sábado, 24 de setembro de 2022

UMA CAMPANHA SURREAL (PARTE 2)

 

Bolsonaristas que participaram do sequestro do bicentenário da Independência por D. Imbrochável não eram membros da KKK, como afirmou Lula, agravando a estupidez eleitoral. O que lhes falta — como falta também aos lulistas — é abertura à influência de amigos e intelectuais resistentes ao “canto da sereia das ideias dominantes” de seu tempo. 
 
O que se tem visto nesta abjeta campanha presidencial é um presidente e um ex-presidente tentando se limpar um na sujeira do outro. A resposta do ex-presidiário sobre a compra de apoio parlamentar em seu governo, com R$ 101,6 milhões em dinheiro sujo, é ilustrativa. Mas pouco importa se o mensalão foi pior (ou não) que o orçamento secreto. Grave é a corrupção tradicional (ou institucionalizada) ser relegada a uma questão relativa e comparativa, quando deveria ser absoluta e eliminatória. 

Do “rouba, mas faz” para a disputa entre “quem rouba menos” agravou-se de tal modo a transigência moral com a rapinagem dos cofres públicos que o resultado só pode ser o conformismo perverso do raciocínio "roubar, todos roubam, mas quem me representa?

Bolsonaro ladra (do verbo ladrar) para Lula, mas sabem que lhe faltam dentes para morder. Continua a negar a pandemia, a fome e seus funcionários-fantasma. Evita o impeachment (que já não faz mais sentido) com um esquema em que os recursos (R$ 72,9 bilhões, entre 2020 e 2023) voaram dos cofres da União para os redutos indicados por parlamentares não identificados. Sua taxa de rejeição, estabilizada a poucos dias da eleição, o consolida como uma espécie de Napoleão que espera a decisão do eleitor sobre a data do Waterloo. Em entrevista a um programa de TV popularesco, o presidente voltou a dizer que os militares fiscalizarão a apuração das urnas dentro de uma sala cofre do TSE. A apuração paralela é um delírio. A sala secreta, uma ficção urdida por um golpista que flerta com o Apocalipse.

Nunca subestime Bolsonaro. Como um "napoleão" que passou os últimos três anos e nove meses se descoroando, ele planejou a própria "descoroação", mas se frustrou ao tentar fabricar de afogadilho um estadista de vitrine, preocupado com o social e com as mulheres. Já o abjeto molusco eneadáctilo cresceu nos segmentos majoritários do eleitorado. Em uma semana, as mulheres o presentearam com mais três pontos percentuais. É como se as eleitoras afagadas por Micheque e os eleitores mimados com benefícios sociais de ocasião sinalizassem a intenção de punir o "imbrochável" pelo conjunto da obra. 

Bolsonaro virou um napoleão de hospício que, ao levar seu governo para o nosocômio, transformou-se num Duque de Wellington de si mesmo. No outro extremo do tablado, Lula surfa na onda do antibolsonarismo (uma força política que superou o antipetismo de 2018). Na prática, temos, por um lado, um presidente que planeja exclusivamente permanecer no poder, distribuindo dinheiro dos outros sem equidade e transparência, e por outro o dono do partido que planejava se perpetuar no poder com mensalão e petrolão. Os dois só se limpam na sujeira um do outro porque o eleitorado se diverte no pântano.

Triste Brasil.