Em 2018, a maioria de nós sabia que, como presidente, o mau
militar e parlamentar medíocre que aprovou dois projetos em 27 anos no baixo
clero da Câmara Federal não seria capaz sequer de tirar água de uma bota, mesmo
que as instruções viessem impressas no calcanhar. Hoje, sabemos muito bem do
que ele é capaz e, principalmente, do que não é.
Mas a questão é que volta de um criminoso condenado — que deixou a cadeia muito antes do que deveria e teve sua ficha imunda lavada com o nítido propósito de ser recolocado no jogo político-sucessório — ao Planalto, que por si só já seria apavorante, torna-se aterradora quando as pesquisas dão conta de que ele é o pré-candidato preferido do “esclarecidíssimo” eleitorado tupiniquim.
Torçamos, pois, para que a tal Terceira Via se consolide o
quanto antes, seja com Moro, seja com outro postulante que tiver
condições reais de pôr termo a essa nefasta dicotomia.
Na avaliação de Carlos Fernando Santos Lima, ex-Procurador Regional da República em São Paulo e ex-membro da Lava-Jato em Curitiba entre 2014 e 2018, Bolsonaro não será reeleito.
Lima
reconhece que qualquer previsão é um exercício de futurologia, mas pondera que
algumas são muito mais seguras que outras.
Considerando que “de onde menos se espera, daí que não
sai nada”, como dizia o Barão de Itararé, é possível afirmar que o
Brasil terá mais um ano de péssimas notícias na economia e na política — dois
campos em que estamos presos às péssimas escolhas feitas no passado e a nossa
incapacidade, como sociedade, de tomarmos decisões difíceis, mas necessárias, e
de as implementarmos efetivamente, doa a quem doer.
Lima diz que, mesmo correndo o risco de parecer Cassandra — profetiza que previa o futuro, mas foi amaldiçoada porque ninguém acreditava em seus
vaticínios —, a tendência de Bolsonaro não se reeleger parece
inexorável, a despeito de todos os estelionatos fiscais promovidos por ele, por
seus correligionários e pelas siglas mercenárias comandadas pelo réu que
preside a Câmara.
Bolsonaro perceberá uma verdade histórica: todos
os governos que subsistiram mediante a compra de apoio e proteção e tropas
mercenárias no passado e de políticos venais no presente acabaram sendo
abandonados quando a derrota ficou evidente. Assim será com o dele, já que o Centrão
se encaminhará naturalmente para a candidatura de Lula, seu antigo
mecenas, que, pelo andar da carruagem, terá presença garantida no segundo turno.
Bolsonaro pode não chegar
ao segundo turno, mas fazer essa afirmação é uma aposta mais arriscada. Certo é que a
polarização com Lula beneficia a ambos, e a dificuldade da Terceira
Via em falar a mesma língua dos dois populistas tende a ser mais um obstáculo ao
crescimento de um movimento ético, livre dessa polarização que nos mantém
presos a ciclos de crescimento raquítico seguidos de longos períodos
recessivos.
Bolsonaro representa — infelizmente — uma parte
de nossa população autoritária, pouco educada, envenenada pelo ódio a quem pensa
diferente. Mas, assim como esse grupo de obscurantistas de direita, há também a
patuleia que se apega a Lula, último populista desse reduto
ideológico.
Lula
surfará nos erros de Bolsonaro — o que não será difícil, pois o capetão corresponde perfeitamente ao que popularmente é conhecido como “espírito
de porco”, sempre disposto a criar cizânia e a impor sua visão
preconceituosa e desagradável aos demais.
Em suma, estamos presos a essa roda de corrupção,
preconceito e atraso com esses dois candidatos, mas a visão maniqueísta da
política poderá nos impor ambos no segundo turno, o que leva o ex-procurador a
reiterar a previsão de que Bolsonaro não será reeleito, seja
pela humilhação da vitória do picareta já no primeiro turno — o que é
improvável, mas não impossível —, seja pela elisão do próprio Bolsonaro da
disputa já no primeiro turno, com a perda do segundo lugar para o tal candidato
da Terceira Via.
Mesmo na hipótese assustadora de se enfrentarem no embate final, nem o sociopata do planalto nem o bocório de Garanhuns conquistará os votos de parte significativa dos eleitores da Terceira Via, já que a escolha do "menos pior", característica do sistema eleitoral de dois turnos, tende a não prevalecer.
Em outras palavras, os eleitores
conscientes tendem a optar pelo voto nulo — uma forma digna e honesta
de negar apoio a esse atual estágio de nossa cleptoplutocracia, para usar um
neologismo do falecido professor Luiz
Flávio Gomes.
É evidente que a vitória de Bolsonaro em 2018 foi um soluço de uma direita autoritária, que se encontrava
adormecida na Nova República e acordou com o advento das redes sociais e da corrupção entranhada no modelo de presidencialismo de coalizão, exacerbada
pelo apetite de poder do Partido dos Trabalhadores que não trabalham e dos
intelectuais que não pensam.
A diferença de pouco mais de 10% dos votos válidos, na eleição que o capitão disputou contra um candidato fraco e desconhecido em pleno auge da operação Lava-Jato demonstra que a previsão de derrota do capitão é uma aposta confiável e factível — só votarão nele os fanáticos, para quem pouco importa o futuro do país. Resta saber como impedir que a outra face do populismo e da corrupção volte ao poder.
O desafio da Terceira Via é encontrar o tom certo do discurso que unirá o centro democrático e o empresariado, prontos a aceitar essa candidatura, com a população desejosa — e viciada — em líderes messiânicos.
Ninguém se elege no Brasil sem propostas que sejam compreendidas pela população. Será preciso falar aos milhões de desempregados que perderam as esperanças, aos empreendedores amedrontados pelo espectro da inadimplência, às mulheres que veem a fome adentrar em suas casas, enfim, será preciso deixar claro que nenhum receituário liberal poderá colocar de lado as aflições e problemas reais e inadiáveis que a população brasileira enfrenta neste exato momento.
O derretimento de Bolsonaro é inevitável e a transferência de votos para Lula é um problema a ser solucionado. O quadro de candidatos ainda está indefinido, mas vem se cristalizando de uma maneira muito rápida. Após a derrota de Eduardo Leite para João Doria, o panorama parece ter se definido entre o governador de São Paulo e Sergio Moro, com Ciro Gomes correndo desesperadamente para não ser atropelado pelo sumo pontífice da petelândia.
No espectro da centro-direita, a candidatura de Leite era mais bem vinda que a de Doria, que não possui a qualidade do
“novo”, melhor representado por seu colega gaúcho. Resta agora esperar que o
tempo e o desenvolvimento das campanhas mostrem
competência para conquistar o eleitorado. Lula e Bolsonaro são
conhecidos, mas representam a manutenção das tensões sociais e econômicas no
país. E é exatamente nisso que eles apostam.
Outra previsão fácil para este ano é a de que não será um
período de paz e tranquilidade, seja por conta do recrudescimento da Covid —
uma praga que parece renascer das cinzas como a mitológica Phoenix —, seja por culpa da péssima condução da economia e das tensões naturais de uma disputa política.
Mas o fato é que jamais estivemos tão necessitados da superação desses problemas, e isso só
será possível fora do eixo autoritário-populista que Lula e Bolsonaro representam.
Estamos caminhando sobre o fio da navalha para evitar que projetos autoritários e equivocados conquistem o país — e isso nada tem a ver com Bolsonaro, já que ele dificilmente ganhará as eleições. Aliás, O bolsonarismo está apavorado com a possibilidade de crescimento de Moro nas pesquisas.
Segundo o UOL, auxiliares do presidente estão
preocupados com o poder de alcance do discurso bolsonarista, visto que, a
despeito de sua popularidade estar em baixa, o capitão continua a dialogar
apenas com sua base militante, que não passa de 20% do eleitorado.
Para além disso, os cenários conturbados nas áreas social, econômica, política e sanitária do país têm potencial para aproximar a população a um nome da chamada Terceira Via (olha ela aí outra vez), e a maior preocupação dos apoiadores do capetão é a transferência de votos ao campo da direita mais moderada no primeiro turno, com destaque ao pré-candidato Sergio Moro (olha ele aí outra vez).
Tudo indica que os asseclas do capitão sociopata estão certos: se o ex-juiz tirar mais 5% dos votos do "mito" dos apalermados, sua reeleição descerá pelo ralo.