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sexta-feira, 9 de agosto de 2019

A APROVAÇÃO DA PEC PREVIDENCIÁRIA, MAIS SOBRE LULA EM CURITIBA, A VISÃO BITOLADA DO PRESIDENTE DA REPÚBLICA


A votação em segundo turno da reforma da Previdência foi eclipsada pelo decisão da juíza federal Carolina Lebbos, que, na última quarta-feira, a pedido da PF, determinou a transferência de Lula para "um presídio em São Paulo" (detalhes na postagem anterior). Mas o fato é que no final da noite da mesma quarta-feira, após quase mais de nove horas de debates, a Câmara rejeitou os oito destaques apresentados pela oposição, que buscavam retirar alguns pontos do texto aprovado na madrugada anterior. O presidente da Casa, Rodrigo Bolinha Maia (ou Botafogo, como o deputado figurava nas planilhas do departamento de propinas da Odebrecht), agradeceu aos partidos aliados e disse que aprovação do texto foi consequência de um "trabalho coletivo" — e com toda razão: se dependesse de Bolsonaro... Enfim, o texto seguirá para o Senado, onde deve começar a tramitar na próxima semana e, se tudo correr bem, ser aprovado em dois turnos antes do final de outubro.

O mercado financeiro reagiu de forma positiva à aprovação do texto e à rejeição dos destaques. O índice Bovespa se recuperou da queda da última terça-feira e iniciou a quinta em alta (no momento em que estou concluindo este posts, o B3 está em alta de 1,25%, a mais de 104 mil pontos). Vale lembrar que a instabilidade do mercado se deveu em grande medida à guerra fiscal entre EUA e China, mas, durante a madrugada de ontem, o governo chinês anunciou dados surpreendentemente bons para sua balança comercial, com crescimento das exportações na casa dos 3% em julho em relação ao mesmo mês de 2018, ante previsões de uma queda de 2%. Os EUA também ofereceram algum alívio aos investidores, já que o presidente do Federal Reserve de Chicago sinalizou a possibilidade de um novo corte na taxa de juros norte-americana, após a redução anunciada na semana passada.

Na Europa, o Banco da França anunciou em sua pesquisa de julho que a segunda maior economia do continente pode ter acelerado seu crescimento. Segundo análise da revista Exame, são fagulhas de boas notícias, mas às quais os investidores devem se agarrar após a leva de decepções dos últimos dias. No Brasil, a aprovação sem alterações do texto base da reforma da Previdência na Câmara desanuvia em parte as incertezas para a Economia, mas atenções agora se voltam para o Senado, onde um grupo de parlamentares fala em trazer de volta a capitalização, em retirar as isenções e em incluir estados e municípios no projeto. A ver.

Ainda sobre a decisão do STF sobre a transferência de Lula, cabe um contraponto ao que eu disse no post anterior: na avaliação de Merval Pereira, fizeram bem os ministros em manter o condenado preso em Curitiba. Não tinha cabimento o pedido da defesa e do PT, para que Lula fosse libertado devido à decisão da juíza federal Carolina Lebbos, responsável pela execução penal do ex-presidente petralha pelo caso do tríplex.

É bom lembrar que Zanin e companhia já haviam pedido anteriormente a transferência do petista para São Bernardo do Campo, onde ele ficaria perto da quadrilha, digo, da família, e aproveitaram a autorização de sua transferência para tentar, mais uma vez, libertar o criminoso — e, mais uma vez, não obtiveram sucesso, como comprova o placar de 10 a 1, ainda que  o único voto discordante — do ministro Marco Aurélio, para quem o recurso deveria ter sido encaminhado ao TRF-4, que decretou a prisão em segunda instância — me pareça o mais adequado à situação.

Vale lembrar, também, que a legislação brasileira não contempla réus condenados, que estão cumprindo pena, com o direito à prisão especial: ex-governadores, ex-ministros, deputados, senadores e distintíssima companhia estão todos em prisão comum, inclusive os que ainda não foram condenados. Mas o caso de Lula é uma situação sem precedentes. Collor e Dilma foram penabundados do Planalto, mas mantiveram as regalias inerentes à condição de ex-presidentes, como assessores e carros à disposição — que Lula só perdeu quando foi condenado em segunda instância. 

Dada a possibilidade de esses dois ex-presidentes (além de Michel Temer) serem condenados e passarem a cumprir pena, talvez esteja na hora de discutir esse tipo de privilégio à luz do preceito constitucional de que todos são iguais perante a lei. É certo que nosso sistema prisional é ultrapassado, que os presídios estão superlotados e que a ressocialização dos presos é uma balela. Mas a prova provada de que a iniquidade campeia solta em nossa sociedade é fato de o maior líder populista surgido nos últimos tempos — e seus abilolados apoiadores — considerar que ir para uma prisão comum é uma tentativa de aniquilá-lo. Por outro lado, num país em quase 7% da população (cerca de 15 milhões e brasileiros) acreditam que a terra é plana, não se pode esperar que o exercício intelectual seja o esporte nacional.

Se o chanceler Ernesto Araújo — que, a exemplo de Bolsonaro e respectiva prole, bebe da sabedoria do escritor, ideólogo e ex-astrólogo Olavo de Carvalho — tivesse escutado uma explanação do então presidente Lula, não teria dúvidas de que a Terra é redonda. Enquanto o guru de festim afirma que ainda não encontrou explicações cientificas convincentes de que a terra seja redonda, embora advirta que não se debruçou detalhadamente sobre o tema, Lula explicou: “Freud dizia que havia várias coisas que a humanidade não controlaria. Uma delas eram as intempéries. Essa questão do clima é delicada por quê? Porque o mundo é redondo. Se o mundo fosse quadrado, ou retangular, e a gente soubesse que nosso território está a 14 mil quilômetros de distância dos centros mais poluidores, ótimo, vai ficar por lá. Mas como o mundo gira, e a gente também passa lá embaixo nos lugares mais poluídos, a responsabilidade é de todos”. Nem Dilma teria feito melhor.

Para concluir: Dias atrás, o porta-voz da presidência afirmou que os filmes financiados pela Ancine devem ter o espírito cristão, que é o da sociedade brasileira. Mas é impensável achar que o Estado só pode financiar filmes que correspondam ao pensamento do presidente. O país não pode ser liderado por uma visão personalista e voluntarista como a de Bolsonaro, que não tem parâmetros, e sim interesses pessoais. Ele vive em torno da família e dos amigos, e quem não está nesse grupo é visto como fora do padrão, não confiável. Sobre o comportamento do presidente, um texto de Rodrigo Constantino fecha esta postagem com chave de ouro:

As redes sociais deram voz aos idiotas de todos os tipos, perfis e ideologias. Andando em bando ou no anonimato, eles se sentem confortáveis para disseminar seu ódio, extravasar seu recalque, transformar sua mediocridade pessoal em arma contra todos aqueles que se mostram superiores, independentes, com autoconfiança.

Anos de petismo produziram um sentimento, compreensível, de revolta profunda, alimentando um desejo de vingança. No encontro entre as redes sociais e esse sentimento difuso, criou-se o fenômeno do bolsolavismo, uma “direita” que se define basicamente por aquilo que odeia, a esquerda. Não há desejo de construção, mas sim de destruição. E como se parecem, nos métodos, com aquilo que pretendem destruir!

Ao perceber isso, muitos liberais e conservadores foram se afastando do governo Bolsonaro. Afinal, trata-se de um pacote: para levar Guedes é preciso levar também essa gente que baba de ódio e quer guerra permanente contra os inimigos — todos aqueles que não aderem totalmente ao bando. O governo Bolsonaro, porém, não é sua militância olavete nas redes sociais. Mas quem conhece essa turma tem calafrios só de imaginar sua crescente influência no governo.

O receio com o autoritarismo, portanto, é legítimo. Não é “fascismo imaginário”, como alguns alegam. É projeção desse grupo se alastrando e tomando conta do todo, inclusive jogando para escanteio aqueles mais moderados e pragmáticos que insistem em lutar pelo país em meio aos boçais. Eles se acham “machões”, mas não passam de brutamontes truculentos sem qualquer noção do que seja conservadorismo.

sexta-feira, 15 de junho de 2018

MAIS CRISE NO PAÍS DA CRISE



Os combustíveis retornaram às bombas e os hortifrutigranjeiros, às feiras livres e supermercados. Tudo voltou ao normal, ainda que os preços estejam bem mais altos que antes da paralisação dos caminhoneiros. Mas o Brasil é um país em crise permanente, com períodos de aparente normalidade, e neste momento, a quatro meses das eleições, é “normal” estarmos vivendo o mais absoluto caos.

ObservaçãoDois novos encontros com caminhoneiros e uma possível votação na Câmara dos deputados acrescentam mais um capítulo na novela da crise viária e política do país. Além da tabela de fretes rodoviários, será discutida a Medida Provisória dos Fretes e o aumento na pontuação de suspensão da carteira de motorista.

As greves dos caminhoneiros e dos petroleiros — esta última ficou mais na ameaça, mas enfim... — jogaram o Brasil de volta no atoleiro do populismo e causaram enormes danos à economia e à rotina da população. E num país onde nem o passado é previsível, como prever o que acontecerá em outubro, quando milhões de desinformados e outros tantos analfabetos de quatro costados escolherão presidente, governadores, senadores e deputados estaduais e federais a partir de um portfólio de opções onde, salvo raríssimas exceções, não há nada que valha míseros dois réis de mel coado?

A greve dos caminhoneiros deve continuar impactando a economia, a política, o orçamento e até o judiciário brasileiro ao longo de 2018, até porque baixar e controlar preços por decreto não funciona — que o diga o ex-presidente Sarney. Resta saber se os postos realmente baixarão o preço do diesel em 46 centavos, como o Planalto prometeu, ainda que, por lei, não possa tabelar o preço nas bombas. Marun disse que não se trata de tabelamento, mas se o governo anunciou multas de até 9,4 milhões de reais para postos que desrespeitarem a medida, o que seria, então?

Observação: Analistas estimam que os prejuízos decorrentes ultrapassam R$ 60 bilhões e seus efeitos para o PIB de 2018 ainda são imensuráveis. O mais provável é que a economia cresça menos de 2%, o que fulmine as candidaturas governistas e abre espaço para discursos mais extremados no processo eleitoral. A greve terminou, mas, pelo visto, os problemas políticos e econômicos continuam a pleno vapor.

Seria ingenuidade esperar algo diferente de um governo falido, de um presidente impopular, desacreditado e cercado de assessores igualmente suspeitos, investigados ou denunciados. Ou uma reação diferente dos investidores, a 4 meses de uma eleição na qual os candidatos mais cotados são um presidiário e um militar truculento, arrogante e de absoluta inexpressividade legislativa — com míseros 2 projetos aprovados em 26 anos como congressista.

Assim como ocorreu nas eleições de 2014, quando Dilma e Aécio dividiam a preferência do eleitorado, as pesquisas de intenção de voto serão acompanhadas de perto pelo mercado financeiro, e o fato de o que elas revelam não entusiasmar — com o demiurgo de Garanhuns fora do páreo, a disputa fica polarizada entre Jair Bolsonaro e Ciro Gomes —, devemos ter novas oscilações pela frente.

Como nenhum dos primeiros colocados é bem visto pelo mercado financeiro, a publicação dos resultados das pesquisas provocou quedas na Bolsa e altas no preço do dólar (na última quinta-feira, o IBOVESPA fechou em baixa de 2,98%, aos 73.851 pontos, e a moeda norte-americana subiu 2,28%, cotada a R$ 3,926). O fato de a sonhática Marina Silva aparecer ora em terceiro, ora em segundo lugar também não ajuda em nada, e nem Henrique Meirelles nem Geraldo Alckmin — que, se estivessem melhor colocados, acalmariam o mercado — parecem ter chances reais de chegar ao segundo turno.

Seja como for, a menos que se dê uma inconcebível — mas não impossível, que isto aqui é Brasil — reviravolta no cenário político-jurídico, Lula é carta fora do baralho, digam o que disserem os petralhas e sua militância atávica. O petralha, que também não é bem visto pelo mercado financeiro, está cumprindo pena e é réu em mais 6 ações criminais — duas das quais tramitam na 13ª Vara Federal, em Curitiba, e se não fossem os recorrentes pedidos de perícias, diligências e outras chicanas,  já teria sido sentenciado no processo que trata da cobertura em São Bernardo do Campo e do terreno comprado pela Odebrecht para sediar o folclórico Instituto Lula. Isso sem mencionar o sítio de Atibaia, cuja ação também está sob a pena do juiz Moro (os demais tramitam na Justiça Federal do DF, onde, a exemplo do que ocorre no STF, avançam a passo de tartaruga).   

Por essas e outras, para o dólar romper a barreira psicológica dos R$ 4 é o BACEN voltar a subir a taxa básica de juros é mera questão de tempo. Espera-se que, já na próxima reunião, o COPOM eleve a Selic em meio ponto percentual. Todavia, o uso da política monetária para conter o avanço do câmbio em vez de para controlar a inflação (que está baixa devido à recessão), o mercado pode interpretar a alta dos juros como um sinal de que o Banco Central está receoso em relação ao câmbio, e isso é tudo de que o governo não precisa neste momento.

Some-se a isso o fato de o Congresso estar parado, de reformas importantes — como a fiscal e a da Previdência — não avançarem, junte a demissão de Pedro Parente da presidência da Petrobras e veja como o molho desanda facilmente.

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