domingo, 7 de agosto de 2022

O DESEMPREGADO QUE DEU CERTO (DÉCIMA QUINTA PARTE)


No dia da votação de seu impeachment, Collor enviou carta de renúncia por meio de seu advogado, entendendo que a ação perderia o objeto e ele preservaria seus direitos políticos. Porém o julgamento seguiu adiante e o caçador de marajás de araque foi condenado por 76 votos a 3 (dois senadores se ausentaram do plenário). Por menos que fizesse sentido cassar o mandato de alguém que a ele já havia renunciado, comparsa de PC Farias foi inabilitado ao exercício de função pública por oito anos.

Dilma lutou bravamente até o último minuto, mas acabou condenada por 61 votos a 20. Graças à maracutaia urdida pela dupla Renan-Lewandowski, a inabilitação foi objeto de uma votação em separado, e o placar ficou em 42 a 36 (com 3 abstenções). Tudo somado e subtraído, 19 senadores que votaram pela deposição da nefelibata da mandioca acharam que lhe deviam uma espécie de “prêmio de consolação”.

Em caso de condenação, o § único do art. 52 da Constituição de 1988 estabelece expressamente a perda do cargo com inabilitação, por oito anos para o exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis. Como se sabe, “com” exerce a função de conjunção subordinativa aditiva, relacionando o que vem depois dela (inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública) ao que vem antes (perda do cargo).

O argumento esgrimido pelos apoiadores de Dilma — e respaldado por Lewandowski — foi o art. 33 da Lei 1.079 de 1950 (também chamada de Lei do Impeachment), que é lido com a seguinte redação: 

"No caso de condenação, o prazo de inabilitação do presidente condenado para o exercício de qualquer função pública é de oito anos; e no caso de haver crime comum deliberará ainda sobre se o presidente o deverá submeter à justiça ordinária, independentemente da ação de qualquer interessado."

A questão é que a manobra pró-Dilma se baseou em dispositivo legal inaplicável ao caso. O malsinado art. 68 e seu parágrafo único se aplicam apenas em processos e julgamentos de Ministros do STF e do Procurador Geral da República, conforme disposições contidas na Parte Terceira, Títulos I e II, da Lei 1079O texto constitucional é claro e explícito, lendo-se no art. 52, § único que a o impeachment e a inabilitação são indissociáveis.

Em face do exposto, o julgamento da estocadora de vento teria de ser feito em etapa única, indagando-se ao plenário do Senado se a presidente da República praticou crime de responsabilidade. A suspensão dos direitos políticos, insista-se, seria efeito intrínseco à condenação.

Em vista da maneira como Lewandowski foi alçado ao STF e atuou no julgamento do Mensalão, sua postura no julgamento do impeachment de Dilma não foi exatamente uma surpresa. O que causou espécie foi o fato de seus colegas de toga simplesmente "lavarem as mãos" diante da contradição dos vereditos. Na condição de guardião da Constituição, o STF deveria ter anulado o julgamento e determinado seu refazimento. Ao condenar a ré por crime de responsabilidade e não apená-la por esse mesmo crime, a contradição e a perplexidade transformaram o veredito num resultado teratológico (como tantos outros que testemunhamos nos últimos anos).

Observação: Se esta republiqueta de bananas fosse um país serio, sério como manda o figurino, Lewandowski deveria ter respondido a um processo de impeachment por crime de prevaricação.

Há muito que a cidadania brasileira anseia por viver em um Estado Democrático de Direito que garanta a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida com a solução pacífica das controvérsias, conforme preconizado no preâmbulo da Constituição da República. Infelizmente, nada disso ocorrerá se Lula voltar à Presidência ou Bolsonaro for reeleito. 

Triste Brasil!

Continua...