No Brasil convencional, cabe ao STF a última palavra na definição das grandes controvérsias jurídicas. No país do orçamento secreto, as togas se tornaram coadjuvantes de um balé de elefantes estrelado por Lula e Arthur Lira. O novo rei do Planalto e o velho imperador da planície legislativa medem forças para definir o tamanho do poder de cada um a partir de 1º de janeiro.
Dias atrás, Lira chamou o vice-presidente do PT para uma conversa. Mostrou-se irritado com os cochichos trocados entre Lula e algumas togas companheiras. Ficara entendido que o pajé do partido não articularia no Supremo. Num timbre que soou como chantagem, disse que um veredicto que enterrasse o orçamento secreto poderia jogar terra sobre a PEC da transição.
Num esforço para tranquilizar o presidente da Câmara, Guimarães disse que a solução sobre o orçamento secreto será política, não jurídica. Avisado, Lula telefonou para Lira. Tudo isso na mesma quarta-feira em que o Supremo iniciou, com atraso de mais de um ano, o julgamento das ações que questionam a constitucionalidade do orçamento secreto. Rosa Weber, a relatora, só teve tempo de apresentar os ternos da petição inicial. A leitura do voto foi transferida para a semana que vem. Flutua na atmosfera a perspectiva de que um magistrado peça vistas, empurrando a encrenca para 2023.
Simultaneamente, Lula e Lira executam a coreografia da enganação. Ambos sabem que terão que ceder espaço um ao outro. O petista não conseguirá fechar o mercado de compra e venda de deputados, e o pepista precisará acender a luz sobre o balcão, vinculando o rateio de verbas à agenda do novo governo.
A demora do STF em interromper a farra da compra de votos à conjuntura uma certa ponderabilidade cômica. As togas ficaram numa posição muita parecida com a de adolescentes que ameaçam quebrar a cara de um ofensor, mas demoram tanto a levantar da cadeira que comprometem a seriedade da cena. A Corte perdeu a supremacia. Virou um asterisco.
Com Josias de Souza