terça-feira, 16 de fevereiro de 2021

QUE NÃO SEJA IMORTAL, MAS QUE SEJA INFINITO...

 


A cerimônia de casamento surgiu na Roma antiga, onde se deram as primeiras uniões de direito e, mais adiante, a mulher conquistou a “liberdade” de contrair matrimônio por livre e espontânea vontade.

A despeito de os “ensinamentos” sobre o relacionamento entre Igreja e Estado  remontarem ao século XVII, o Brasil só viria a adotá-los cerca de duzentos anos depois. Durante séculos, a Igreja foi um “poder paralelo” e não raro se sobrepunha à autoridade do Estado (haja vista o Tratado de Tordesilhas).

No Brasil, o casamento civil veio de carona com a República. A Constituição Imperial de 1824 manteve o poder da Igreja sobre o casamento, mas a Constituição Republicana de 1891 reconheceu validade somente ao ato civil. Em 1893, o deputado Érico Marinho apresentou no Parlamento a primeira proposição divorcista. Em 1896 e 1899, renovou-se a tentativa na Câmara e no Senado. Em 1901, o jurista Clóvis Beviláqua apresentou seu projeto de Código Civil, que foi duramente criticado — e aprovado somente em 1916, depois de sofrer um sem-número de alterações, mas não regulamentou o casamento religioso com efeitos civis (matéria tratada posteriormente pela Lei 6.015/73).

A indissolubilidade do casamento tornou-se preceito constitucional na Constituição de 1934, e nem as Cartas Magnas de 1937, 1946 e 1967 nem a emenda de 1969 inovaram sobre o assunto. Durante a ditadura, a emenda à Constituição de 1969 passou a permitir a dissolução do vínculo matrimonial após cinco anos de desquite ou sete de separação de fato. O divórcio foi instituído oficialmente com a emenda constitucional nº 9, de 28 de junho de 1977, regulamentada pela lei 6515 de 26 de dezembro do mesmo ano.

A inovação permitia extinguir por inteiro os vínculos de um casamento e autorizava que a pessoa contraísse novo matrimônio com outra pessoa, mas apenas uma única vez. A Constituição Cidadã, promulgada em 1988, garantiu aos nubentes o direito a repetir a burrada e desfazê-la quantas vezes quisessem, mas o artigo 226 estabelecia que o casamento civil só poderia ser dissolvido pelo divórcio após um ano de separação judicial ou mais de dois de comprovada separação de fato.

Observação: Até 1977, quem se casava permanecia com um vínculo jurídico para o resto da vida. Caso a convivência fosse insuportável, poderia ser pedido o “desquite”, que suspendia os deveres conjugais e punha fim à sociedade conjugal. Mas pessoas divorciadas não podiam recomeçar suas vidas ao lado de outra pessoa cercados da proteção jurídica do casamento (vale lembrar que naquela época não existiam leis que protegiam a União Estável e resguardavam os direitos daqueles que viviam juntos informalmente).

A Lei 7.841/89 eliminou a restrição à possibilidade de divórcios sucessivos. Em 2007, a Lei 11.441 estabeleceu que a separação consensual poderia ser requerida por via administrativa, bastando às partes comparecerem a um cartório de notas, assistidas por um advogado, e apresentarem o pedido (desde que não houvesse filhos menores de idade ou incapazes). Aprovada em 2010, a PEC do Divórcio alterou o § 6º do art. 226 da Constituição Cidadã, suprimindo o requisito de prévia separação judicial por mais de 1 ano ou de comprovada separação de fato por mais de 2 anos.

Concluída esta (não tão) breve contextualização, passemos ao que interessa: Deus, em sai imensa sabedoria, criou o amor e a fé, e o diabo, invejoso, o casamento e as religiões. Afinal, se casamento fosse bom, não precisava de testemunhas. Além disso, já foi comprovado cientificamente que o casamento é a principal causa do divórcio. Com a pandemia, então... Vejamos o que diz Walcyr Carrasco a esse respeito.

Um casamento resiste à vida confinada? Hábitos mudaram, o jeito de trabalhar também. Para boa parte das empresas, o home office é mais lucrativo, pois não se gasta com espaço, instalações, cafezinho… As pessoas até trabalham mais!

Ainda que as praias continuem cheias, bares e restaurantes, lotados (e hospitais idem) e festinhas clandestinas comendo solta, a atividade social em si recrudesceu, e os casais se viram obrigados a tomar café da manhã, almoçar e jantar juntos... enfim, a convier. E o fato é que muitos casamentos duradouros só se mantinham porque marido e mulher mal se viam.

Um vizinho, com trinta anos de casado, resumiu: “Tenho uma inimiga dentro de casa. E ela cresce!”. Talvez ele e ela nem percebessem pequenos defeitos um do outro, como pelinhos no nariz. Depois de décadas, que importância tem? Só se viam após uma longa e exaustiva jornada de trabalho. Havia viagens profissionais. Amantes.

A pandemia dificultou a traição. Se ninguém sai de casa sem motivo, como fazer? Dizer que vai às compras? E na volta, ela pergunta: “Amor, tomou banho no supermercado?”. Não, não… Mesmo aquele flerte casual, numa saída… rola com máscara?

Quando a convivência é maior, tudo pode crescer. Há mulheres que até desejam assassinar os maridos que não levantam a tampa do vaso sanitário antes de urinar. Os próprios pais — que, em sua maioria, ainda jogam a educação dos filhos para a mulher — passam a conviver com choros, gritos, teimas… e a rebelião contra aulas on-line. Justo no horário de trabalho! Alguns pensam em trancar as crianças nos armários, mas não confessam.

Quando alguém trabalha em casa, as pessoas têm dificuldade em aceitar que é realmente trabalho. Interrompem, puxam conversa… pedem alguma coisa. O celular é um risco constante, um dia um deles o esquece à vista e o outro descobre uma conversa com um antigo relacionamento. Ou pior, um novo!

Os dois descuidam da aparência. Ele esquece de fazer a barba, ela deixa de fazer as unhas dos pés, depois as das mãos. Os dois engordam. O botão da camisa que estoura na barriga, os novos pés de galinha em torno do olho, tudo conta!

Casais veem filmes pornô para reacender a chama, chegam a usar artifícios — como amarrar e vendar —, partem até para um sexo mais selvagem (se a barriga não atrapalhar). Mas, depois, reclamam: “Ficou marca da mordida”.

Nem todo lar pode se transformar em cenário de filme pornô. Há riscos. No meio do sexo arrasador, o filhinho bate à porta: “Mamãe, você tá gritando? Aí é preciso parar tudo e voltar à formula da família margarina “Mamãe teve um pesadelo. Com um urso.”

Tudo fica tão difícil que alguns casais não se suportam mais e se separam. Ou pensam em romper todo o tempo, só aguardam a libertação que virá com a vacina. Mas… há os que resistem, descobrem novas formas de se relacionar. E ficam mais apegados.

A boa (ou a má) notícia é: se seu casamento sobreviveu à Covid, então você não se separa nunca mais.