segunda-feira, 26 de dezembro de 2022

A UMA SEMANA DA TROCA DE TURNO...



Quando ainda sonhava com a vitória nas urnas, Lula prometia um governo de frente ampla, com grandes nomes, numa espécie de redenção para sua biografia política. "Meu governo não será um governo requentado", dizia ele. A julgar pelos nomes de petistas já anunciados e pelos que ainda virão, seu terceiro mandato não só será requentado como também contará com tempero especial da desastrosa gestão dilmista.

Lula demora a aprender com os erros do passado. Mal foi eleito, viajou ao Egito para a COP27 no jatinho do "Júnior da Qualicorp", relembrando a relação promíscua que sempre teve com empresários. Mas não é só. Em 2003, achou que colocar pessoas de sua confiança — como Dirceu, Palocci, Dilma et caterva — nos cargos-chave lhe daria o controle de tudo. E aí veio o mensalão, seguido pelo petrolão... 
 
Agora, o pajé do PT faz o mesmo com Haddad — seu preposto-bonifrate em 2018, que, como ministro da Fazenda, será para ele o mesmo que Pazuello foi para Bolsonaro no ministério da Saúde: um cumpridor de ordens. E Aloízio Mercadante fará o mesmo no BNDES caso a alteração na Lei das Estatais seja chancelada pelo Senado (lembrando que o texto-base foi aprovado na Câmara por 314 votos a 66, e a emenda que reduziu a quarentena, por 223 votos a 123).
 
Observação: Os parlamentares querem abrir caminho para indicações indiscriminadas de políticos a cargos de comando em empresas estatais. Prova disse é que, além de deputados petistas e de outros partidos aliados a Lula, integrantes do Centrão e até de aliados de Bolsonaro contribuíram para aprovar a excrescência. 
 
No Ministério da Defesa, José Múcio terá a missão de desativar o golpismo dos quarteis; na Justiça, Flávio Dino deverá preparar o desarmamento da sociedade; na Casa Civil, Rui Costa deverá desativar a trincheira política que Ciro Nogueira cavou no quarto andar do Planalto. Há também a perspectiva da indicação de Mauro Vieira para as Relações Exteriores — Celso Amorim deverá responder pela Secretaria de Assuntos Estratégicos. O Exército será comandado pelo general Júlio Cesar de Arruda; a Marinha, pelo almirante de esquadra Marcos Sampaio Olsen; a Aeronáutica, pelo tenente-brigadeiro do ar Marcelo Kanitz Damasceno. E o governo de trinta e tantos ministérios está só no início da formação. 
 
Mudando o foco do governante entrante para o sainte, Bolsonaro vive a síndrome do que está por vir. Em visita ao STJ, ele expressou o receio de sofrer uma perseguição, pois certamente terá seus atos confrontados com o que determinam o Código Penal e a legislação eleitoral. 
 
O presidente quebrou o silêncio que vinha mantendo desde a derrota nas urnas, mas evita comentar os atos de vandalismo cometidos no dia da diplomação de Lula e Alckmin. Não deu um pio sobre a tentativa de golpe no Peru e tampouco falou sobre o risco de um apagão na máquina pública. Mesmo sendo presidente de direito, o capitão parece ter jogado a toalha.
 
Levantamento de VEJA aponta que Bolsonaro não trabalhou mais que uma hora por dia, em média, desde 30 de outubro. Quase ninguém mais acredita em seus patéticos devaneios de "virar a mesa" — seja mediante mais uma contestação do resultado das eleições (a mais recente rendeu ao PL uma multa de R$ 22 milhões por litigância de má-fé), seja por meio de tumultos espontâneos ou organizados.
 
O dublê de "mito" e napoleão de hospício se mostra cada vez mais convencido de ser uma vítima, agora dos próprios apoiadores, de quem ele espera uma ação que garanta sua permanência no poder. "Quem decide o meu futuro, para onde eu vou, são vocês. Quem decide para onde vai (sic) as Forças Armadas são vocês", disse o capitão a apoiadores. Mas tudo indica que as FFAA não irão a lugar nenhum. 
 
discurso enigmático, dúbio e golpista do último dia 9 também trouxe um recado velado ao ministro Alexandre de Moraes. "Nós estamos lutando — quando eu falo nós, sou eu e vocês — pela liberdade até daqueles que nos criticam. O Brasil não precisa de mais leis, o Brasil precisa que suas leis sejam efetivamente cumpridas. Nós temos assistido, dia após dia, absurdos acontecerem aqui em nossa pátria", disse o mandatário. 
 
Para o presidente, Moraes é um dos principais “inimigos” da liberdade que ele jura defender. Ao dizer que ele e o povo têm "assistido absurdos acontecerem aqui em nossa pátria", referia-se claramente às decisões do ministro, que tem travado uma batalha em defesa da Constituição e atingido o bolsonarismo em cheio, como no pedido de afastamento de um prefeito e na determinação da prisão de um empresário ligado aos movimentos antidemocráticos defronte aos quarteis.
 
A seus apoiadores, que compram todas as suas teorias estapafúrdias, Bolsonaro disse ainda que as Forças Armadas são o último obstáculo para o socialismo, que "estamos vivendo um momento crucial, uma encruzilhada", e classificou como "provação" os dias que sucederam sua derrota nas urnas. Mas tudo indica que as Forças Armadas não irão a lugar nenhum. 
 
Observação: O futuro de Bolsonaro não guarda qualquer mistério, foi decidido pela maioria dos brasileiros no dia 30 de outubro. O melhor que ele pode fazer é conferir alguma dignidade a si mesmo nos últimos dias do seu triste mandato — e correr para segurar o emprego no PL, antes que Valdemar Costa Neto se arrependa de ter contratado um funcionário que, além de não dar mostras de querer trabalhar, já chega dando prejuízo.
 
Nos últimos quatro anos, o antiprocurador-geral perdoou todas as perversões do presidente, como se seus crimes prescrevessem antes mesmo de ser cometidos. Como o Judiciário tratou as pendências a golpes de barriga, acumulou-se um notável passivo. É como se vigorasse um entendimento tácito de que ser Bolsonaro já é castigo suficiente para qualquer um. 
 
O problema é que o personagem se esforçou, ao longo de todo o mandato, para demonstrar que não é qualquer um, governando o país como um símbolo da estupidez inimputável. Graças à inércia das instituições, o símbolo jamais precisou responder pelo que simboliza. O fim do mandato seria um bom mote para o início de uma nova fase.