sábado, 10 de dezembro de 2022

A TRANSIÇÃO E A TRANSAÇÃO


Encastelado no Alvorada desde a derrota nas urnas, Bolsonaro tem evitado comentar os protestos golpistas, o relatório das FFAA, a malsucedida tentativas do PL de invalidar parte dos votos e a multa de R$ 22, 9 milhões que o ministro Alexandre de Moraes aplicou ao partido por litigância de má-fé. Seu silêncio mantém os golpistas acampados defronte a quartéis, com a certeza de que "o mito" retornará em algum momento para libertar o seu povo — um sebastianismo miliciano chapado de cloroquina e coberto de leite condensado.

Durante um jantar de confraternização do PL, o futuro ex-sultão do bananistão disse à deputada baba-ovo Carla Zambelli que não tinha nenhum direcionamento a passar aos manifestantes. Dias depois, debulhou-se em lágrimas durante uma solenidade militar — se tivesse chorado pelos que morreram de Covid, talvez seu destino fosse outro. 
 
Ao mesmo tempo que incentiva o golpismo, o desaparecimento público poupa o capitão de ser formalmente acusado de incentivar esses atos — que é o que aconteceria se ele estivesse falando pelos cotovelos no cercadinho e não chorando em silêncio em eventos militares. E defender os atos golpistas elevaria as razões para ser processado, condenado e preso após perder o foro privilegiado. Mas seu desgoverno ainda não terminou, pelo contrário, segue provocando danos na educação, na saúde, no meio ambiente, e por aí afora.
 
Em 34 anos de vida pública, Bolsonaro nunca ficou sem mandato e, consequentemente, sem foro privilegiado. Dias atrás, o pastor-senador eleito Magno Malta — que puxou orações em 2018 quando o então candidato foi esfaqueado — confidenciou ao pajé do PL que "Bolsonaro já era". O ex-ministro Infraestrutura e governador eleito de São Paulo, Tarcísio de Freitas, disse à CNN que nunca foi bolsonarista raiz.


Os do pai querem que ele volte a falar e que use o restante do mandato para organizar a oposição ao futuro governo — não só no Congresso, mas também nas ruas, insuflando mobilizações antidemocráticas. Militares próximos do presidente consideram "um erro" esse silêncio nos eventos do Exército (há ainda cerimônias de formatura da Aeronáutica e Marinha marcadas para os dias 8 e 10 de dezembro, respectivamente). Na avaliação dos fardados, se for para permanecer calado e não cumprimentar os formandos, ele nem deveria aparecer. 

 

Fanáticos inconformados com a derrota continuam promovendo bloqueios pontuais em algumas rodovias. Não é improvável que haja tumulto por ocasião da posse de novo governo, até porque a PRF pode a agir com a mesma leniência do início de novembro. Embora a cerimônia aconteça no dia 1º de janeiro, quando muitas pessoas estão de férias e os bloqueios ilegais perdem força (e adesão), abordagens nas estradas podem gerar confusão, já que se espera algo entre 1 milhão e 3 milhões de pessoas. 


Os presidentes da Câmara e do Senado decidiram oferecer dois anos de refresco fiscal a LulaNa véspera do início do julgamento sobre orçamento secreto no Supremo, os hierarcas do Congresso  incluíram na emenda da transição um fator de transação — a liberação de R$ 7,8 bilhões em emendas sigilosas ainda pendentes de pagamento em 2022. 


Há muitos interesses envolvidos na transação. Nenhum deles é o interesse público. A exemplo do diabo, o centrão sempre esteve nos detalhes. E ganhou todas. 


Com Leonardo Sakamoto e Josias de Souza