quarta-feira, 19 de janeiro de 2022

QUEM PRECISA DE VÍRUS?

Em qualquer lugar do mundo, o ministro da Saúde comemoraria o início da vacinação infantil. Mas aqui é diferente. Ao ver o governador de São Paulo vacinar a primeira criança, o ministro ficou furioso: “(Doria) está fazendo palanque. Acha que isso vai tirá-lo dos 3%. Desista!”.

No Brasil sob Bolsonaro, temos um ministro que, em tese, não é político — mas todo dia deixa de cumprir sua obrigação para fazer palanque — criticando o governador paulista, que é político, por transformar a obrigação cumprida em palanque.

Além de criticar quem defende a saúde das crianças brasileiras, Queiroga entregou, sem licitação, a armazenagem e o transporte das vacinas a uma empresa sem qualquer experiência no ramo — em pelo menos cinco estados houve problemas de imunizantes chegaram em condições inadequadas de armazenamento e transporte. Qualquer semelhança entre ele e seu antecessor (um manda e o outro obedece) não é mera coincidência.

O general que se dizia expert em logística não era capaz de tirar água de uma bota nem se as instruções viessem impressas no calcanhar. No afã de transformar a Saúde num pesadelo, “esqueceu” 6 milhões de testes RT-PCR num armazém federal em Guarulhos (SP); enviou para o Amapá as vacinas que deveriam ir para o Amazonas; só conseguiu comprar menos de 3% dos 330 milhões de seringas e agulhas destinadas ao PNI; e disse que a Pfizer ofereceu apenas 9 milhões de doses da vacina, quando na verdade foram 70 milhões de doses.

Em meados de dezembro de 2020, o grande estrategista (que não por acaso foi o ministro da Saúde mais longevo desde o início da pandemia), perguntado sobre o cronograma da vacinação, respondeu com outra pergunta: Para que essa ansiedade e essa angústia? 

No início do ano passado, enquanto pessoas morriam feito moscas por falta de oxigênio medicinal nos hospitais manauaras, Pazuello inundou o Amazonas com kits-Covid à base de cloroquina. E quando soube pela cunhada que o irmão dela não tinha oxigênio nem para passar o dia, disse o general: “Você e todo mundo vão esperar chegar o oxigênio e ser distribuído. Não tem o que fazer. Então, vamos com calma.

O descaso do governo federal com vacinação levou um grupo de 352 juristas, intelectuais, artistas e ambientalistas a solicitar a abertura de uma ação criminal contra Bolsonaro no STF por “sabotar e frustrar” o processo de imunização e colocar em risco a saúde pública.

Em live nas redes sociais, em meio ao colapso no sistema de saúde de diversos estados brasileiros, Bolsonaro disse que lamentava as mortes causadas pela pandemia, mas que "agora parece que só (se) morre de Covid no Brasil". Segundo o “grande estadista”, essa história de negacionismo é "conversa para boi dormir".

Ao contrário do que seria de esperar de uma pessoa normal em posição de liderança, o anormal que preside o Brasil moveu montanhas para desacreditar as vacinas, o distanciamento social e o uso de máscaras. Sua postura inefável lhe garantiu o título de pior líder mundial no combate ao coronavírus e o primeiro lugar no ranking dos mandatários tupiniquins com maior número de pedidos de impeachment (são mais de 140).

Entre abril e outubro do ano passado, a CPI do Genocídio jogou luz sobre a podridão que cerca o governo federal. O relatório final, aprovado por 7 dos 11 titulares (a despeito do prodigioso esforço da tropa de choque do Planalto) recomendou o indiciamento de 77 pessoas — entre ministros e ex-ministros, políticos, servidores públicos, empresários e membros do chamado “gabinete paralelo” — e atribuiu ao mandatário de fancaria uma dezena de crimes comuns e de responsabilidade

PGR já abriu mais de uma centena de investigações preliminares envolvendo o chefe do Executivo, mas ainda não chegou a nenhuma conclusão. Numa de suas manifestações mais polêmicas, a subprocuradora-geral Lindôra Araújo alegou não ter visto crime na decisão de Bolsonaro de não usar máscara e levantou dúvidas sobre a eficácia do material de proteção, cuja importância é amplamente propagada por especialistas.

Augusto Aras tem sido criticado publicamente pela lentidão nas ações contra Bolsonaro e seus aliados. A demora provocou reações dos ministros Alexandre de Moraes e Carmen Lúcia, que mandaram a PGR explicar as ameaças golpistas do presidente no dia 7 de setembro e compartilhar com o STF uma apuração preliminar sobre as mentiras do mandatário sobre as vacinas.

Em entrevista à Jovem Pan, o "mito" dos bolsomínions disse que "a CPI foi uma palhaçada" e que o relator, senador Renan Calheiros, "agiu por vingança". Ao ser questionado sobre 'rachadinha', o entrevistado simplesmente encerrou a entrevista.

Para surpresa de ninguém, o TSE rejeitou a cassação da chapa Bolsonaro-Mourão. Os ministros criticaram o presidente e afirmaram que foi comprovada a existência de um esquema ilícito de propagação de notícias falsas via WhatsApp no último pleito para beneficiar a chapa, mas consideraram que não havia gravidade suficiente para cassá-la.

BarrosoMoraes e Fachin mandaram duros recados a Bolsonaro e afirmaram que, embora o tribunal não tenha imposto pena nesse caso, o julgamento serviu para preparar a corte para 2022, quando o esclarecidíssimo eleitorado canarinho voltará às urnas para escolher presidente e vice, governadores, deputados federais e estaduais e 1/3 dos senadores da República (outros 2/3 foram eleitos em 2018). 

Pelo andar da carruagem, essa "festa da democracia" deve ocorrer ainda em meio a pandemia sanitária, sem as reformas estruturantes prometidas, com desemprego, desalento e estagflação, dólar acima de R$ 5, denúncias de corrupção em todos os escalões do governo (governo esse que diz ter acabado com a Lava-Jato porque "não existe mais corrupção"), “fundão eleitoral” de R$ 5,7 bi e uma corja de políticos que só pensam em si mesmos.

Com políticos e agentes públicos como esses, quem precisa de vírus?