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sexta-feira, 9 de agosto de 2019

A APROVAÇÃO DA PEC PREVIDENCIÁRIA, MAIS SOBRE LULA EM CURITIBA, A VISÃO BITOLADA DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA


A votação em segundo turno da reforma da Previdência foi eclipsada pelo decisão da juíza federal Carolina Lebbos, que, na última quarta-feira, a pedido da PF, determinou a transferência de Lula para "um presídio em São Paulo" (detalhes na postagem anterior). Mas o fato é que no final da noite da mesma quarta-feira, após quase mais de nove horas de debates, a Câmara rejeitou os oito destaques apresentados pela oposição, que buscavam retirar alguns pontos do texto aprovado na madrugada anterior. O presidente da Casa, Rodrigo Bolinha Maia (ou Botafogo, como o deputado figurava nas planilhas do departamento de propinas da Odebrecht), agradeceu aos partidos aliados e disse que aprovação do texto foi consequência de um "trabalho coletivo" — e com toda razão: se dependesse de Bolsonaro... Enfim, o texto seguirá para o Senado, onde deve começar a tramitar na próxima semana e, se tudo correr bem, ser aprovado em dois turnos antes do final de outubro.

O mercado financeiro reagiu de forma positiva à aprovação do texto e à rejeição dos destaques. O índice Bovespa se recuperou da queda da última terça-feira e iniciou a quinta em alta (no momento em que estou concluindo este posts, o B3 está em alta de 1,25%, a mais de 104 mil pontos). Vale lembrar que a instabilidade do mercado se deveu em grande medida à guerra fiscal entre EUA e China, mas, durante a madrugada de ontem, o governo chinês anunciou dados surpreendentemente bons para sua balança comercial, com crescimento das exportações na casa dos 3% em julho em relação ao mesmo mês de 2018, ante previsões de uma queda de 2%. Os EUA também ofereceram algum alívio aos investidores, já que o presidente do Federal Reserve de Chicago sinalizou a possibilidade de um novo corte na taxa de juros norte-americana, após a redução anunciada na semana passada.

Na Europa, o Banco da França anunciou em sua pesquisa de julho que a segunda maior economia do continente pode ter acelerado seu crescimento. Segundo análise da revista Exame, são fagulhas de boas notícias, mas às quais os investidores devem se agarrar após a leva de decepções dos últimos dias. No Brasil, a aprovação sem alterações do texto base da reforma da Previdência na Câmara desanuvia em parte as incertezas para a Economia, mas atenções agora se voltam para o Senado, onde um grupo de parlamentares fala em trazer de volta a capitalização, em retirar as isenções e em incluir estados e municípios no projeto. A ver.

Ainda sobre a decisão do STF sobre a transferência de Lula, cabe um contraponto ao que eu disse no post anterior: na avaliação de Merval Pereira, fizeram bem os ministros em manter o condenado preso em Curitiba. Não tinha cabimento o pedido da defesa e do PT, para que Lula fosse libertado devido à decisão da juíza federal Carolina Lebbos, responsável pela execução penal do ex-presidente petralha pelo caso do tríplex.

É bom lembrar que Zanin e companhia já haviam pedido anteriormente a transferência do petista para São Bernardo do Campo, onde ele ficaria perto da quadrilha, digo, da família, e aproveitaram a autorização de sua transferência para tentar, mais uma vez, libertar o criminoso — e, mais uma vez, não obtiveram sucesso, como comprova o placar de 10 a 1, ainda que  o único voto discordante — do ministro Marco Aurélio, para quem o recurso deveria ter sido encaminhado ao TRF-4, que decretou a prisão em segunda instância — me pareça o mais adequado à situação.

Vale lembrar, também, que a legislação brasileira não contempla réus condenados, que estão cumprindo pena, com o direito à prisão especial: ex-governadores, ex-ministros, deputados, senadores e distintíssima companhia estão todos em prisão comum, inclusive os que ainda não foram condenados. Mas o caso de Lula é uma situação sem precedentes. Collor e Dilma foram penabundados do Planalto, mas mantiveram as regalias inerentes à condição de ex-presidentes, como assessores e carros à disposição — que Lula só perdeu quando foi condenado em segunda instância. 

Dada a possibilidade de esses dois ex-presidentes (além de Michel Temer) serem condenados e passarem a cumprir pena, talvez esteja na hora de discutir esse tipo de privilégio à luz do preceito constitucional de que todos são iguais perante a lei. É certo que nosso sistema prisional é ultrapassado, que os presídios estão superlotados e que a ressocialização dos presos é uma balela. Mas a prova provada de que a iniquidade campeia solta em nossa sociedade é fato de o maior líder populista surgido nos últimos tempos — e seus abilolados apoiadores — considerar que ir para uma prisão comum é uma tentativa de aniquilá-lo. Por outro lado, num país em quase 7% da população (cerca de 15 milhões e brasileiros) acreditam que a terra é plana, não se pode esperar que o exercício intelectual seja o esporte nacional.

Se o chanceler Ernesto Araújo — que, a exemplo de Bolsonaro e respectiva prole, bebe da sabedoria do escritor, ideólogo e ex-astrólogo Olavo de Carvalho — tivesse escutado uma explanação do então presidente Lula, não teria dúvidas de que a Terra é redonda. Enquanto o guru de festim afirma que ainda não encontrou explicações cientificas convincentes de que a terra seja redonda, embora advirta que não se debruçou detalhadamente sobre o tema, Lula explicou: “Freud dizia que havia várias coisas que a humanidade não controlaria. Uma delas eram as intempéries. Essa questão do clima é delicada por quê? Porque o mundo é redondo. Se o mundo fosse quadrado, ou retangular, e a gente soubesse que nosso território está a 14 mil quilômetros de distância dos centros mais poluidores, ótimo, vai ficar por lá. Mas como o mundo gira, e a gente também passa lá embaixo nos lugares mais poluídos, a responsabilidade é de todos”. Nem Dilma teria feito melhor.

Para concluir: Dias atrás, o porta-voz da presidência afirmou que os filmes financiados pela Ancine devem ter o espírito cristão, que é o da sociedade brasileira. Mas é impensável achar que o Estado só pode financiar filmes que correspondam ao pensamento do presidente. O país não pode ser liderado por uma visão personalista e voluntarista como a de Bolsonaro, que não tem parâmetros, e sim interesses pessoais. Ele vive em torno da família e dos amigos, e quem não está nesse grupo é visto como fora do padrão, não confiável. Sobre o comportamento do presidente, um texto de Rodrigo Constantino fecha esta postagem com chave de ouro:

As redes sociais deram voz aos idiotas de todos os tipos, perfis e ideologias. Andando em bando ou no anonimato, eles se sentem confortáveis para disseminar seu ódio, extravasar seu recalque, transformar sua mediocridade pessoal em arma contra todos aqueles que se mostram superiores, independentes, com autoconfiança.

Anos de petismo produziram um sentimento, compreensível, de revolta profunda, alimentando um desejo de vingança. No encontro entre as redes sociais e esse sentimento difuso, criou-se o fenômeno do bolsolavismo, uma “direita” que se define basicamente por aquilo que odeia, a esquerda. Não há desejo de construção, mas sim de destruição. E como se parecem, nos métodos, com aquilo que pretendem destruir!

Ao perceber isso, muitos liberais e conservadores foram se afastando do governo Bolsonaro. Afinal, trata-se de um pacote: para levar Guedes é preciso levar também essa gente que baba de ódio e quer guerra permanente contra os inimigos — todos aqueles que não aderem totalmente ao bando. O governo Bolsonaro, porém, não é sua militância olavete nas redes sociais. Mas quem conhece essa turma tem calafrios só de imaginar sua crescente influência no governo.

O receio com o autoritarismo, portanto, é legítimo. Não é “fascismo imaginário”, como alguns alegam. É projeção desse grupo se alastrando e tomando conta do todo, inclusive jogando para escanteio aqueles mais moderados e pragmáticos que insistem em lutar pelo país em meio aos boçais. Eles se acham “machões”, mas não passam de brutamontes truculentos sem qualquer noção do que seja conservadorismo.

quinta-feira, 2 de maio de 2019

LULA, VOLTAIRE, VENEZUELA E UMA PITADA DE OPINIÃO



Todos têm o direito a suas opiniões. É certo que algumas não valem sequer o trabalho de lhes dar o devido destino — que é a lata do lixo —, e que o fato de você, eu ou quem quer que seja termos nossos pontos de vista não nos dá o direito de impô-los a terceiros. 

Posso não concordar com nenhuma das palavras que você disser, mas defenderei até a morte o seu direito de dizê-las”. A dar por verdade o que informa o livro They Never Said It: A Book of Fake Quotes, Misquotes, and Misleading Attributions, Voltaire jamais proferiu essa célebre frase; ela teria sido criado pela escritora inglesa Evelyn Beatrice Hall e expressa na biografia The Friends of Voltaire, de 1906, para resumir o que o filósofo francês pensava sobre o direito de livre expressão. Eu também penso assim, mas deixo claro que defenderei o seu direito de falar o que entender até a sua morte, não a minha.

Na última quarta-feira, diante do que acontecia na Venezuela, próceres petistas do quilate da deputada Gleisi Hoffmann, presidente nacional do partido, do senador Humberto Costa, do deputado Paulo Pimenta e da secretária de Relações Internacionais Mônica Valente assinaram uma nota oficial afirmando que não há ditadura naquele país; o que há por lá é uma "tentativa de golpe levada a cabo pela oposição da direita golpista e antichavista".

Observação: Como se os blindados que atropelaram manifestantes nas ruas de Caracas fossem fruto da imaginação coletiva ou de um efeito especial produzido nos estúdios de Hollywood. Para essas sumidades, o fato de Maduro ter sido reeleito em 2018 numa votação contestada e tisnada pelas fraudes, o pleito ter sido antecipado e os principais opositores do regime, despachados para a prisão é uma questão de somenos.

Na abalizada opinião dos devotos da seita comandada pelo presidiário mais famoso do Brasil, os golpistas tentam há anos derrubar o governo democraticamente eleito do Partido Socialista Unido da Venezuela, mas fracassam por causa do apoio que Maduro e seu governo têm junto às pessoas, após anos de políticas voltadas ao bem-estar da população e contrárias à exploração imperialista e das elites locais. Essa mesma caterva — ou parte dela — repudiou a decisão do STF que reduziu a pena imposta a Lula pelo TRF-4 (de 12 anos e 1 mês para 8 anos, 10 meses 20 dias) e a cifra de 31 milhões de reais a ser paga por ele, entre multa e reparação de danos, para menos de um décimo do valor. Na visão dos esquerdopatas, a justiça só seria feita se o molusco abjeto fosse inocentado e libertado. Em nota, o comitê Lula Livre, montado para organizar a grita em favor do presidiário mais caro da história deste país, afirmou que “a única deliberação cabível era a anulação do julgamento que condenou injustamente o ex-presidente da República”, e que “de maneira combinada, fazendo vistas grossas aos fatos e às provas”, os desembargadores da 5ª Turma decidiram se manter no terreno da perseguição política”. Durma-se com um barulho desses!

Segundo a revista eletrônica Crusoé, se Lula conseguir a progressão do regime, ele e os seguidores da sua seita diabólica vão sustentar a tese de que isso se deveu à pressão popular, e que ele teria ido para a cadeia por lutar pelos menos favorecidos — e não porque, em três etapas diferentes, oito magistrados acolheram a acusação de que a empreiteira OAS reformou um apartamento de três pavimentos para o ex-presidente como compensação por vantagens que obteve em negócios com o estado. O slogan “Lula livre” ganharia novos sentidos com a mudança, por deixar a estrela petista um pouco mais perto da porta de saída da cadeia e da volta à arena política, ainda que a sentença só permita que o salafrário volte a disputar eleições em 2035, quando, se ainda andar pelo mundo dos vivos, terá 89 anos. Aliás, na entrevista que concedeu à Mônica Bergamo, da Folha, e a Florestan Fernandes Júnior, do El País, sua insolência declarou que já viveu 73, anos que poderia ter morrido no lugar do neto Artur, de 7 anos. Pois é, nisso concordamos; foi pena que... enfim.

O petralha disse que dorme todas as noites com a consciência tranquila, reafirmou sua inocência e criticou seus julgadores, em especial o procurador federal Deltan Dallagnol e o atual ministro da Justiça, Sérgio Moro. "Sei muito bem qual lugar que a história me reserva. E sei também quem estará na lixeira". Em outro trecho da entrevista, declarou que pode ficar preso cem anos (pelo visto, dentre outros desvarios o cara se acha eterno), mas "não trocará sua dignidade pela liberdade". Isso nos leva a perguntar de que dignidade estamos falando, ou por outra, que direito tem de falar em dignidade alguém que durante a ditadura militar (aquela que agora sabemos jamais ter existido) não hesitou em dedurar companheiros em benefício próprio, que como sindicalista conclamava o fim das greves após se reunir a portas fechadas com os empresários, que como presidente deste arremedo de república se serviu do cargo para se locupletar, enganando, ludibriando e mentindo a mais não poder, que institucionalizou a cleptocracia e comandou o maior esquema de corrupção da história do Brasil, Dignidade, cara-pálida? Convenhamos que temos um Judiciário medíocre — aliás, onde já se viu presidiário dar entrevista? —, mas ainda não a ponto de considerar dignidade como crime passível de reclusão

Ao comentar a entrevista de Lula aos jornais Folha de S. Paulo e El País, o jornalista,William Waack disse que, mesmo depois de um ano preso e de ter tido amplo acesso à Justiça, o ex-presidente continua repetindo o batido ramerrão de que é vítima de um complô das elites. “É a história de sempre, de ser alvo de algum sujeito oculto que o impede de, no final, cumprir sua missão quase messiânica de redentor do povo brasileiro”, afirmou. Waack também disse que, se ainda existir uma capacidade de oposição do PT, ela está no Legislativo e não nas ruas, onde o poder de mobilização do partido foi visivelmente reduzido. “A figura de Lula tem uma dimensão trágica, ele foi eleito numa onda de popularidade que coincidiu com um período na economia mundial de enorme prosperidade, o que provavelmente não se repetirá nos próximos 40 anos, mas o que o lulopetismo conseguiu foi entregar um país imerso na sua pior crise econômica e moral”.

Observação: No dia seguinte à redução da pena de Lula no STJ, o juiz federal Luiz Antônio Bonat, atual responsável pelos casos da Lava-Jato em Curitiba, deu prazo de oito dias para que defesa e acusação apresentem suas alegações finais nos recursos contra a condenação em primeira instância de Lula no processo do sítio em Atibaia, no qual o petralha foi condenado pela juíza substituta Gabriela Hardt a 12 anos e 11 meses de prisão. Com uma nova condenação em segunda instância, o réu não poderia sequer pleitear a progressão para o regime semiaberto. A fábula da pressão popular que fez o sistema lhe dar um pouco mais de liberdade cairia por terra, e o movimento “Lula livre” deixaria de ser um brado de que ele estaria se preparando para voltar à arena política, para continuar a ser o slogan repetido pela vigília montada nos arredores da Superintendência da PF em Curitiba. E, se entoado em debates políticos onde não houvesse apenas militantes do PT, sempre haverá o risco de alguém repetir o que disse o senador Cid Gomes no segundo turno da campanha do ano passado, quando foi vaiado ao pedir mais reflexão aos petistas: “Lula está preso, babaca.

Quando questionado sobre a corrupção petista, o ex-presidente presidiário respondeu: “Ela (a corrupção) pode ter havido”. Isso significa que, para ele, a condenação de alguns dos principais dirigentes petistas (inclusive do próprio Lula), de vários tesoureiros do partido e de diversos políticos que de uma forma ou de outra estavam ligados a governos petistas não é suficiente para caracterizar a corrupção petista. É difícil imaginar o que mais seria necessário para que o líder máximo do PT finalmente admitisse os crimes cometidos por ele e seus correligionários — primeiro passo para provar sua regeneração. Mas Lula ainda acha que é preciso uma “prova” e que ele seja julgado “em função das provas”. É como se os oito juízes que já o julgaram e o condenaram por unanimidade até agora, em três instâncias judiciais, fossem todos despreparados ou, pior, mancomunados para prejudicá-lo e, por extensão, aos pobres do País. Para Lula, aliás, a “farsa” de seu processo foi “montada no Departamento de Justiça dos Estados Unidos”. Com o passar do tempo, a narrativa lulopetista para as agruras do demiurgo de Garanhuns vai adquirindo contornos de fábula — ainda mais quando diz que combater a corrupção é uma marca do PT.

Lula tampouco aceita fazer qualquer reflexão sobre seus erros e os do PT, que custaram o isolamento do partido mesmo entre as esquerdas. Ao contrário: o único “erro grave” que admite ter cometido foi o de não ter feito “a regulamentação dos meios de comunicação” quando esteve no governo. Em português simples, se a imprensa tivesse sido “regulada” um eufemismo nada sutil para censura e pressão —, o parteiro do Brasil Maravilha e sua gangue não estariam sofrendo todos esses dissabores. Para Lula, é preciso “fazer uma autocrítica geral neste país”, em razão “do que aconteceu em 2018 na eleição” ou seja, quem precisa refletir sobre seus erros é o eleitor brasileiro, e não o PT. O que não pode é este país estar governado por esse bando de maluco, disse aquele que legou ao Brasil um desastre chamado Dilma Rousseff, responsável por dois anos de recessão e pelo colapso das contas públicas, e o mesmo que entregou o patrimônio nacional a quadrilhas de corruptos e a empresários desonestos.

Lula e o PT ainda são forças políticas consideráveis e poderiam ser importantes para a construção de uma oposição forte e atuante — o que é essencial ao bom funcionamento da democracia. Mas a irresponsabilidade e o espírito autoritário do lulopetismo impedem que o ex-presidente e seus devotos aceitem a democracia quando esta não lhes favorece, seja na forma do voto na urna, seja na forma de uma condenação judicial, mesmo que, em ambos os casos, tenham sido respeitados todos os trâmites estabelecidos na lei. Ao mesmo tempo que diz respeitar “o voto do povo” e que “o povo não é bom só quando vota em mim”, Lula colocou a eleição em dúvida ao dizer que foi “atípica”, pela “quantidade de mentiras” disseminadas pelos adversários como se os petistas não usassem essas mesmas armas, desde sempre. Para Lula, que fez sua carreira dividindo o País entre “nós” e “eles”, nunca se viu “o povo com tanto ódio nas ruas”. Assim, Lula continua a apostar na polarização a mesma estratégia da militância que sustenta o presidente Bolsonaro. Ou seja, os dois extremos ganham, enquanto o País perde.

Augusto Nunes pondera que, com o passar do tempo, a narrativa lulopetista para as agruras do demiurgo de Garanhuns vai adquirindo contornos de fábula. A entrevista do chefão petista — limitada pelo ministro Ricardo Lewandowski a dois veículos de comunicação — põe em dúvida a capacidade do sistema prisional de ressocializar os detentos. Mesmo depois de um ano na cadeia, o pseudo pai dos pobres deu todos os sinais de que continua o mesmo: além de não reconhecer os crimes que cometeu, julgando-se um preso político, não foi capaz de admitir sequer a participação da fina flor do lulopetismo nos maiores escândalos de corrupção da história brasileira, assim como não admitiu o envolvimento ativo do PT na ruína econômica, política e moral do País. Ou seja, é o Lula de sempre. Mas basta de falar nessa gentalha.

Voltando ao impasse na Venezuela, comungo da opinião de Merval Pereira, para quem o que está em jogo, agora, é a disputa entre Estados Unidos e Rússia. A Rússia vai tentar manter Maduro no poder porque não quer deixar um governo simpático aos Estados Unidos ser eleito; os americanos vão continuar pressionando, usando todos os meios para depor o tirante de merda do cargo. A disputa não está mais na mão de Maduro, nem de Guaidó. Mesmo que Maduro vença este primeiro movimento para derrubá-lo e mantenha o poder dos militares, como e com que dinheiro ele irá reerguer o país?

Encerro com uma publicação de Carlos Brickmann em sua coluna, sob o título “Quem ganha, quem perde”:

Guaidó, apoiado por Brasil, Estados Unidos e todos os países próximos, ou Maduro, apoiado por Cuba, Rússia e Bolívia? Para os venezuelanos, neste momento, tanto faz: se Maduro continua, mantém sua política maluca, que conseguiu a façanha de transformar um dos maiores produtores mundiais de petróleo num país onde falta tudo; se Guaidó o derruba, mesmo que melhore dramaticamente o desempenho do Governo, levará bom tempo para reerguer a economia, e nesse tempo terá de enfrentar a desconfiança da população, na qual despertou esperanças que em curto prazo não serão satisfeitas. E o confronto, quem ganha? 

Este colunista não se atreve a fazer qualquer previsão: se Maduro se manteve até agora no poder, apesar da calamitosa administração, é porque tem apoiadores fiéis; se Guaidó está solto, embora se tenha proclamado presidente da República, é porque tem apoio suficiente para que Maduro não consiga prendê-lo. A qualquer momento pode ocorrer um desfecho (ou não); não adiantaria sequer consultar uma lista de chefes militares, porque, conforme evolui a situação, muda a posição de cada chefe. Em 1964, o presidente João Goulart tinha a lealdade pétrea do general Amaury Kruel, seu amigo de longa data; e foi Kruel, em decisão de última hora, quem derrubou seu Governo (a notícia era tão improvável que os jornais a confirmaram várias vezes antes de publicá-la). Quem se diz aliado nem sempre o é. Na Venezuela, é melhor esperar mais para errar menos.

sábado, 30 de março de 2019

NÃO É ASSIM QUE FARÃO A LAVA-JATO MORRER - Texto de J.R. Guzzo


Antes do texto de Guzzo, faço um breve resumo da semana:

A sequência de desinteligências que vêm coroando a relação entre os chefes do Executivo e do Legislativo mostra como estamos “bem representados”. Uma PEC que engessa o Orçamento, que dormitava nos escaninhos da Câmara desde 2015, é aprovada em dois turnos em questão de minutos (o que demonstra que, quando quer, essa cambada faz), no mesmo dia em que nosso presidente vai ao cinema durante o expediente (para assistir a uma produção de viés religioso), estabelece como prioridade transformar o dia 31 de março em data cívica comemorativa (que depois ele disse não se tratar de “comemoração”, mas de “rememoração”) e retribui os coices do presidente da Câmara e de uma chusma de parlamentares.  

Rodrigo Maia havia prometido ao ministro-chefe da Casa Civil não deixar prosperar pauta-bomba no Congresso, não usar a presidência da Câmara instrumento de chantagem de partidos e não dar andamento a pedidos de impeachment contra o mandatário do Planalto — quanto ao resto, Bolsonaro que desse seu jeito —, mas a tal PEC surgiu do nada e foi votada e aprovada a toque de caixa. Curiosamente ela foi vista tanto como derrota quanto vitória do Planalto pelos analistas políticos — muitos dos quais há tempos deixaram de fazer sentido, mas isso é outra conversa.

O fato é que, em uma hora, numa votação relâmpago, os deputados aprovaram a medida em dois turnos, com ampla maioria. Para conseguirem essa rapidez, deram sinal verde a um requerimento de quebra de interstício (observância do intervalo regimental de cinco sessões, necessário para a aprovação de propostas de reforma constitucional na Câmara). Foram 448 votos em primeiro turno e 453 no segundo, havendo votos favoráveis até mesmo no próprio PSL (partido de Bolsonaro). Na prática, a ideia dos deputados é lançar um “pacote de maldades” para deixar o Executivo refém do Congresso, mas a avaliação preliminar dos especialistas da área econômica é de que, mesmo que a PEC seja aprovada no Senado em dois turnos, a mudança não valerá para 2019, uma vez que o Orçamento para este ano já foi aprovado e está em execução. Tecnicamente, o orçamento impositivo só valeria para os gastos do governo a partir do próximo ano, e para isso a mudança teria de ser incorporada à Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2020, que será elaborada ainda neste exercício. Mas isso também é outra conversa.

Na quinta-feira, Bolsonaro disse que a troca de críticas públicas com o Legislativo foi superada, e o presidente da Câmara sinalizou que quer virar a página do entrevero. Maia se reuniu em um café da manhã com Sergio Moro, com quem teve desavenças na semana passada, e depois almoçou com Paulo Guedes, com quem discutiu a novela da reforma da Previdência (aliás, o deputado Marcelo Freitas, do PFL, foi escolhido relator do projeto na CCJ da Câmara).

Por essas e outras, depois de quebrar a barreira do 100.000 pontos no último dia 18, com o mercado estimulado pela perspectiva de a reforma previdenciária ser resolvida ainda no primeiro semestre e produzir resultados expressivos, o Ibovespa despencou quase 10 pontos percentuais ao longo dos dias subsequentes, e dólar tornou a bater na casa dos R$ 4. Da última quinta-feira para cá, porém, depois que os chefes do Executivo e do Legislativo levantaram a bandeira branca, a coisa parece ter entrado nos eixos; no instante em que escrevo este texto, a Bolsa volta a encostar nos 96.000 mil pontos, e o dólar apresenta uma leva queda). A ver como a coisa se comporta na próxima semana.

Com a palavra, J.R. Guzzo:

O Brasil está ficando um país positivamente arriscado para presidentes da República. Já não é normal, para o padrão médio de moralidade política vigente no mundo civilizado, haver um ex-presidente na cadeia; dois ex-presidentes presos ao mesmo tempo, então, já é coisa para se pensar em livro de recordes, por mais temporária que possa ser uma situação dessas. 

O fato é que Michel Temer, acusado pela Lava-Jato de ter transformado o Estado brasileiro numa “máquina de arrecadar propinas” e alvo de dez inquéritos (e na última sexta-feira se tornou réu num deles) por ladroagens variadas, entrou no camburão da polícia e foi trancafiado no xadrez como Lula, em mais um capítulo desta espantosa crônica do crime na qual está enterrada até o fundo da alma a vida política do Brasil. Juntou-se a ex-governadores como o incomparável Sérgio Cabral, do Rio de Janeiro, seu sucessor, que conseguiu subir na vida com o nome de “Pezão”, de Beto Richa, do Paraná, há pouco encarcerado pela terceira vez seguida, e Marconi Perillo, de Goiás, que entra e sai da prisão. Isso sem contar um rico fricassée de ex-ministros ─ o último deles, justamente, Wellington Moreira Franco, parceirão de Temer em seu governo, e motivo de perplexidade geral entre os políticos por não ter sido preso antes. Ainda estava solto? A propósito: e o próprio Temer, o que estava fazendo fora de uma cela? É o Brasil de hoje.

A situação de Temer, é verdade, não é tão ruim quanto a do gênio político a quem devemos sua criação; por enquanto não foi julgado, ao contrário de Lula, que já está condenado em duas instâncias e cumpre pena, com 25 anos de cadeia no lombo. Mas é uma desgraça de primeiríssima classe ─ para ele, e, indiretamente, para todos os delinquentes que operam há anos na vida pública nacional. Estavam achando, talvez, que a Lava-Jato tinha mais ou menos parado em Lula? Se pensaram nisso pensaram horrivelmente errado. Pode ter até havido essa esperança, estimulada pela incansável ala pró-crime do STF, mas a realidade está apresentando um futuro soturno para eles todos. Figuras como Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e companhia fazem o que podem, mas também não são de ferro; seus protegidos, positivamente, não ajudam. Estão exigindo assistência permanente dos protetores, numa base quase diária. Gilmar, por exemplo, solta esse Beto Richa e até inventa um “salvo conduto”, proibindo que a polícia chegue perto dele. Mas o homem dá um trabalho insano: consegue ser preso de novo, o que vai obrigar Gilmar e seus sócios a mandarem soltar mais uma vez. E aí: vai ser assim pelo resto da vida? Quantas vezes terão de tirar o cidadão da cadeia? Cinco? Sete? Dez? 

É a mesma situação, sem tirar nem pôr, dos demais políticos dessa raça. É claro que cada caso é um caso, mas que ninguém se iluda: não haverá a menor chance de sossego, inclusive para Temer, enquanto não matarem a Lava-Jato. Estão fazendo o diabo para isso, mas não estão conseguindo. Essa é a vida real. O resto é barulho na mídia e no picadeiro da politicada, que ficam cada vez mais indignados, mas não conseguem evitar uma única e escassa prisão.

É um problemaço. Agora não é mais o PT, apenas, que está correndo da polícia. A coisa ficou preta para o PSDB e o MDB. A quem apelar? Quem vai fazer a campanha “Temer Livre”? Quem tiraria 1 real do bolso para ajudar Temer em alguma coisa? E Moreira Franco, então? Pelo jeito, estão todos reduzidos a contar com o apoio dos “garantistas”, que se escandalizam com o que chamam de ataque “à atividade política”, mas não decidem nada. Ou com a ajuda do deputado Rodrigo Maia, contraparente de Moreira Franco, inimigo do projeto anticrime de Sergio Moro e investigado em dois processos por corrupção. Têm apoio na mídia, nos advogados milionários de corruptos, na classe intelectual, etc. Só que ninguém consegue se dar bem defendendo o lado do ladrão; se você tem de ficar a favor de um Paulo Preto da vida, por exemplo, a sua situação está realmente uma lástima. 

Não é assim que farão a Lava-Jato morrer.

quarta-feira, 27 de março de 2019

E LA NAVE VA — PARTE II


Como diz o bordão da BandNews, “em 20 minutos, tudo pode mudar”. Prova disso é que, contrariando todas as expectativas, o desembargador Ivan Athié, presidente da 1ª Turma do TRF-2, antecipou a soltura de Michel Temer e de seus companheiros de infortúnio (clique aqui para ler a íntegra da decisão). O magistrado havia pautado a ação para a sessão desta quarta-feira, mas mudou de ideia: “Mesmo que se admita existirem indícios que podem incriminar os envolvidos, não servem para justificar prisão preventiva, no caso, eis que, além de serem antigos, não está demonstrado que os pacientes atentam contra a ordem pública, que estariam ocultando provas, que estariam embaraçando, ou tentando embaraçar eventual, e até agora inexistente instrução criminal, eis que nem ação penal há, sendo absolutamente contrária às normas legais prisão antecipatória de possível pena, inexistente em nosso ordenamento, característica que tem, e inescondível, o decreto impugnado”. Volto a esse assunto com mais detalhes na próxima postagem.

Em seu depoimento aos procuradores e agentes federais, Temer invocou o direito constitucional de ficar calado. Até aí, nenhuma surpresa: em 2017, quando sua conversa de alcova com o carniceiro bilionário veio a público, o ex-presidente afirmou que “o inquérito no STF seria o território onde surgiriam todas as explicações” e que seria feita “uma investigação plena e muito rápida para os esclarecimentos ao povo brasileiro”. Palavras vazias, como se veria mais adiante, quando as ações desmentiram o discurso e o esforço para barrar o processo ganhou vulto.

Na primeira noite que passou hospedado na PF do Rio, sua excelência rejeitou o jantar. Nos dias seguintes, declinou dos banhos de sol — mas alguém já ouviu falar em vampiro que toma sol? Brincadeira à parte, tivemos, ainda que por poucos dias, dois ex-presidentes presos por corrupção — ainda suposta, no caso de Temer, e confirmada por duas instâncias da Justiça, no caso de Lula. E pelo andar da carruagem, Dilma, que permanece no banco de reservas — ela é ré pelo crime de organização criminosa e foi acusada por Palocci de ter financiado sua eleição em 2010 com dinheiro de uma conta no exterior aberta por Joesley Batista, além de ter cometido crime de obstrução de Justiça ao avisar João Santana e Mônica Moura de sua prisão iminente —, pode ser convocada a qualquer momento para entrar em campo.

Por ter sido decretada dias antes de a Lava-Jato completar 5 anos e uma semana depois de o STF decidir pela competência da Justiça Eleitoral para julgar crimes de corrupção relacionados a outros delitos de natureza eleitoral — em particular, o caixa 2 —, a prisão de Michel Temer e companhia limitada foi vista por muita gente como “retaliação”. O ex-ministro da Secretaria de Governo e principal integrante da tropa de choque palaciana, Carlos Marun, afirmou que o ex-presidente foi pego numa queda de braço entre a Lava-Jato e o STF. E disse mais: “Tem a suspeita de que exista algo por trás disso e que os motivos sejam outros. De que se busque com essa confusão causada com essa decisão inconsequente e ilegal, outros objetivos.” Só não esclareceu quais seriam esses objetivos.

Michel Temer é alvo de uma dezena de inquéritos e foi denunciado pela PGR em três oportunidades. Surpresa, portanto, não foi a sua prisão preventiva, mas o fato de ela não ter sido decretada antes. Retaliação foi a decisão tomada por 6 dos 11 ministros supremos, a despeito de a Justiça Eleitoral não ter estrutura para lidar com ações criminais complexas (fato reconhecido, inclusive, pelo ex-ministro Carlos Velloso, que presidiu o TSE em duas ocasiões). Dizer que a Justiça Eleitoral é mais célere que a Federal e que é possível reestruturá-la para atender às novas demandas, a exemplo do que já se viu em varas federais, é uma coisa, mostrar onde está a varinha de condão capaz de realizar essa mágica é outra.

Observação: Talvez a PGR Raquel Dodge seja a fada que detém tal varinha. Logo após a esdrúxula decisão do Supremo, ela disse que iria mudar a forma de atuação do MP nesses casos. Uma das alternativas que ela cogitou à época era priorizar o pedido de abertura de inquéritos por corrupção, lavagem de dinheiro e outros crimes sobre o de caixa 2, o que remeteria os casos para a Justiça comum; outra, revelada mais recentemente, é solicitar ao TSE que dê poderes aos magistrados federais para atuar em casos eleitorais simplesmente alterando uma das duas resoluções da Corte que tratam da composição da Justiça Eleitoral.

Em casa onde falta o pão, todos brigam e ninguém tem razão. O melhor para a Lava-Jato seria aprovar um projeto de lei que reformasse o Código Eleitoral e neutralizasse essa decisão nefasta do STF. Aliás, uma proposta nesse sentido integra os dispositivos anticrime que o ministro Sérgio Moro enviou ao Congresso — e que vem gerando atritos com o presidente da Câmara, que também é investigado no âmbito da Lava-Jato. A mudança na legislação certamente produziria melhores resultados do que uma CPI para investigar os ministros, ou a apresentação de pedidos de impeachment contra eles a cada julgamento com resultado divergente do esperado ou desejado. Mas não é o que se vê nas redes sociais, infelizmente, onde o número de postagens defendendo o fechamento STF, a intervenção militar no Legislativo e outras bobagens que tais não para de crescer.

É lamentável que os bolsomínions fanáticos sejam ainda mais extremados do que a patuleia ignara, cuja fidelidade canina a Lula e seus asseclas sempre me pareceu desbragada, e sua total impermeabilidade à voz da razão, uma falha genética irremediável. Mas o pior não é isso: Bolsonaro orientou os quartéis a comemorarem o aniversário da revolução de 1964, que deu início a um regime de exceção que durou 21 anos. O núcleo militar do primeiro escalão do Executivo, porém, pede cautela no tom para evitar ruídos desnecessários diante do clima político acirrado e dos riscos de polêmicas em meio aos debates da reforma da Previdência. Enfim, são tempos estranhos, como o ministro Marco Aurélio costuma relembrar sempre que uma oportunidade se lhe apresenta.  
 
A cizânia tomou conta da nossa mais alta corte, onde alas garantista e punitivista se digladiam, ministros tomam decisões monocráticas ao arrepio da jurisprudência pacificada por decisões colegiadas,  promovem bate-bocas de deixar o BBB. Não muito tempo atrás, o ministro Barroso, referindo-se a um colega de toga (que o leitor certamente sabe quem é), afirmou haver no Supremo “gabinete distribuindo senha para soltar corrupto, sem qualquer forma de direito e numa espécie de ação entre amigos”. Isso depois de classificar seu par na corte como uma pessoa horrível, uma mistura do mal com o atraso e pitadas de psicopatia“ e acusá-lo de “desmoralizar o Tribunal”.

Apenas dois ou três ministros celestiais parecem sintonizados com a opinião pública e preocupados com o combate a corrupção. Mas nem por isso devem prosperar bizarrices como a sugerida por Bolsonaro, durante a campanha, de nomear mais 10 ministros “isentos” para fazer frente à banda podre do STF. Por outro lado, deuses do Olimpo do Judiciário podem (e devem) ser investigados e, se for o caso, impedidos e até presos; o que não se admite é buscar soluções não-republicanas para mantê-los na rédea curta. Foi isso que fez Hugo Chávez na Venezuela, até porque o Poder Judiciário costuma ser o primeiro alvo das ditaduras incipientes.     

sábado, 23 de março de 2019

SOBRE A PRISÃO DE TEMER, AS ESTULTICES BOLSONARIANAS... E LA NAVE VA



Temer invocou o direito constitucional de ficar calado durante o depoimento desta sexta-feira e, como eu havia previsto (vide postagem anterior), o desembargador Ivan Athié, conhecido por sua postura garantista, preferiu submeter seu pedido de habeas corpus à 1ª Turma do TRF-2 — que costuma apoiar as decisões do juiz Marcelo Bretas. O recurso deve ser apreciado somente na próxima quarta-feira; até lá, se o imprevisto não tiver voto decisivo na assembléia dos acontecimentos, o emedebista continuará hospedado na sala de 20 metros quadrados, com banheiro privativo, janela, ar-condicionado, sofá, mesa de reunião e frigobar, que era usada até então pelo corregedor da PF do Rio e recebeu uma cama e uma TV para acomodar o visitante ilustre.

Atualização: No STF, Marco Aurélio Mello rejeitou liminarmente (sem analisar o mérito) o pedido de habeas corpus de Moreira Franco, já que fazê-lo, segundo o ministro, implicaria em "queima de etapas", pois há no momento um HC pendente no TRF-2. Restou igualmente prejudicada moção da defesa para o caso ser remetido à Justiça Eleitoral, eis que feito num inquérito do qual Moreira Franco não é parte. Caso o ministro aceitasse a alegação de que a competência é da Justiça Eleitoral e suspendesse as decisões de Bretas, a medida beneficiaria igualmente o ex-presidente Michel Temer.

Segundo Carlos Marun, que visitou o ex-chefe na noite de quinta-feira (o cara é corajoso, pois poderia ter ido buscar lã e sair tosquiado — ou então não sair, mas isso é outra conversa), o "presidente" vem recebendo tratamento digno e respeitoso, mas está acabrunhado e indignado. Para o ex-pitbull palaciano, Temer é uma vítima inocente de uma “queda de braço entre o STF e a Lava-Jato”. Pois é. Lula também é inocente. E eu sou o Coelho da Páscoa.

Fato é que prisão de mais um ex-presidente caiu como uma bomba entre os políticos e foi um prato cheio para a mídia, que mal noticiou a viagem de Bolsonaro ao Chile. Durante a viagem anterior (aos EUA), os jornalistas permaneceram atentos a cada flatulência presidencial, sempre a postos para pintar com cores fortes aquelas cujo aroma mais lhes agradasse. Mas convenhamos que nosso presidente parece ter uma compulsão incontrolável para dar a cara a tapa.

Defender o folclórico muro que Trump insiste em erguer na fronteira com o México, por exemplo, foi lamentável. Tudo bem que em casa alheia não se critica o anfitrião, mas em se tratando de Bolsonaro, que é fã declarado de Trump, os salamaleques excederam em muito a simples diplomacia. E dizer em alto e bom som que "a maior parte dos imigrantes que se mudam para os Estados Unidos tem más intenções" foi (mais) uma péssima escolha de palavras — tanto é que o capitão se retratou na entrevista que concedeu logo depois de deixar a Casa Branca.

Falando em diplomacia, a promoção informal de Eduardo Bolsonaro (que, a exemplo do pai, é admirador incondicional do homem da peruca laranja) a “chanceler de fato” no encontro privado entre os presidentes de cá e de lá levou o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, a dar um piti em público. A cena de chilique, segundo a Folha, ocorreu diante de vários ministros e refletiu a humilhação sofrida pelo “chanceler de direito”. Vai ver que, para Jair Bolsonaro, “relações exteriores” têm a ver com “ficar de fora”. Na avaliação de Josias de Souza, a reclassificação funcional de Araújo — que já se sabia um chanceler atípico, dada a influência do guru Olavo de Carvalho, seu padrinho e ideólogo — fez do ministro não apenas um subministro, mas o sub do sub do sub.

Segundo O Antagonista, militares da ativa resolveram mandar recados a Bolsonaro. Diz Igor Gielow em sua coluna: “Não falo aqui do acordo de salvaguardas para o uso de Alcântara, uma boa medida há muito esperada. É particularmente ridículo ver a esquerda chiar como o Brasil fosse sediar uma base americana de mísseis intercontinentais e esquecer o danoso acordo promovido no governo Lula com a Ucrânia, que só torrou dinheiro. Mas as conversinhas de coxia, com tons de segredo, sobre o que fazer com a ditadura de Nicolás Maduro são de especial preocupação (para ler a íntegra da publicação, clique aqui).

Falando na ala verde-oliva, Dora Kramer faz algumas considerações interessantes. Confira a seguir:

Hoje o conselheiro mais influente do presidente é o general Augusto Heleno, ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, o porta-­voz informal da ala já tida como a mais ponderada do governo e que, embora repudie a caracterização de “grupo dos militares”, é toda composta de altas patentes oriundas das Forças Armadas com atuação bem-vista em setores sociais e oficiais, mas muito criticada nos chamados bolsões radicais do governismo. Na linha de frente, destaca-se o vice-­presidente Hamilton Mourão, com suas declarações públicas de caráter apaziguador em relação a crises e atritos provocados ora por posições do presidente da República, ora por integrante daquela outra ala que numa definição amena poderíamos chamar de polêmica, para não dizer folclórica. Numa tradução simples, o general Heleno atuaria “para dentro” e o general Mourão, “para fora”. Se um aconselha, o outro funciona como uma espécie de corretor de texto do presidente e companhia.

Isso num cenário em que a racionalidade, o bom-senso, a lógica e o rumo a partir do interesse coletivo parecem ter saído de férias. Donde a necessidade de transitar entre essas autoridades para detectar de que maneira o panorama está sendo visto por elas e tentar formular algo próximo das perguntas recorrentes em toda parte: para onde vamos? No que vai dar tudo isso? Ainda é possível reencontrar o eixo a fim de evitar um descarrilamento de consequências fatais? Nessa tarefa é que estão empenhados os setores que chamaremos aqui de oficina de consertos. Eles atuam em duas variantes principais: a adaptação do presidente às suas funções e a recolocação de estruturas e políticas de governo na direção da eficácia objetiva. Nesse tópico, chamado de “ajuste da agenda social ao ponto certo”, cita-se o exemplo do Ministério da Educação, enredado numa barafunda de egos inflados e ideologias equivocadas e afastado de sua função primordial, a de difundir e incrementar o aprendizado, como diz uma das vozes da racionalidade.

Uma correção de rumos é considerada urgente, ainda que seja necessário adotar “diretrizes mais enérgicas”, o que soa como eufemismo para a troca de titulares de algumas pastas nas áreas produtoras de atritos. Isso no limite, porque algumas providências já se notam. Onde? Na questão da Venezuela, em que, sem conflitos, o ministro das Relações Exteriores foi posto de lado. Essa banda de exacerbados é aconselhada a perceber que “comunismo não se combate com comunismo de sinal trocado”. A ideologia, confia a ala ponderada, acabará encontrando o tom certo de expressão.
Sim, mas e o presidente e sua vocação incontrolável para a crise? Aqui, discorda-se do termo “incontrolável”. A ideia é que ele se convença da conveniência do controle. “Com o tempo, haverá a recuperação da saúde física, a contenção do temperamento explosivo e a transposição de uma vida de parlamentar, cuja ferramenta é a fala para uma função regida pelos ditames da boa administração e da sobriedade.” Nesse manual de ajustes se incluiriam os filhos, que, nessa perspectiva, teriam de se voltar para os respectivos afazeres políticos.

É isso que tem sido dito ao presidente. A conferir em que medida ele dará ouvidos.

quinta-feira, 21 de março de 2019

MICHEL TEMER E MOREIRA FRANCO PRESOS NO ÂMBITO DA OPERAÇÃO RADIOATIVIDADE



Foram presos preventivamente na manhã desta quinta-feira, por determinação do juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal do Rio de Janeiro, o ex-presidente Michel Temer, o coronel João Batista Lima Filho e o ex-ministro de Temer e ex-governador do Rio, Wellington Moreira Franco.


Também foi decretada a prisão preventiva da mulher do coronel Lima, seu sócio Carlos Alberto Costa e o ex-presidente da Eletronuclear, Othon Luiz Pinheiro, entre outros. Para quem achava que a Lava-Jato tinha sido ferida de morte pela decisão do STF, aí está a resposta.

Temer é alvo de pelo menos dez investigações e perdeu o foro privilegiado ao deixar a Presidência da República. A ação de hoje é decorrente da Operação Radioatividade, investigação que apurou crimes de formação de cartel e prévio ajustamento de licitações, além do pagamento de propina a executivos da Eletronuclear. Após decisão do STF, o caso foi desmembrado e remetido à Justiça Federal do Rio de Janeiro.

O inquérito que mira o ex-presidente e seus aliados tem como base as delações do empresário José Antunes Sobrinho, ligado à Engevix. Em seu acordo de colaboração, Sobrinho fala sobre pagamentos indevidos que somam 1,1 milhão de reais, em 2014, solicitados pelo coronel Lima e por Moreira Franco, com anuência de Temer, no contexto do contrato da AF Consult Brasil com a Eletronuclear. O total rapinado pelo quadrilhão supostamente chefiado pelo ex-presidente, nos últimos 40 anos, atinge R$ 1,8 bilhão!

A Polícia Federal cumpre um total de oito mandados de prisão preventiva e dois de custódia temporária, 26 de busca e apreensão nos Estados do Rio de Janeiro, de São Paulo e do Paraná e no Distrito Federal. Ao desembarcar do Aeroporto Internacional de Santiago do Chile, o presidente Jair Bolsonaro considerou que a prisão do ex-presidente Michel Temer está relacionada aos acordos políticos. “Cada um responde por seus atos, mas está claro que a política em nome da governabilidade feita no passado não deu certo, não estava correta”.

Com essas e outras, o Brasil já contabiliza dois ex-presidentes presos. Ainda falta a dona Dilma.