domingo, 18 de abril de 2021

BOLSOLULA OU LULONARO?


Indivíduos como Lula e Bolsonaro são extremamente carismáticos, talvez porque seus sectários sejam passionais a ponto de se tornar irracionais (para não dizer que têm merda onde deveriam ter massa cinzenta). Mas o motivo é de somenos. O que mais preocupa é a possibilidade — cada vez mais provável, infelizmente — de vivenciarmos em 2022 um repeteco de 2018, só que com o sinal trocado. Em outras palavras: a menos que uma terceira via se consolide, seremos obrigados a exumar e ressuscitar o lulopetismo corrupto para impedir que o bolsonarismo boçal — que deveríamos ter exorcizado quando Bolsonaro demitiu Mandetta — siga empilhando os cadáveres produzidos pela Covid por mais quatro longos anos.

Observação: Os anais do Planalto registram que o governo Bolsonaro subiu no telhado em meados de 2019, devido à rejeição dos setores político e empresarial — e até de militares — ao chefe do Executivo, que só não foi penabundado graças a um pacto costurado pelos então presidentes da Câmara, do Senado e do STF. Em entrevista à revista Veja, o ministro Dias Toffoli relatou que empresários do setor industrial, incomodados com a paralisia da pauta econômica, discutiam a possibilidade de um impeachment de Bolsonaro, e que generais próximos a Bolsonaro chegaram a consultar um ministro do Supremo para saber se, na hipótese de uma convulsão, teriam autonomia para usar os soldados independentemente de autorização presidencial.  

Para quem já não se lembra, o “escândalo do mensalão” eclodiu em 2005 a partir da divulgação de um vídeo onde se via Maurício Marinho, então chefe do Departamento de Contratação e Administração de Material dos Correios, negociando propina com empresas interessadas em participar de licitações do governo. O processo foi instaurado em 2006 e o julgamento, que teve início em agosto de 2012 e resultou na condenação de 24 dos 40 réus, só terminou um ano e meio e 69 sessões depois, com a apreciação dos embargos infringentes (últimos recursos possíveis aos condenados).

Lula, que foi o maior beneficiário do esquema considerado à época o maior escândalo de corrupção desta banânia, passou a largo da história (ou foi a história que passou ao largo dele) até o Ministério Público acusá-lo de ser o comandante máximo do Petrolão). Nesse entretempo, reelegeu-se com 61% dos votos válidos e, honrando o epíteto de “encantador de burros”, fez eleger um “poste” para manter a poltrona presidencial aquecida até 2014, quando ele poderia voltar a ocupá-la. Lula ainda não sabia, mas estava cometendo o maior erro estratégico de sua carreira política — o viria a repeti-lo em 2014, quando então as consequências seriam ainda mais nefastas.

A eleição presidencial de 2018 foi na verdade um plebiscito que exorcizou a seita do inferno, mas com consequências trágicas, pois a emenda saiu pior que o soneto. “Nunca antes na história deste país” o Palácio do Planalto teve um inquilino tão torpe quanto o atual. Se Deus fosse mesmo brasileiro, haveria justiça nesta terra; se houvesse mesmo justiça nesta terra, o picareta dos picaretas estaria cumprindo pena na Papuda, em Presidente Bernardes ou na ponte que o partiu. E se tripulação desta nau de insensatos tivesse um pingo de vergonha na cara, há muito que teria se amotinado e posto a ferros o capitão que uma ironia do destino colocou na cabine de comando.   

Sempre houve, há e haverá “velhinhas de Taubaté” que se encantam com as falácias de populistas demagogos. É o caso da récua de sectários do sumo pontífice da seita do inferno, que acredita piamente na versão de Lula sobre o STF ter reconhecido sua inocência, embora a decisão de Fachin, ora chancelada em plenário por 8 votos a 3, simplesmente atestou a incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba para para julgar os crimes do ex-presidiário. Ou, na outra ponta do espectro político ideológico, da capela de miquinhos descerebrados que veem Bolsonaro como um “mito” e bebem suas palavras mentirosas, lambem os beiços e estalam a língua como tivesse sorvido o néctar dos deuses.

Se o pleito de 2022 for mesmo um repeteco de 2018, isto é, se Bolsonaro e Lula disputarem o segundo turno, o resultado será catastrófico, pouco importando quem restar vitorioso. E por mais surreal que possa parecer, as (nem sempre confiáveis, mas enfim...) pesquisas de intenção de voto indicam que os extremistas extremados dividem 60% dos votos válidos. A boa notícia é que 40% dos eleitores não caíram na conversa de nenhum dos dois. A má notícia é que ainda  apareceu um candidato de centro (não necessariamente do “centrão”) capaz de lhes fazer frente.  o humorista Danilo Gentili.

De acordo com um texto que Mário Sabino publicou no site O Antagonista, está em curso no Brasil o golpe do neolulismo. O neolulismo é embrulho novo para coisa comprovadamente testada, reprovada e condenada, e quer fazer você acreditar, antes de mais nada, que Lula nunca foi chefe de uma organização criminosa e que as sentenças das condenações por corrupção e lavagem de dinheiro são fruto de conspiração dos procuradores e do ex-juiz da Lava-Jato. Para tanto, conta com o auxílio de ministros do STF e, na linha auxiliar, de grandes setores da imprensa, incluindo profissionais que antes apontavam Lula e o PT como os maiores responsáveis pelas roubalheiras perpetradas no mensalão e no petrolão.

O neolulismo quer fazer você crer que Lula é um democrata convicto, assim como o PT.  Que Lula jamais tentou amordaçar a imprensa independente e controlar o Judiciário, Que nunca intimidou e criminalizou jornalistas incômodos, criou blogs sujos e boicotou veículos de imprensa que ousaram escancarar as patifarias do comandante petista e o seu partido. O neolulismo também quer apagar da história o fato de ter patrocinado uma das ditaduras mais cruentas da América Latina — a chavista na Venezuela. Para atingir o objetivo, o neolulismo conta principalmente com velhos e novos colunistas.

O neolulismo quer fazer você acreditar que os anos de prosperidade e assistencialismo eleitoreiro dos governos Lula não tiveram um preço salgado. Que a política econômica baseada em crédito farto, graças à bonança mundial, não promoveu o endividamento da população mais pobre (a “nova classe C”) e não privilegiou empresários com empréstimos a juros subsidiados que ajudaram a financiar campanhas políticas, em fraude à democracia. Que não causou déficits crescentes nas contas do governo e que isso não levou à maior fraude fiscal já cometida no país, até o orçamento 2021 de Jair Bolsonaro: as pedaladas de Dilma Rousseff.

Para tentar cancelar os fatos, Lula e o PT contam com os economistas de sempre, outros recém-chegados ao neokeynesianismo e os empresários habituais. Esses empresários sonham em faturar com a irresponsabilidade fiscal em benefício próprio, de maneira idêntica à que ocorria quando os petistas estavam no poder. Agregaram-se a eles empresários novos, antes críticos dos maus modos econômicos petistas. Tais neolulistas do neolulismo acham que podem catequizar Lula e o PT para as boas práticas econômicas. É uma das ilusões causadas pelo neolulismo.

O neolulismo também tenta se vender como a única alternativa ao bolsonarismo, assim como o bolsonarismo conseguiu vender-se como solitária opção ao velho lulismo, em 2018. Para tanto, espera no raquitismo de outros candidatos de oposição em 2022, da mesma forma que ocorreu com Bolsonaro em 2018. Trata-se de apostar na falta de uma candidatura única e viável dos outros oposicionistas, o que inclui trabalhar ativamente para destruir no berço qualquer tentativa nesse sentido. Além dos seus sentinelas na imprensa, o neolulismo tem a seu favor para a realização dessa tarefa os sargentos dos blogs sujos, os soldados da militância virtual — e a ajuda de integrantes leais do Ministério Público.

O neolulismo, como dito, quer ser o polo democrático em 2022, por mais que lhe falte reputação democrática. No entanto, ele não passa de um embrulho novo para coisa comprovadamente testada, reprovada e condenada. Que Lula possa se apresentar como a melhor coisa que o nosso sistema político já produziu, em 132 anos de República, é só mais uma prova da indigência desse mesmo sistema no qual Bolsonaro é o maior eleitor do que lhe parece antípoda.

Durma-se com um barulho desses.