A denúncia de que o ex-presidente Bolsonaro, sob inspiração do ex-deputado Daniel Silveira, tramou grampear o ministro Alexandre de Moraes para pescar uma indiscrição verbal que levasse à anulação da vitória de Lula veio do senador bolsonarista Marcos do Val. Pendurado nas redes sociais de madrugada, um vídeo de Do Val caiu sobre a manhã ensolarada de Brasília como um míssil. Em poucas horas, verificou-se que o enredo foi elaborado à moda do inesquecível Chacrinha. Não veio para explicar, veio para confundir.
No vídeo madrugador, o senador trombeteou a revelação que sairia em notícia da revista Veja, segundo a qual Do Val fora "coagido" por Bolsonaro a participar de um golpe. Utilizando escuta do GSI, ele arrancaria de Moraes a admissão de que pisou fora da Constituição para prejudicar o presidente. Do Val avisou ao ministro sobre o plano de enviá-lo para a cadeia. Adicionando dramaticidade ao vídeo, o senador renunciou ao mandato.
A ribalta do golpe rendeu a Do Val entrevistas em série. O timbre ácido do acusador foi se tornando aguado. A denúncia ganhou a aparência de uma trama da Famiglia Bolsonaro para desacreditar Moraes. Entre um holofote e outro, o denunciante recebeu visita de Flávio Bolsonaro e telefonema de Eduardo Bolsonaro. A dupla o demoveu da ideia de renunciar.
Os filhos 01 e 03 adulando um acusador do pai é coisa inédita. Normalmente, eles preferem triturar os traidores. Preservado, Do Val ajustou a prosa. Sumiu do roteiro a ideia de coação. Bolsonaro virou espectador de uma proposta de golpe verbalizada por Daniel Silveira. A presença do GSI no lance virou uma "suposição" do denunciante.
De repente, um pulo do gato: Do Val lembra que se reuniu com Moraes não uma, mas duas vezes. Perguntou se deveria ir à reunião com Bolsonaro e Silveira. "Informação é sempre bom", teria estimulado o ministro. Posteriormente, após ouvir relato sobre o golpe, Moraes não tomou providências. Nesse enredo, o algoz de Bolsonaro passa de potencial vítima de um grampo ilegal a juiz relapso, um reles prevaricador. De resto, Do Val insinuou que dispõe de munição contra Flávio Dino, o ministro da Justiça de Lula.
Simultaneamente, Flávio Bolsonaro foi ao microfone do plenário do Senado para confirmar, com hedionda naturalidade, que o encontro do pai com Do Val realmente aconteceu. Teria o objetivo de "demover pessoas que estavam nessa reunião de fazer algo inaceitável, absurdo e ilegal", declarou, lançando ao mar Daniel Silveira, agora um sem-mandato.
Observação: Silveira se candidatou ao Senado no ano passado, mas não se elegeu. Sem mandato parlamentar nem foro privilegiado, foi detido em Petrópolis (RJ) por descumprir medida cautelar do STF, que o condenou no ano passado a oito anos e nove meses de prisão — como todos se lembram, o então deputado recebeu o perdão de Bolsonaro, e até hoje o Supremo não se dignou de dar a palavra final sobre a constitucionalidade da graça presidencial.
Por uma dessas fatais coincidências, o picadeiro montado por Do Val e pelos Bolsonaro ocorre num instante em que a Polícia Federal ouviu dois depoimentos. Num, Valdemar Costa Neto, o dono do partido que hospeda o ex-presidente, foi instado a explicar as "várias propostas" de minuta de golpe que diz ter recebido de desconhecidos; noutro, Anderson Torres, o ex-ministro da Justiça de Bolsonaro, foi instado a explicar a origem da minuta de decreto presidencial prevendo intervenção no TSE, cancelamento da vitória de Lula e formação de uma junta de maioria militar para virar o resultado eleitoral do avesso.
No vídeo madrugador, o senador trombeteou a revelação que sairia em notícia da revista Veja, segundo a qual Do Val fora "coagido" por Bolsonaro a participar de um golpe. Utilizando escuta do GSI, ele arrancaria de Moraes a admissão de que pisou fora da Constituição para prejudicar o presidente. Do Val avisou ao ministro sobre o plano de enviá-lo para a cadeia. Adicionando dramaticidade ao vídeo, o senador renunciou ao mandato.
A ribalta do golpe rendeu a Do Val entrevistas em série. O timbre ácido do acusador foi se tornando aguado. A denúncia ganhou a aparência de uma trama da Famiglia Bolsonaro para desacreditar Moraes. Entre um holofote e outro, o denunciante recebeu visita de Flávio Bolsonaro e telefonema de Eduardo Bolsonaro. A dupla o demoveu da ideia de renunciar.
Os filhos 01 e 03 adulando um acusador do pai é coisa inédita. Normalmente, eles preferem triturar os traidores. Preservado, Do Val ajustou a prosa. Sumiu do roteiro a ideia de coação. Bolsonaro virou espectador de uma proposta de golpe verbalizada por Daniel Silveira. A presença do GSI no lance virou uma "suposição" do denunciante.
De repente, um pulo do gato: Do Val lembra que se reuniu com Moraes não uma, mas duas vezes. Perguntou se deveria ir à reunião com Bolsonaro e Silveira. "Informação é sempre bom", teria estimulado o ministro. Posteriormente, após ouvir relato sobre o golpe, Moraes não tomou providências. Nesse enredo, o algoz de Bolsonaro passa de potencial vítima de um grampo ilegal a juiz relapso, um reles prevaricador. De resto, Do Val insinuou que dispõe de munição contra Flávio Dino, o ministro da Justiça de Lula.
Simultaneamente, Flávio Bolsonaro foi ao microfone do plenário do Senado para confirmar, com hedionda naturalidade, que o encontro do pai com Do Val realmente aconteceu. Teria o objetivo de "demover pessoas que estavam nessa reunião de fazer algo inaceitável, absurdo e ilegal", declarou, lançando ao mar Daniel Silveira, agora um sem-mandato.
Observação: Silveira se candidatou ao Senado no ano passado, mas não se elegeu. Sem mandato parlamentar nem foro privilegiado, foi detido em Petrópolis (RJ) por descumprir medida cautelar do STF, que o condenou no ano passado a oito anos e nove meses de prisão — como todos se lembram, o então deputado recebeu o perdão de Bolsonaro, e até hoje o Supremo não se dignou de dar a palavra final sobre a constitucionalidade da graça presidencial.
Por uma dessas fatais coincidências, o picadeiro montado por Do Val e pelos Bolsonaro ocorre num instante em que a Polícia Federal ouviu dois depoimentos. Num, Valdemar Costa Neto, o dono do partido que hospeda o ex-presidente, foi instado a explicar as "várias propostas" de minuta de golpe que diz ter recebido de desconhecidos; noutro, Anderson Torres, o ex-ministro da Justiça de Bolsonaro, foi instado a explicar a origem da minuta de decreto presidencial prevendo intervenção no TSE, cancelamento da vitória de Lula e formação de uma junta de maioria militar para virar o resultado eleitoral do avesso.
Observação: Após dez horas de depoimento à Polícia Federal, Torres disse desconhecer o autor da chamada "minuta do golpe" — um documento sem fundamento legal, tecnicamente ruim e com muitos erros de português, que ele, Torres, jamais teria levado ao conhecimento do chefe do Executivo.
Extraída de um armário durante batida policial na casa do ex-ministro, a minuta menciona que a intervenção ocorreria depois do dia 12 de dezembro, data em que o TSE diplomou a chapa Lula-Alckmin. A reunião em que Do Val ouviu o plano de grampear Moraes ocorreu em 9 de dezembro.
Vivo, Chacrinha ficaria intrigado com uma confusão que, a pretexto de embaralhar as investigações, coloca Bolsonaro na cena do crime, convertendo-o num elo indissociável entre o plano de golpe e a minuta do decreto que consolidaria a virada de mesa. Enxerga-se por trás do manto diáfano da desinformação a imagem do capitão costeando as grades de uma cela.
Com Josias de Souza
Com Josias de Souza