Corpos de civis abandonados por ruas com casas, lojas e carros destruídos. Esse era o cenário em Bucha, a cerca de 60 km de Kiev, quando os ucranianos voltaram a ter o controle da cidade após a saída das tropas russas. O presidente Volodymyr Zelensky acusou a Rússia de promover genocídio, mas os russos dizem que o massacre seria uma armação de seus inimigos e negam ter atacado civis.
A resposta da ONU a divulgação das imagens de mortos deixados em Bucha foi a mais dura desde o início da guerra. Os russos foram acusados de "violações e abusos graves e sistemáticos", e o país acabou suspenso do Conselho de Direitos Humanos da ONU. Mas nada disso impediu que um novo ataque aéreo ocorresse: Na última sexta-feira, dezenas morreram em um bombardeio a uma estação de trem lotada no leste da Ucrânia. Mais uma vez, o governo ucraniano acusa a Rússia de ter realizado deliberadamente o ataque, o que Moscou nega.
Mudando de um ponto a outro, o recurso apresentado pela PGR contra a decisão da ministra Rosa Weber no caso Covaxin revela quão ilimitado é o desejo de Augusto Aras de transformar a blindagem de Bolsonaro num processo de ridicularização da Procuradoria. Para livrar Bolsonaro, Aras e sua equipe aceitam como verdadeira uma fábula em que o general Eduardo Pazuello faz o papel de boi de piranha (falo da rês que é jogada no rio para ser comida enquanto o resto da manada passa).
Aras negou-se a arquivar o inquérito que investiga se Bolsonaro cometeu crime de prevaricação no caso da compra da vacina indiana. Aras pediu a ela que reconsidere a decisão ou submetesse o recurso ao plenário do Supremo. Segundo ele, o presidente da República não é obrigado a mandar investigar as denúncias de crime que lhe chegam aos ouvidos. O procurador-vassalo prefere enxergar o "boi de piranha" na figura rotunda do general Pesadelo a ter de admitir que o capitão-suserano deva ser investigado por suspeita de prevaricação. E o STF, se permitir que as piranhas devorem apenas ex-interventor da Saúde, vincular-se-á à Procuradoria no projeto da autodesmoralização.
Bolsonaro pode ser acusado de tudo, menos de uma boa gestão e de não ser oportunista. Como se soube, depois que foi cooptado por pastores amigos e de prepostos do Centrão, a MEC adotou o lobby como programa e o "quanto eu levo nisso" como lema. Matreiro, o capetão se valeu do gancho deixado Aras para se escudar da merda que bateu no ventilador da pasta sob a batuta do ministro-pastor indicado pela terrivelmente evangélica primeira-dama.
O TCU levou o pé à porta para impedir um superfaturamento de R$ 732 milhões na aquisição de ônibus escolares. A falcatrua foi revelada no sábado pelo Estadão. Dois dias depois, de passagem pelo Rio de Janeiro, Bolsonaro subiu no caixote: "Porra, a licitação nem foi feita ainda. Quem descobriu fomos nós. Nós temos compliance, temos gente trabalhando em cada ministério com lupa em contratos."
Imaginou-se que o presidente já tivesse ordenado o cancelamento da licitação. Engano. Menos de 24 horas depois de seu arroubo o MEC informou que o pregão eletrônico suspeito estava mantido para terça-feira. Nele, o governo se dispôs a pagar até R$ 480 mil por um ônibus escolar que custa no mercado — no máximo — R$ 270 mil. Assim, a compra de 3.850 veículos saltaria de R$ 1,31 bilhão para R$ 2,08 bilhões.
Pegos no contrapé, os operadores que o Centrão infiltrou no MEC fixaram um novo valor máximo para a compra dos ônibus: R$ 1,5 milhão — preço sugerido pela CGU em manifestação de 10 de março, mas que vinha sendo ignorado antes de o caso ganhar os contornos de escândalo. Resta explicar por que o governo desprezou alertas feitos pela CGU e pela área técnica do próprio Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação, por que manteve do pregão eletrônico depois de o caso ter sido pendurado nas manchetes de ponta-cabeça e por que os responsáveis pelo edital superfaturado continuam em seus postos?
Provocado por três parlamentares —Tábata Amaral, Felipe Rigoni e Alessandro Vieira — o ministro Walton Alencar, do TCU, achou melhor se precaver: autorizou a realização da licitação, mas condicionou a homologação à demonstração prévia de que não houve maracutaia. Bolsonaro voltou a declamar o velho e batido ramerrão segundo o qual seu governo está há três anos e três meses sem corrupção. Quem olha ao redor percebe que não faltam malfeitorias. O que falta é vergonha na cara.
Por falar nisso, o ex-ministro Milton Ribeiro manteve a cara do capitão no fogo ao declarar em depoimento à PF que abriu as portas do MEC para pastores lobistas a pedido do chefe.
Com Josias de Souza