establishment, enfiou em local incerto e não sabido suas bandeiras de campanha, inclusive a de propor o fim do instituto da reeleição, e vem concentrando todos os seus esforços em conseguir um segundo mandato em 2022.

A exumação da CPMF, independentemente do nome com que venha a ser recriada, integra o acervo do museu de grandes novidades em que se transformaram as arrojadas promessas para a área do Posto Ipiranga. O velho provérbio latino “parturiunt montes, nascetur ridiculus muscalça como uma luva no superministro que, em 2019, quando ainda não havia coronavírus para culpar por suas mazelas, prometeu um pibão e entregou um pibinho. A exemplo do morubixaba, o pajé da economia é muito peido e pouca bosta.

No jargão jornalístico, a expressão balão de ensaio remete a informações vazadas com o propósito de verificar de antemão possíveis efeitos de uma determinada medida. Trata-se de prática é recorrente na administração pública e da qual Bolsonaro é adepto, seja para mandar “heads up” a subordinados, seja para avaliar a reação de seus apoiadores de raiz a um determinado projeto.

Paulo Guedes também é fã de balões de ensaio, mas não foi o caso de sua fala sobre usar precatórios para financiar o projeto populista-eleitoreiro do chefe. A coisa era pra valer, e só não foi adiante devido à reação do mercado — reação essa que, convenhamos, alguém com a experiência do ministro deveria ter previsto. A menos que ele venha emburrecendo por simbiose, devido à convivência com... bom, deixa pra lá. Fato é que o sucesso tem muitos pais, mas o fracasso é espúrio. O Posto Ipiranga tentou dar a impressão de que tudo não passava de "um estudo", mas três coisas nesta vida são absolutamente irreversíveis: a flecha lançada, a palavra pronunciada e a oportunidade perdida.

A iniciativa de criar um novo imposto antes das urgentes e imprescindíveis reformas tributária e administrativa sempre fedeu a populismo eleitoreiro. Ainda nascituro, o tributo já foi carimbado para projetos sociais, destinado a gerar caixa para gastos com auxílios e bolsas disso e daquilo — programas pseudo-assistenciais ao estilo do lulopetismo e à semelhança do Bolsa Família, tudo com o propósito de manter em alta a popularidade conquistada com o corona voucher, notadamente nas regiões nordeste e norte. Para quem até pouco tempo atrás se referia aos nordestinos como “paraíbas”, Bolsonaro sofreu uma metamorfose impressionante. Mas sua "falta de absolutamente" é assustadora. 

Mudando de um ponto a outro, tudo indica que o STF terá de esperar a aposentadoria do segundo Mello para para ter entre seus membros um togado “terrivelmente evangélico”, como prometeu diversas vezes o Messias que não miracula. 

Em recente incursão pelo Olimpo — morada do semideus togado que Augusto Nunes (ou teria sido José Nêumanne?) alcunhou jocosamente de Maritaca de Diamantino, e que já desfrutava da excelente companhia do Maquiavel de Marília segundo Nêumanne (nesse caso eu tenho 100% de certeza) —, Bolsonaro arrastou consigo o desembargador piauiense Kássio Nunes Marques, seu indicado para uma vaga que sequer existe. 

O ministro Celso de Mello se aposenta no dia 13. Mesmo considerando o final de semana e o feriado do próximo dia 12, o decano continuará ocupando a cadeira que é sua por direito até a próxima sexta-feira, 9. Em outras palavras, o defunto nem esfriou e já o estão despindo e disputando suas vestes.

O futuro togado segundo Bolsonaro é católico, mas não necessariamente alinhado com pautas conservadoras nos costumes. Só que tem Q.I. (de "quem indicou"). Ele conta com o apoio do conterrâneo Ciro Nogueira, deputado de grosso calibre e alto quilate, dono do PP e ex-aliado do PSDB, de FHC, do PT de Lula e Dilma e do MDB do vampiro do Jaburu, além de investigado na Lava-Jato

Ao escolher Marques para o lugar de Celso de Mello, o general da banda consolidará a 2.ª Turma como túmulo da Lava-Jato. Isso porque Toffoli, ao transferir para Luiz Fux o cetro e a coroa dos togados, passou a ocupara a poltrona que o colega ocupava na 1.ª Turma antes de suceder-lhe na presidência. Já se pensava e urdir uma maracutaia para levar o Maquiavel de Marília à 2.ª turma, mas a manobra será desnecessária se o lugar do decano for ocupado pelo futuro recém-togado.

Marques formará com Mendes e Lewandowski o triunvirato dito "garantista" na Segundona, ressalta Josias de Souza. E sem a perspectiva de encostar seus votos no balão de oxigênio que enxergam no decano, Fachin e Cármen Lúcia passariam a viver em estado crônico de minoria.

O "garantismo" atribuído a Gilmar, Lewandowski e, agora, também ao futuro novato, comporta dois tipos de interpretação: num, como garantia de que os réus serão tratados nos limites do devido processo legal; noutro, como eufemismo para complacência com malfeitores amigos. 

Encontra-se na fila da 2.ª Turma, por exemplo, o julgamento do pedido de suspeição que a defesa de Lula formulou contra o ex-juiz Sergio Moro, com o propósito de anular a condenação de seu cliente no caso do tríplex.

Fachin e Cármen já votaram contra a anulação da sentença do caso do tríplex. Gilmar e Lewandowski devem votar a favor. Nesse cenário, Kássio representaria o derradeiro prego no caixão.