terça-feira, 4 de outubro de 2022

LUTANDO A GUERRA DE ONTEM

 

O ex-capitão presidente e o ex-presidente e ex-presidiário vão para o segundo turno. No primeiro, a diferença entre os dois (48,43% x 43,20%) foi de pouco mais de cinco pontos percentuais. Muito menos do que as pesquisas apontavam. Os institutos também erraram em várias eleições estaduais. Em São Paulo, por exemplo, Tarcísio ficou na frente de Haddad.

O resultado foi o mais apertado desde a redemocratização e indica que as próximas quatro semanas vão compensar a pasmaceira do primeiro turno. Bolsonaro chega fortalecido pelas vitórias de governadores e de seus ex-ministros que garantiram cadeiras no Senado. 


O temor de uma vitória de Lula fez com que um pedaço da onda disruptiva de 2018 atuasse em 2022, impulsionando o bolsonarismo na reta final do primeiro turno, escreveu William Waack em sua coluna no Estadão. Não se pode perder de vista o regionalismo na política brasileira, e ele atuou com força no domingo, ponderou o jornalista. Especialmente nos principais colégios eleitorais. 
 
Os principais “desequilíbrios” vieram de São Paulo e Rio, pois o Nordeste e o Sul se comportaram dentro do esperado — inclusive com a desmontagem do PSDB, um fenômeno de proporções nacionais e que vem na esteira de uma longa decadência. O que o tucanato significou de contraponto e antagonismo ao petismo, no plano do embate político “intelectual”, foi substituído agora por uma tendência conservadora mal definida mas que possui raízes sociais e regionais importantíssimas.
 
Lula continua favorito no segundo turno, mas a disputa será bem mais difícil do que ele e o PT antecipavam. E o governo, mais difícil ainda. Há dúvidas sinceras se o petista entendeu quão vulnerável se tornou a posição do chefe do Executivo e quão longe da realidade está a agitação petista em círculos intelectuais e artísticos. 

"As urnas reabriram uma disputa presidencial que as pesquisas indicavam estar liquidada. Embora o Lula tenha chegado ao segundo turno com vantagem, o eleitor brasileiro recolocou no baralho a carta da reeleição de Bolsonaro", disse Josias de Souza. "Nos próximos dias, vão ser desenvolvidas teorias sobre a incapacidade dos institutos de pesquisa de medir o bolsonarismo enrustido. Mas nenhuma explicação vai ser capaz de superar a mais singela: o povo foi chamado a votar", acrescentou. 

Os dois comitês vão ter que reprogramar a campanha do segundo turno, que terão ânimos distintos. Lula já estava preparando a transição de governo. Bolsonaro, ao contrário, chega ao segundo turno embalado. Ele elegeu 20 senadores; o PL saiu das urnas como a bancada mais exuberante da Câmara; e Bolsonaro teve votação surpreendente no Sudeste, região estratégica.

Se vencer, o petista terá de conviver com um Congresso ainda mais bolsonarista do que o eleito em 2018. Não é só o Senado que terá diversos ex-ministros do governo de Bolsonaro — muitos deles figuras carimbadas nas lives presidenciais dos últimos três anos e meio —, o eleitor também escolheu nas listas do PL, do PP e do Republicanos deputados identificados com a ala mais estridente do atual governo.
 
O Brasil mudou bastante nos últimos 20 anos. Mesmo se for eleito, Lula ainda parece lutando a guerra de ontem.