segunda-feira, 8 de fevereiro de 2021

DE VOLTA ÀS BENDITAS SENHAS

ENQUANTO A VERDADE CALÇA OS SAPATOS, A MENTIRA DÁ A VOLTA AO MUNDO.

Segundo o Gênesis (do grego Γένεσις, que significa "origem", "criação", "início"), “no princípio era o Caos, e do Caos Deus criou o Céu e a Terra (...)

Em apenas 6 dias o Criador transformou o Caos em ordem. Criou a luz e separou-a em duas (uma, grande, para governar o dia, e outra, menor, para governar a noite). Criou as águas e separou-as em duas (e juntou as da porção inferior num só lugar, para que ali emergisse parte seca). Cobriu a terra de plantas, povoou-a com todo tipo de seres vivos e no sexto dia, disse o Senhor das Esferas: “Agora vamos fazer os seres humanos, que serão como nós, que se parecerão conosco. Eles terão poder sobre os peixes, sobre as aves, sobre os animais domésticos e selvagens e sobre os animais que se arrastam pelo chão”. E após concluir Sua obra e ver que tudo era bom (?!), abençoou e santificou o sétimo dia, quando então descansou.

ObservaçãoA primeira versão escrita do Antigo Testamento remonta ao século 10 a.C. Desde então, seus relatos foram copiados, editados e reescritos um sem-número de vezes, até que alguém teve a ideia de juntar a essa compilação o Novo Testamento. E assim formou-se a síntese da mitologia cristã, composta por 66 livros, sendo 39 do A.T. e 27 do N.T., que ficou conhecida mundialmente como Bíblia(do grego "biblion", que significa "livro", "rolo").

Do Gênesis bíblico à teoria do Big Bang, diversos povos construíram versões próprias da origem do universo. Na maioria delas, o Caos seria uma matéria sem forma definida. Mas nenhuma trouxe a lume o detalhe que ora lhes revelo: Antes do Caos, já havia políticos, pois certamente foram eles que criaram o Caos!

Com os políticos, surgiu a vigarice. Em Juízes 12: 1-15, o Antigo Testamento registra que a palavra “xibolete” (do hebraico שבולת, que significa “espiga”) funcionava como “senha linguística” para identificar um grupo de indivíduos. Séculos depois, durante o massacre das Vésperas Sicilianas (1282 d.C.), os franceses eram reconhecidos pela forma como pronunciavam “cìciri” (grão de bico, no dialeto siciliano). Assim, engana-se quem imagina que as senhas surgiram com a popularização da Internet, embora a popularização da Internet as tenha popularizado e multiplicado.

Em 1961, para evitar que alguns estudantes monopolizassem o computador, o MIT desenvolveu o Compatible Time-Sharing System, mas os nerds logo descobriram como burlar a exigência da senha e se livrar da incomodativa limitação de tempo. No âmbito das transações financeiras, a autenticação por senha foi implementada no Brasil no início dos anos 1980, com o advento dos caixas eletrônicos ― a primeira máquina foi instalada pelo Itaú no município paulista de Campinas, em 1983. O cartão de crédito surgiu muito antes, inicialmente como alternativa para clientes de redes de hotéis e petroleiras comprarem a crédito nos próprios estabelecimentos (a primeira versão para uso no comércio em geral foi o Diners Club Card, que desembarcou no Brasil em meados dos anos 1950).

No início dos anos 1980, os fraudadores recuperavam os dados do papel-carbono dos formulários usados nas maquininhas manuais para lesar as operadoras, que contra-atacaram com mídias providas de tarjas magnéticas. Quando os vigaristas responderam com os “chupa-cabras”, a tarja deu lagar ao microchip e a autenticação por assinatura foi substituída pela senha. E o resto é história recente. 

Quando os PCs se tornaram populares (embora inicialmente não passassem de caríssimos substitutos das máquinas de escreve e de calcular e do console de videogame), era comum a mesma máquina ser compartilhada por todos os membros da família ― uma solução economicamente interessante, mas desastrosa do ponto de vista da privacidade. Sensível ao problema, a Microsoft tornou o Windows “multiusuário” e implementou uma política de contas e senhas de acesso. Com isso, cada membro da família se logava no sistema e meio que “tinha um Windows só para ele”. 

Embora essa solução não pusesse fim à disputa pelo uso da máquina, ao impedia o acesso a pastas e arquivos alheios, o que já não era pouco. Mas os usuários do Windows ME — edição lançada pela Microsoft a toque de caixa para aproveitar o apelo mercadológico da “virada do milênio” — logo descobriram que bastava pressionar a tecla Esc para "pular" a tela de logon (essa falha foi sanada no XP, que foi desenvolvido a partir do kernel do WinNT).

Reminiscências à parte, interessa dizer (de novo) que segurança absoluta no âmbito digital é conversa para boi dormir. E da feita que comodidade e segurança são como água e azeite, senhas difíceis de quebrar costumam ser virtualmente impossíveis de memorizar. E como usamos dezenas delas no dia a dia, tendemos a padronizar os acessos, ou seja, recorrer à mesma password para desbloquear a tela do smartphone, fazer logon no Windows, acessar redes sociais e contas de email, fazer compras online, transações financeiras via netbanking e por aí vai.

É possível criar senhas complexas e, ao mesmo tempo, fáceis de memorizar, como veremos na próxima postagem.