sexta-feira, 3 de fevereiro de 2023

TRISTE BRASIL

 

A Lava-Jato encarcerou um ex-presidente que escapou do mensalão, tropeçou no petrolão, colecionou duas dúzias de ações criminais e foi condenado, por uma dúzia de magistrados de três instâncias, a mais de 26 anos de reclusão. Para evitar que o país fosse governado pelo bonifrate do presidiário, a parcela pensante do eleitorado se aliou a um bando pseudopatriotas para alçar à Presidência uma câncer que nem 145 pedidos de impeachment conseguiram extirpar. 
 
Visando impedir a metástase, togados companheiros rasgaram a Constituição e reabilitaram penal e politicamente aquele que, por 580 dias, foi o presidiário mais famoso do Brasil. Mais uma vez sem alterativa para evitar a perpetuação do capitão golpista, a parcela pensante do eleitorado compactuou com a volta do autoproclamado parteiro do Brasil Maravilha, Pai dos Pobres, Mãe dos Ricos e enviado pela Divina Providência para acabar com a fome, presentear a imensidão de desvalidos com três refeições por dia e multiplicar a fortuna dos milionários.
 
Derrotado nas urnas, o arremedo de mandatário, que sempre foi avesso ao batente, se encastelou no Alvorada e, na antevéspera da troca de turno, foi buscar asilo na cueca do Pateta. Caso obtenha o visto de turista, poderá continuar nos EUA por mais seis meses. Segundo seu primogênito, o regresso do pai pode acontecer daqui a um dia, um mês, seis meses ou nunca (que os anjos digam amém). 
 
Ao encerrar sua aziaga gestão, Bolsonaro deixou o Brasil com míseros 38 pontos no Índice de Percepção da Corrupção (IPC) da Transparência Internacional
empatado com Argentina, Etiópia, Marrocos e Tanzânia na 94ª posição entre os 180 países e territórios avaliados. Os primeiros colocados foram Dinamarca (90 pontos), Finlândia e Nova Zelândia (ambos com 87 pontos), Noruega (84 pontos) e Singapura e Suécia (ambos com 83 pontos); na ordem inversa posicionaram-se Somália (12 pontos), Síria e Sudão do Sul (ambos com 13 pontos) e Venezuela (14 pontos).
 
O documento destaca o vergonhoso "Orçamento Secreto" — considerado o maior esquema de institucionalização da corrupção desde o tempo do mensalão e do petrolão — como principal moeda de compra da blindagem política de Bolsonaro no Congresso, garantida pelo Centrão. Maior beneficiário dos recursos secretos, Arthur Lira manteve sob seu avantajado buzanfã mais de 140 pedido de impeachment, enquanto o simulacro de Procurador-Geral fingiu não ver os crimes apontados pela CPI da Pandemia, o desmanche continuado da governança ambiental e de proteção aos direitos indígenas, o avanço desimpedido de movimentos golpistas e ataques às instituições democráticas e as retaliações a membros do próprio MP diante de casos de corrupção.
 
O relatório aponta ainda que o vácuo constitucional da PGR foi preenchido pela exacerbação do papel do STF e do TSE. Sem poder contar com Augusto Aras para pedir a instauração de processos ou medidas cautelares nas duas cortes, as togas passaram a agir de ofício e homologar coletivamente heterodoxias frente às graves ameaças e ataques às instituições e à ordem democrática. Talvez não lhes restasse alternativa para garantir a sobrevivência das instituições, mas o documento chama a atenção para as consequências de violações continuadas de garantias processuais e direitos individuais.
 
"Acuado desde antes da posse pela corrupção fartamente comprovada de sua família, a prioridade de Bolsonaro durante todo o seu governo foi garantir sua blindagem através da neutralização do aparato institucional e legal que o ameaçava. O impacto disso foi muito maior do que a impunidade nos casos de corrupção e lavagem de dinheiro do clã. Durante quatro anos, presidente desmontou o sistema de freios e contrapesos da democracia brasileira, atacando os três pilares de responsabilização que o sustentam. Foi uma destruição institucional muito grave e de difícil reversão”, destaca Bruno Brandão, diretor executivo da Transparência Internacional - Brasil.
 
O Brasil se tornou um dos principais exemplos de deterioração democrática e aumento de conflitos associados à corrupção. Eleito a bordo do discurso anticorrupção, Bolsonaro promoveu retrocessos e um desmanche institucional sem precedentes, disseminou notícias falsas e discurso de ódio, enalteceu um projeto autoritário e fomentou a violência política, que teve seu ápice no último 8 de janeiro. Como desgraça pouca é bobagem, a imprestabilidade do capitão como mandatário desaguou na volta do lulopetismo corrupto de volta ao poder.

Triste Brasil.