Em qualquer lugar do mundo, o ministro da Saúde comemoraria o início da vacinação infantil. Mas aqui é diferente. Ao ver o governador de São Paulo vacinar a primeira criança, o ministro ficou furioso: “(Doria) está fazendo palanque. Acha que isso vai tirá-lo dos 3%. Desista!”.
No Brasil sob Bolsonaro, temos um ministro que, em
tese, não é político — mas todo dia deixa de cumprir sua obrigação para fazer
palanque — criticando o governador paulista, que é político, por transformar a
obrigação cumprida em palanque.
Além de criticar quem defende a saúde das crianças
brasileiras, Queiroga entregou, sem licitação, a armazenagem e o
transporte das vacinas a uma empresa sem qualquer experiência no ramo — em pelo
menos cinco estados houve problemas de imunizantes chegaram em condições
inadequadas de armazenamento e transporte. Qualquer semelhança entre ele e seu
antecessor (um
manda e o outro obedece) não é mera coincidência.
O general que se dizia expert em logística não era capaz de
tirar água de uma bota nem se as instruções viessem impressas no calcanhar. No
afã de transformar a Saúde num pesadelo, “esqueceu”
6 milhões de testes RT-PCR num armazém federal em Guarulhos (SP); enviou
para o Amapá as vacinas que deveriam ir para o Amazonas; só conseguiu comprar menos
de 3% dos 330 milhões de seringas e agulhas destinadas ao PNI;
e disse que a Pfizer ofereceu apenas 9 milhões de doses da
vacina, quando na verdade foram 70
milhões de doses.
Em meados de dezembro de 2020, o grande estrategista (que
não por acaso foi o ministro da Saúde mais longevo desde o início da pandemia),
perguntado sobre o cronograma da vacinação, respondeu com outra pergunta: Para
que essa ansiedade e essa angústia?
No início do ano passado, enquanto pessoas morriam feito moscas
por falta de oxigênio medicinal nos hospitais manauaras, Pazuello inundou
o Amazonas com kits-Covid à base de cloroquina. E quando soube pela
cunhada que o irmão dela não tinha oxigênio nem para passar o dia, disse o
general: “Você
e todo mundo vão esperar chegar o oxigênio e ser distribuído. Não tem o que
fazer. Então, vamos com calma.”
O descaso do governo federal com vacinação levou um
grupo de 352 juristas, intelectuais, artistas e
ambientalistas a solicitar a abertura de uma ação criminal
contra Bolsonaro no STF por “sabotar
e frustrar” o processo de imunização e colocar em risco a saúde pública.
Em live nas redes sociais, em meio ao colapso
no sistema de saúde de diversos estados brasileiros, Bolsonaro
disse que lamentava as mortes causadas pela pandemia, mas que "agora
parece que só (se) morre de Covid no Brasil". Segundo o “grande
estadista”, essa história de negacionismo é "conversa para boi dormir".
Ao contrário do que seria de esperar de uma pessoa normal em
posição de liderança, o anormal que preside o Brasil moveu montanhas para desacreditar
as vacinas, o distanciamento social e o uso de máscaras. Sua postura inefável
lhe garantiu o título de pior
líder mundial no combate ao coronavírus e o primeiro lugar no
ranking dos mandatários tupiniquins com maior número de pedidos de impeachment
(são mais de 140).
Entre abril e outubro do ano passado, a CPI do
Genocídio jogou luz sobre a podridão que cerca o governo federal. O relatório
final, aprovado por 7 dos 11 titulares (a despeito do prodigioso esforço da
tropa de choque do Planalto) recomendou o indiciamento de 77 pessoas — entre
ministros e ex-ministros, políticos, servidores públicos, empresários e membros
do chamado “gabinete paralelo” — e atribuiu ao mandatário de fancaria uma
dezena de crimes
comuns e de responsabilidade.
A PGR já abriu mais de uma centena de investigações
preliminares envolvendo o chefe do Executivo, mas ainda não chegou a
nenhuma conclusão. Numa de suas manifestações mais polêmicas, a
subprocuradora-geral Lindôra Araújo alegou não ter visto crime
na decisão de Bolsonaro de não usar máscara e levantou dúvidas
sobre a eficácia do material de proteção, cuja importância é amplamente
propagada por especialistas.
Augusto Aras tem sido criticado publicamente pela
lentidão nas ações contra Bolsonaro e seus aliados. A demora provocou
reações dos ministros Alexandre de Moraes e Carmen Lúcia, que
mandaram a PGR explicar as ameaças golpistas do presidente no dia 7 de setembro
e compartilhar com o STF uma apuração preliminar sobre as mentiras do
mandatário sobre as vacinas.
Em entrevista à Jovem Pan, o "mito" dos
bolsomínions disse que "a CPI foi uma palhaçada" e que o
relator, senador Renan Calheiros, "agiu
por vingança". Ao ser questionado
sobre 'rachadinha', o entrevistado simplesmente encerrou a entrevista.
Para surpresa de ninguém, o
TSE rejeitou a cassação da chapa Bolsonaro-Mourão. Os ministros
criticaram o presidente e afirmaram que foi comprovada a existência de um
esquema ilícito de propagação de notícias falsas via WhatsApp no
último pleito para beneficiar a chapa, mas consideraram que não havia gravidade
suficiente para cassá-la.
Barroso, Moraes e Fachin mandaram
duros recados a Bolsonaro e afirmaram que, embora o tribunal
não tenha imposto pena nesse caso, o julgamento serviu para preparar a corte
para 2022, quando o esclarecidíssimo eleitorado canarinho voltará às urnas para
escolher presidente e vice, governadores, deputados federais e estaduais e 1/3
dos senadores da República (outros 2/3 foram eleitos em 2018).
Pelo andar da carruagem, essa "festa da
democracia" deve ocorrer ainda em meio a pandemia sanitária, sem as
reformas estruturantes prometidas, com desemprego, desalento e estagflação,
dólar acima de R$ 5, denúncias de corrupção em todos os escalões do
governo (governo esse que diz ter acabado com a Lava-Jato porque
"não existe mais corrupção"),
“fundão eleitoral” de R$ 5,7 bi e uma corja de políticos que só pensam em si
mesmos.
Com políticos e agentes públicos como esses, quem precisa de
vírus?