Desde que Gleisi
Hoffmann teve a brilhante ideia de comparar o ex-presidente Lula ao traficante Fernandinho Beira-Mar, pedindo isonomia
para que seu amado líder também pudesse dar entrevistas de dentro da cadeia,
essa relação entrou no debate político. Na quarta-feira, na “Central das Eleições” da GloboNews, o pré-candidato do PDT, Ciro Gomes, deixou implícito um paralelo quando acusou Lula de ter operado “freneticamente” de
dentro da prisão para isolá-lo politicamente, impedindo que o PSB o apoiasse.
Mesmo preso e incomunicável, Lula recebe visitas de políticos, advogados e dublês de políticos e advogados que atuam como meninos-de-recados, ajudando-no a contornar a decisão da juíza da 12ª Vara Federal de Curitiba, que o proibiu de gravar vídeos, dar entrevistas, participar por videoconferência de atos de pré-campanha e comparecer à convenção do PT (como se já não bastassem as regalias que lhe são concedidas, a começar pela sala especial na Superintendência da PF em Curitiba).
Outros criminosos, como Fernandinho Beira-Mar (e Marcinho VP, também citado pela defesa de Lula) se comunicam de dentro dos presídios através de celulares que lhes chegam às mãos clandestinamente. Já o petralha, sozinho numa sala de 15 metros quadrados e sob vigilância constante de agentes da Polícia Federal, não teria como usar um celular se ser flagrado. Aliás, atribui-se a ele um comportamento distinto do ex-governador Sérgio Cabral, por exemplo, que seria arrogante e pretensioso, mesmo na condição em que se encontra. Lula é afável, conversador, e numa dessas conversas teria revelado achar ninguém no PT com condições de substituí-lo e ganhar as eleições (isso vai ao encontro do que eu disse postagens atrás, sobre o molusco jamais ter dado espaço para que outra liderança crescesse a ponto de lhe ofuscar o brilho).
Mas Lula tem mais liberdade que os
bandidos comuns para mandar seus “salves”
— recados enviados para fora da cadeia por líderes de facções criminosas, com a
conivência de visitantes ou mesmo de advogados. Foi através desses “salves” que ele costurou o
isolamento de Ciro Gomes e a
estratégia para forçar o PSB a ficar
neutro na campanha presidencial — o PT apoiará a reeleição do governador Paulo Câmara em Pernambuco em troca do apoio do PSB a Fernando Pimentel na disputa pelo governo de Minas Gerais
(com isso, Marcio Lacerda, candidato
do PSB ao governo mineiro, teve de abandonar a disputa).
Mesmo preso, o criminoso de Garanhuns comanda com mão de ferro seu grupo político —
classificado de “organização criminosa” nas sentenças que o condenaram —, para, como dito linhas e postagens atrás, inibir o surgimento de
novas lideranças que lhe façam sombra. Da cadeia, ele condena
à morte política que se atreve a desafiar suas ordens, da mesma forma como fazia
quando estava solto e comandava a ORCRIM.
Durante a sabatina na Globo
News, na noite da última quarta-feira, Ciro
Gomes ponderou que, mesmo considerando injusta a prisão de Lula, é impossível tê-lo na conta de
“preso político”. Por sua atuação “frenética”, o petista não passa de um político preso tentando se manter no
controle da esquerda — coisa que eu também já disse isso em diversas oportunidades. Mas para não ficar apenas com a minha opinião, transcrevo a seguir o que disse Dora Kramer em sua coluna em Veja desta semana:
Tudo na
abordagem eleitoral do PT de
insistir numa candidatura presidencial legalmente impossível mostra que a sigla
voltou a apostar no quanto pior, melhor — partindo do princípio de que, perdido
por um, perdido logo de uma vez por mil. E nada pior para o país que a eleição
de um brucutu enlouquecido, cuja ascensão ao poder equivaleria à assinatura de
um contrato com o aprofundamento de todas as crises, a quebra da ordem social,
a desorganização da economia e a desestabilização institucional.
O traço
desse cenário caótico não é fruto de exagero, de delírio, muito menos de
posicionamento ideológico. Resulta apenas da soma dos atributos mentais, orais
e gestuais do deputado Jair Bolsonaro,
cuja exibição não deixa a menor dúvida. Faz sucesso? Ora, a figura do rinoceronte Cacareco (Google, juventude!) em
tempos idos também fez, e de lá para cá houve vários campeões de audiência no
quesito voto inútil nas eleições. Uns eleitos, outros apenas fermento no índice
de nulos.
Isso dito,
não é Bolsonaro o foco aqui. Ou
melhor, é e não é, mas vamos adiante. O tema mesmo é a rota escolhida pelo PT nesta eleição, um caminho rumo ao
abismo. O partido, ou a parte que segue Lula
(a outra existe, mas só sussurra ou simplesmente se cala), optou pelo suicídio.
Não elegerá o presidente, embora faça de conta que isso não acontecerá por obra
das “forças do atraso”. Não pode, por causa da candidatura fantasma,
organizar-se nos estados. Não articula alianças política e eleitoralmente
eficazes e, portanto, tende a eleger poucos parlamentares no âmbito nacional e
estadual.
Candidaturas
majoritárias — a presidente, governador e senador — impulsionam a eleição dos
representantes nos pleitos proporcionais tanto ao Congresso quanto às
assembleias legislativas. Na disputa pela Presidência, Lula se fará procurador de alguém que poderá ser Jaques Wagner, Fernando Haddad ou outrem para ficar ali fingindo que joga a sério.
Como só pretende definir o delegado(a) aos 45 minutos, este(a) não terá tempo
nem autoridade para estruturar bons palanques estaduais. Como consequência, o PT tende a eleger bancada parlamentar
ínfima, ficando, assim, relegado à irrelevância do ponto da influência política
sobre o próximo governo. Considerando-se que tal estratégia não resulta de burrice,
de ingenuidade nem de desconhecimento de causa por parte de Lula, sobra uma hipótese: extinta a
relevância institucional do coletivo, restaria ao partido a tarefa de sustentar
o mito com base na fantasia da vítima do “sistema”.
Daí que Lula
joga o partido ao naufrágio a fim de
sobreviver na condição de uma ilha de excelência regressiva a ser resgatada das
cinzas, dando de ombros à própria responsabilidade na deflagração do incêndio.
Levando-se em conta que a eleição de Bolsonaro
seria a garantia do caos, não seria de todo ruim (ao contrário, seria ótimo)
para o PT a eleição daquele que consolidaria a falência geral a fim de que o
embuste pudesse se travestir de fênix regenerada e injustamente castigada.
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