Enquanto Putin dá sequência ao genocídio que implementou no leste europeu,
a vida continua no país das maravilhas sem Alice. Semanas atrás, nossa mais alta
corte de justiça chancelou a imoralidade parida
pelo legislativo, aprovando por 9 votos a 2 o fundo eleitoral de R$ 4,9
bi num ano em que o brasileiro, já castigado pela Covid, vem sendo assediado por
uma mistura de inflação com estagnação econômica.
Pode-se argumentar que a decisão das togas foi correta, já que o fundo não é inconstitucional. Só que isso não o torna a rapinagem menos imoral, até porque nada é mais indecoroso do que legisladores que legislam em causa própria.
A democracia não é um regime grátis, mas verba pública tampouco é dinheiro grátis. O fundão — dinheiro que os políticos roubam dos “contribuintes” para financiar suas campanhas e, uma vez eleitos, continuarem roubando os contribuintes — foi criado depois que o STF proibiu o financiamento privado de campanhas. Com isso, o Brasil foi alçado ao topo do ranking dos países que mais aplicam verbas públicas no financiamento de eleições.
O rateio do butim é proporcional ao tamanho das bancadas na Câmara. Quanto mais deputados, maior a fatia do bolo — daí muitos partidos estarem mais interessados nas eleições proporcionais do que em bancar candidaturas próprias à Presidência desta banânia. Consumada a divisão, os oligarcas que controlam a chave do cofre dos partidos transformam a distribuição do dinheiro numa ação entre amigos. Os maiores beneficiados são os próprios donos das legendas e quem já dispõe de mandato.
Segundo Josias de Souza, eleição é como restaurante a quilo: o eleitor não pode escolher senão o que está disponível no bufê, sendo compelido, não raro, a optar entre o lamentável e o impensável. A célebre tirada do Churchill segundo a qual a democracia é o pior regime imaginável com exceção de todos os outros ganhou uma versão brasileira: até um simulacro de democracia é preferível a todas as suas alternativas — com exceção de uma democracia de verdade, que não desrespeite o eleitor com um fundão reajustado em mais de 200%.
A boa notícia é que, ao decidir que não pode coibir o descalabro, o Supremo como que intimou o eleitor a fazer justiça com o próprio dedo. A íntegra das listas de votação estão disponíveis nos sites da Câmara e do Senado, e quem disse "sim" ao fundão nas votações do Legislativo merece receber das urnas um indefectível "não".
No que tange à disputa pela Presidência, a nefasta
polarização político-ideológica semeada por Lula, regada
pelos tucanos e estrumada por aquele que o senador Omar Aziz definiu (de
maneira lapidar) como “o
carioca que tira proveito de funcionários do próprio gabinete” e que “quando
abre a boca espalha fezes” exige que os partidos de centro (não confundir com “Centrão”) se unam em torno de uma candidatura única. Nesse sentido, Alessandro
Vieira, Felipe D’Ávila, João Doria, Sergio Moro,
e Simone Tebet vêm articulando a formação de uma chapa unificada que
tenha chances reais de disputar o segundo turno (contra Lula ou contra Bolsonaro, a não ser que o imprevisto tenha voto decisivo na assembleia dos acontecimentos).
O grupo já havia recebido a adesão do Cidadania, que se
juntou ao PSDB em uma federação para a corrida presidencial. Apenas Ciro
Gomes não aceitou participar desses entendimentos, que se intensificaram em
reuniões preliminares realizadas em Brasília, às vésperas do carnaval, entre os
presidentes dos três principais partidos desse projeto: Bruno Araújo
(PSDB), Baleia Rossi (MDB) e Luciano Bivar (PSL).
Unida, a terceira via poderia somar 35% nas pesquisas, mais
do que os números de Bolsonaro, por exemplo, e poderia ir para o segundo
turno em condições de derrotar Lula. Assim, se um candidato da terceira via
chegar ao segundo turno, ele vence tanto Lula quanto Bolsonaro. Liderando
o grupo da terceira via na faixa dos 10%, Moro acha que o critério para
se escolher o cabeça da chapa pode ser quem estiver melhor nas pesquisas. Doria
concorda com esse critério, mas diz que é preciso fixar primeiramente qual será
o momento de corte da pesquisa para se chegar ao nome com maior viabilidade
eleitoral.
O tempo urge, e os extremos (leia-se Lula e Bolsonaro)
são inescrupulosos e contam com uma poderosa máquina de produção de mentiras em
massa. “Precisamos de espírito público para, com coragem e ousadia, deixar
de lado projetos pessoais e pensar no País como um todo”, disse Moro
à ISTOÉ. É mais ou menos a posição de Doria: “Se não nos
unirmos, daremos a eleição para Lula ou Bolsonaro e aí estaremos em uma
situação desastrosa, com um retrocesso gigantesco, pois os dois são populistas
e nocivos ao País”.
Às vezes é preciso dividir para conquistar, mas isso não
muda o fato de que a união faz a força.