segunda-feira, 24 de outubro de 2022

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ATUALIZAÇÃOA resistência armada de Roberto Jefferson à prisão descortinou uma visão antecipada da invasão do Capitólio versão tupiniquim, e forçou o Bolsonaro a repetir na sabatina da Record, horas depois da rendição do criminoso, o que havia anotado nas redes sociais: "É bandido". Ecoando ataques do mandatário a magistrados, o pajé do PTB firmou-se como adepto da tese presidencial de que "o povo armado jamais será escravizado", mas atirou prematuramente, num instante em que o presidente tenta virar votos para não ter que virar a mesa. Na mesma postagem em que repudiou as granadas e os tiros, Bolsonaro atacou os "inquéritos sem nenhum respaldo na Constituição". Criticou Jefferson por chamar Cármen Lúcia de prostituta, mas atacou a censura imposta pelo TSE à Jovem Pan, com o voto da ministra. Tenta tomar distância de Jefferson, acomodando no colo de Lula o delator e beneficiário da corrupção do mensalão, mas segue dizendo que as FFAA estão buscando "possíveis fraudes" em urnas que jamais foram fraudadas. Quer dizer: mesmo ciente de que precisa fazer pose de moderado, o presidente manuseia retoricamente as mesmas armas de Jefferson.

A censura é um câncer e como tal pode gerar metástase. Gazeta do Povo foi proibida de publicar que Lula e Daniel Ortega são aliados políticos e admiradores um do outro. Por achar que isso poderia lhe custar votos, o petralha recorreu ao tribunal e foi prontamente atendido. A partir daí o câncer se espalhou pela Jovem Pan  que puxa o saco do candidato à reeleição de forma acintosa, mas daí a ser proibida de falar sobre os processos e as condenações de Lula por corrupção e lavagem de dinheiro vai uma longa distância. É como se não tivesse existido a Lava-Jato ou as férias forçadas de 580 dias que o demiurgo de Garanhuns gozou em Curitiba, ou, ainda, a devolução em massa de dinheiro roubado. 

Nunca se viu numa eleição brasileira — nem mesmo durante o AI-5 — atos de ditadura como os que vêm sendo praticados neste momento pelo alto Poder Judiciário, anotou J.R. Guzzo. Em outras palavras, a Justiça Eleitoral está agindo abertamente a favor de um candidato em detrimento do adversário. 

Ainda segundo Guzzo, montou-se uma colossal operação de fingimento para salvar o Brasil do “autoritarismo”. A metástase transbordou do seu foco inicial não apenas quanto aos órgãos de imprensa perseguidos pelo TSE, mas também em relação aos assuntos censurados. O presidente da corte eleitoral e seus aliados proíbem a exibição de vídeos em que Lula diz ”ainda bem” que “a natureza” nos mandou a Covid — assim as pessoas aprendem a “importância do Estado”. 

É proibido dizer que Lula foi o mais votado nas penitenciárias, e que, na prática, o PT votou contra o Auxílio Brasil. Nem o ex-decano do STF, ministro Marco Aurélio Mello, pode falar: seus ex-colegas proibiram que ele diga que Lula não foi absolvido em nenhum momento, que apenas teve seus processos “anulados” sem quaisquer menções a provas ou fatos, o que não tem absolutamente nada a ver com “absolvição”. E por aí se vai, com multas de R$ 25 mil por dia para veículos de imprensa ou para jornalistas que não obedecerem de imediato as ordens da censura — um abuso sem precedentes na história da justiça brasileira.

Mudando de um ponto a outro, mesmo em país onde o rabo abana o cavalo e o poste mija no cachorro causa estranheza ver Sergio Moro assessorando BolsonaroNas redes sociais, o ex-ministro disse que reatou com o presidente "pelo Brasil, contra a corrupção da democracia e o projeto de poder de Lula e a favor de um país com o mínimo de integridade".
 
Como juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba, Moro condenou Lula a 9 anos e 6 meses de prisão no caso do tríplex no Guarujá. Quando a sentença foi confirmada pelos desembargadores da 8ª  Turma do TRF-4 (que aumentaram a pena em quase 5 anos), o petista foi preso numa cela VIP em Curitiba.  
Como as eleições gerais de 2018 ocorreram nesse entretempo, não faltou quem acusasse o magistrado de agir de caso pensado, sobretudo depois que ele aceitou o convite do então presidente eleito para integrar seu ministério.
 
Em abril de 2020, Moro desembarcou do governo e acusou o mandatário de tentar interferir na Polícia Federal. "Quando vi meu trabalho boicotado e quando foi quebrada a promessa de que o governo combateria a corrupção, sem proteger quem quer que seja, continuar como ministro seria apenas uma farsa", disse ele. Mas não há nada como o tempo para passar.
 
Moro tinha uma biografia respeitável, estabilidade no emprego, um olho na suprema toga e outro no trono do Planalto. Mas iniciou seu périplo pelos nove círculos do inferno ao trocar a magistratura pela subordinação a Bolsonaro. E o problema com as consequências é que elas sempre vêm depois.

Fritado pelo presidente, Moro fez pose de terceira via; tostado pelo STF, migrou para a condição de antifenômeno eleitoral; esvaziado pelo Podemos, migrou para o UB — e foi forçado a abrir mão da pretensão presidencial para disputar uma vaga de Senador pelo Paraná, que ele efetivamente conquistou.
 
Tomado pelas sentenças que proferiu como juiz, Moro achava que a política era a segunda profissão mais antiga do mundo. Como político, descobriu que ela é muito parecida com a primeira. E se tornou uma cópia carbono do que Alckmin se sujeitou a ser para Lula — a diferença é que o ex-tucano disputa a vice-presidência na chapa do candidato que ele próprio classificou como "o criminoso que quer voltar à cena do crime", enquanto o ex-magistrado reatou com Bolsonaro para não ficar isolado politicamente.
 
Moro continua acusando Lula de mentir, especialmente no que tange aos episódios de corrupção. Mas parece ter mudado de ideia sobre o que via como mentiras do seu mais recente amigo de infância. "Bolsonaro admitiu que nunca defendeu o combate à corrupção e a Lava-Jato. Era só mais um discurso do seu estelionato eleitoral", postou ele em janeiro deste ano. E, três meses depois: "Assim como Lula, Bolsonaro mente. Nada do que ele fala deve ser levado a sério. Mentiu que era a favor da Lava-Jato, mentiu que era contra o Centrão, mentiu sobre vacinas, mentiu sobre a Anvisa e o Barra Torres e agora mente sobre mim. Não é digno da Presidência".
 
Escândalos da carreira política de Bolsonaro também entraram na mira do ex-juiz em determinados momentos: "Sério que, entre um ladrão de um lado e um ladrão do outro, a culpa é do juiz? Entre o petrolão e a rachadinha, não há escolha possível. Precisamos, sim, reformar nosso sistema de justiça para que casos de corrupção não fiquem impunes", postou Moro, quando ainda mirava a Presidência. Mas, de novo, não há nada como o tempo para passar. "No primeiro turno, nós tínhamos nosso candidato, eu defendi o candidato do União Brasil. No segundo turno, eu me coloco claramente contra o Lula e contra o projeto de poder do PT, que querem voltar à cena do crime. Acho isso inaceitável", disse o ex-juiz. Mas há quem veja dente de coelho nesse angu. 
 
De acordo com o portal UOL, Moro negou que esteja buscando um novo cargo numa eventual reeleição de Bolsonaro. O presidente também minimizou a divergência. "Você nunca brigou em casa com marido? Uma briguinha. Acontece, divergências, mas nossas convergências são muito maiores", disse ele quando questionado sobre o assunto.
 
Nas redes sociais, um tuíte em que o ex-juiz critica tanto Lula quanto Bolsonaro voltou a ganhar destaque após o debate do dia 16. Publicada em janeiro, a postagem diz que o presidente "mentiu que era a favor da Lava Jato, mentiu que era contra o Centrão, mentiu sobre vacinas, mentiu sobre a Anvisa e o Barra Torres. Não é digno da Presidência".
 
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