DESCARTES FICARIA SURPRESO EM SABER QUANTAS PESSOAS QUE NÃO PENSAM TAMBÉM EXISTEM.
Termina amanhã (15) o prazo para usuários do WhatsApp aceitarem
as mudanças nos termos de serviço e na política de privacidade da plataforma. Ou
terminaria, melhor dizendo, porque a Secretaria Nacional do Consumidor, (Senacon)
a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD),
o Ministério Público Federal (MPF) e o Conselho Administrativo de Defesa
Econômica (Cade) recomendaram o adiamento (mais um, na verdade) da nova
política de privacidade da plataforma de mensagens. No documento
produzido em conjunto, essas instituições pedem ao WhatsApp que adie a
data de vigência de sua nova política enquanto não forem adotadas as
recomendações sugeridas após as análises dos órgãos reguladores.
Em tese, as
mudanças afetam a privacidade dos usuários por permitir que os dados
pessoais coletados no uso do app sejam compartilhados com outras mídias sociais
do mesmo grupo, como o Facebook. O aceite dos termos é obrigatório,
ou seja, quem
não concordar com esse compartilhamento terá a conta bloqueada e só
poderá reativá-la se concordar com os termos propostos.
Embora o WhatsApp afirme que as novidades da
política de privacidade estão centradas em interações com empresas, o texto
indica a coleta de informações que não estavam presentes na versão anterior do
documento. Entre elas: carga da bateria, operadora de celular, força do
sinal da operadora e identificadores do Facebook, Messenger e Instagram que
permitem cruzar dados de um mesmo usuário nas três plataformas, numa clara afronta
à Lei
Geral de Proteção de Dados (LGPD), em vigor desde setembro do ano
passado, que regulamenta como devem ser colhidos, armazenados, usados e
excluídos os dados pessoais no país.
Segundo o porta-voz do WhatsApp, o aplicativo
passou os últimos meses fornecendo mais informações sobre essa atualização
para todos os usuários ao redor do mundo. Nesse período, a maioria das pessoas
que já foi notificada aceitou a atualização e a base de usuários do app
continua crescendo. Mas aqueles que ainda não tiveram a chance de aceitar a
atualização não terão suas contas apagadas ou perderão a funcionalidade no dia
15 de maio. A empresa continuará enviando lembretes para eles, dentro do WhatsApp,
nas próximas semanas.
Observação: O WhatsApp afirma que
todas as mensagens — de texto, áudio, vídeo e imagens — são criptografadas de
ponta a ponta, o que significa que somente o remetente e destinatário podem ver
a mensagem. Ressalta ainda que não mantém registros sobre com quem os usuários
estão conversando e que não compartilha listas de contatos com o Facebook,
pontos vistos como preocupações de parte dos usuários. Mas a nova política de
privacidade deixa de garantir a proteção da criptografia em conversas com
contas comerciais. Imagine, por exemplo, uma grande varejista que ofereça
atendimento pelo WhatsApp. Os atendentes não respondem por um celular,
mas por ferramentas que gerenciam os chats. Como existe um terceiro armazenando
e gerenciando interações com empresas, o aplicativo não consegue garantir a
criptografia ponta a ponta para essas conversas.
O uso desses dados obedece ao princípio da autodeterminação informativa, ou seja, cabe a cada indivíduo gerir quando e por quem as informações podem ser utilizadas, e o WhatsApp não parece disposto a propiciar essa escolha aos usuários do aplicativo. Existem, inclusive, questionamentos administrativos e de órgãos de defesa do consumidor sobre estes novos termos, mas até o momento não há indicativo de que a plataforma aceite negociar alterações para que se obedeça a legislação vigente e o direito de escolha do usuário.
O Facebook coleta informações dos
usuários até mesmo quando o app não está sendo executado, e já repassou dados
para outras empresas, como a “Cambridge
Analytica”, que, até onde se sabe, utilizou-os para interferir tanto
nas eleições americanas quanto no Brexit (ao
longo dos últimos anos, a empresa foi acusada diversas vezes de uso indevido
dos dados e pagou indenizações e multas milionárias para evitar problemas mais
sérios).
Depois que a Apple incluiu na
atualização do iOS para a versão 14.5 a
ferramenta App
Tracking Transparency (ATT), que alerta os usuários
do iPhone quando eles acessarem aplicativos que coletam e
compartilham dados com terceiros (permitindo-lhes autorizar ou não a operação),
o Facebook rodou a baiana.
Alegando que isso encarecerá o custo da Internet para o
usuário final — já que muitos serviços online são gratuitos pois são
financiados pela exibição de publicidade, realizada com a coleta dos dados —,
mas mais preocupada com as consequências da restrição ao seu modelo de negócio,
a empresa de Zuckerberg ameaçou acionar judicialmente a marca
da Maçã.
A credibilidade do sistema de proteção de dados será testada pelas próprias sanções que poderão ser impostas pela ANPD. Como se tem visto, muitos vazamentos têm acontecido de forma massiva pela invasão de sistemas de ministérios e empresas públicas. Espera-se que as sanções sejam aplicadas de forma isonômica para todas as empresas, sem privilégios a empresas públicas ou do Vale do Silício.