O escândalo da Covaxin implodiu as redes sociais e pode implodir também o governo Jair Bolsonaro, diz O Antagonista. “Bolsonaro caiu” foi um dos assuntos mais comentados na manhã do último sábado.
Após as revelações do deputado Luis Miranda na CPI do Genocídio, a cúpula do colegiado pretende apresentar uma notícia crime ao STF contra o chefe do Executivo por crime de prevaricação. Segundo o parlamentar, o líder do governo da Câmara, deputado Ricardo Barros, estaria à frente do esquema relacionado à compra de vacinas da Covaxin.
Enquanto isso, como se não estivesse balançando a roseira e o país não registrasse mais de 511 mil mortes causadas por Covid, o motoqueiro das sombras protagonizou mais uma “motociata”. Desta vez o circo foi armado na cidade catarinense de Chapecó, e contou com a participação do senador Jorginho Mello e do deputado Daniel Freitas. O alcaide chapecoense, João Rodrigues, que é citado frequentemente por Bolsonaro em suas lives por ser um dos prefeitos que aderiram abertamente ao tratamento precoce contra a Covid, foi de carona na garupa do capetão.
Esta é a terceira “motociata” promovida por Bolsonaro em quatro semanas. A primeira ocorreu no final de maio, no Rio, e contou com a presença do ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello, o que o levou à reconvocação do general do Exército à CPI da Covid. A segunda se deu em São Paulo, duas semanas atrás, e a mobilização de policiais três forças de segurança estaduais para garantir a segurança do presidente e a fluidez no trânsito custou ao Estado R$ 1,2 milhão.
Por outro lado, o governo paulista autuou o presidente, a deputada federal Carla Zambelli, o então ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles (que já foi tarde), o deputado Coronel Tadeu e o ministro da Ciência e Tecnologia Marcos Pontes por não usarem máscaras na manifestação.
Observação: Segundo a Secretaria da
Segurança Pública de São Paulo, cerca de 12 mil motociclistas percorreram
o trajeto de 129 quilômetros entre a Capital e Jundiaí — um número respeitável,
mas anos-luz distante das 1.324.523 motos contabilizadas por
um delirante organizador do evento e compartilhada nas redes sociais por Bia
Kicis, Carla Zambelli e outros bolsonaristas-raiz,
juntamente com a falácia de que a
manifestação teria entrado para o Guinness World Records. Demais
disso, o número citado pelos bolsonaristas é maior que toda a frota
de motocicletas, motonetas e ciclomotores da cidade de São Paulo (são 1.260.276
veículos, segundo o Denatran). Para conseguir reunir 1,3
milhão de motos, os organizadores teriam que convocar 62% de toda
a frota dos 39 municípios da região metropolitana de São Paulo —
ou 22% da frota de todo o Estado, que corresponde a 6.015.445 de
motos e assemelhados.
Bolsonaro atacou o STF por ter anulado as condenações de Lula (nesse ponto eu concordo com o capetão), e a récua de apoiadores descerebrados respondeu em coro: “Fecha! Fecha!”.
Causa espécie o presidente que “acabou com a Lava-Jato porque não tem mais corrupção no governo” (Deus tá vendo!), que passou os últimos dois anos torpedeando o ex-juiz e ex-ministro Sergio Moro, que se reuniu secretamente com o “dono do Supremo” e salvador do petralha ainda fingir descaradamente que se importa com os cambalachos da corte. Impeachment! Impeachment!
Em sua entrevista ao Papo Antagonista, o
deputado Miranda afirmou que a tarefa do Ministério Público Federal
e da Polícia Federal é “puxar o fio” em relação às denúncias sobre o escândalo
da Covaxin.
“Tenho certeza que a PF vai puxar isso com mais gosto
e vai mostrar que tem algo errado de fato. O presidente vai falar o quê? Que
ele encobriu? O bonito do presidente devia falar hoje que foi enganado pela
equipe, que está exonerado todo mundo. Seria uma demonstração de hombridade.
Ele deveria nos agradecer por expor a verdade.” Cá entre nós,
deputado, seria melhor o senhor esperar sentado.
Miranda disse que vem sendo alvo de
retaliações por ter dado nomes aos bois na CPI do Genocídio, que não
recebeu retorno do deputado-réu Artur Lira — que foi eleito presidente
da Câmara com as benção$ do Executivo — sobre o pedido de proteção policial por
parte da Polícia Legislativa da Câmara, e que “vários [parlamentares]
do Centrão falaram que estão preparados para abandonar o barco […]. Eles
sabem que estou falando a verdade. Essa história do Ministério da Saúde entre
os parlamentares é de largo conhecimento.” Mas não deu nomes aos bois.
Foi uma pena os senadores Alessandro Vieira e Simone
Tebet não terem participado da entrevista. Durante a sessão de sexta-feira, o deputado foi pressionado por vários integrantes da CPI, incluindo Vieira,
que o chamou de “covarde” por não ter a mesma coragem do irmão. Na sequência, Tebet
pediu mais uma vez, e Miranda finalmente declinou o nome do líder de governo na Câmara.
“Eu sei o que vai acontecer comigo. A senhora [Simone
Tebet] também sabe que é o Ricardo Barros que o presidente falou”,
afirmou o depoente. A senadora insistiu: “O senhor confirma?” À
beira das lágrimas, ele respondeu: “Foi o Ricardo Barros que o
presidente falou”. E em seguida começou a chorar.
“Eu queria ter dito desde o primeiro momento, mas é
que vocês não sabem o que eu vou passar. Apontar para o presidente da República
que todo mundo defende como correto e honesto, que sabe que tem algo errado,
sabe o nome, sabe quem é e não faz nada por medo da pressão que pode levar do
outro lado. Que presidente é esse que tem medo de pressão de quem está fazendo
o errado, quem desvia dinheiro?”, lamentou Luiz Miranda.
O depoimento dos irmãos Miranda deixou claro que Bolsonaro sabia do esquema de fraude no Ministério da Saúde e nada fez
a respeito, abrindo espaço para a suspeita de que o capetão seja culpado não
apenas de prevaricação, mas também de corrupção passiva, peculato,
organização criminosa, advocacia administrativa, tráfico de influência e
sabe-se lá mais o quê. Sem contar que, ao determinar à PF que investigue os
depoentes, Bolsonaro comete os crimes de abuso de autoridade, intimidação,
coação de testemunhas e obstrução de justiça. Foi público e todo mundo viu.
Se fosse um cidadão comum, poderia ter sido preso em flagrante.
Reproduzo aqui um sábio conselho de Ricardo Rangel: Senhor Procurador-Geral da República Augusto Aras,
até quando o senhor vai se fingir de morto? É sua obrigação instaurar um
inquérito contra Jair Messias Bolsonaro. Se não o instaurar, quem vai
estar cometendo crime de prevaricação é o senhor. Lembre-se, senhor Aras:
o senhor não vai ser Procurador-Geral para sempre. Mais cedo ou mais tarde,
haverá outro presidente no Planalto e outro procurador com a sua caneta.