sexta-feira, 10 de março de 2023

CARLO ROVELLI E A INEXISTÊNCIA DO TEMPO (PARTE 3)

A DIFERENÇA ENTRE A TEORIA ACADÊMICA E SUA APLICAÇÃO PRÁTICA PODE SER ENORME.

Ainda segundo Carlo Rovelli, se o espaço é um campo e o tempo nasce dos processos desse mesmo campo, então o Universo inteiro é formado por campos quânticos, mas que não viveriam no espaço-tempo, pois eles são o próprio espaço-tempo

Dito de outro modo, tudo que nos cerca é formado por campo sobre campo, e a esses campos que vivem sobre si mesmos dá-se o nome de "campos quânticos covariantes", ou seja, que respeitam a invariância de Lorentz. 

 

Segundo a invariância de Lorentz, as leis da física devem ser as mesmas em todos os sistemas de referência que se movem uns em relação aos outros a uma velocidade constante. Ela assevera que as propriedades dos campos quânticos, tais como suas energias, momentos e spin, sejam as mesmas em todos os sistemas de referência inerciais. Isso é crucial para garantir que as previsões da teoria quântica de campos sejam consistentes com as observações experimentais. 

 

A ideia fica mais clara quando pensamos na luz, que é formada por fótons e ondas. Se conseguíssemos nos afastar o suficiente de um punhado de fótons, poderíamos enxergar as ondas (os fótons são a maneira como as ondas interagem). À luz (sem trocadilho) dessa analogia, o espaço-tempo seria formado por "quantas" de gravidade, que, como os fótons que permitem a interação entre as ondas de luz, possibilitam a interação entre espaço e tempo.

 

Aprendemos na escola que o corpo humano é formado por cabeça, tronco e membros, mas, em última análise, ele é formado por um enorme conjunto de átomos. Se fosse possível nos afastarmos o suficiente de uma molécula do corpo humano, teríamos uma visão geral da pessoa que ela forma. Como diz Rovelli: "Pense nas montanhas. Onde elas começam? Onde terminam? Quanto delas continua sob a terra? São perguntas sem sentido, porque uma montanha não é um objeto em si, é só uma maneira que temos de dividir o mundo para falar dele mais facilmente. Seus limites são arbitrários, convencionais, cômodos. São maneiras de organizar a informação que dispomos, ou melhor, formas da informação que dispomos".

Ainda segundo o físico italiano, para entender a teoria da gravidade quântica em loop é preciso renunciar à ideia de espaço e tempo como estruturas gerais para enquadrar o mundo. A maior dificuldade em entender o conceito se deve ao fato de que é praticamente impossível pensar em um mundo sem tempo e sem espaço, pois isso coloca em risco a própria realidade a nossa volta. Mas compreender o mundo muitas vezes significa contrariar a nossa própria intuição.


Talvez a maior contribuição da gravidade quântica em loop seja a forma de visão de mundo que ela proporciona: em havendo um limite para o espaço e o tempo, a tensão entre a relatividade geral e a mecânica quântica deixa de existir. Consequentemente, não há entender o que se passa em um universo infinitamente pequeno, em que as leis de Einstein não fazem sentido, já que não existe um universo infinitamente pequeno. Todo universo é limitado pelos quanta de gravidade; ao eliminarmos a ideia de espaço contínuo, as peças acabam se encaixando.


Devemos ter em mente que, assim como a Teoria das Cordas, a gravidade quântica em loop é uma explicação do mundo que carece de comprovação em laboratório. Mas isso não a desmerece. Até 2016, as ondas gravitacionais não passavam de um hipótese de Einstein, e o mesmo aconteceu com o bóson de Higgs e as ondas eletromagnéticas.

Segundo a física teórica Lisa Randall, "na física não se consegue provar de fato uma teoria; o que se consegue é excluir as teorias alternativas". A a questão mais interessante da ciência talvez seja a de que quanto mais desvendamos o mundo, mais descobrimos coisas a desvendar."


Parafraseando Rovelli, "a única coisa realmente infinita no Universo é a nossa ignorância".

 

Com BBC Mundo e Galileu.