quinta-feira, 8 de junho de 2023

LULA LÁ... PARTE 2

 

A indicação de Cristiano Zanin para o STF foi bem recebida por integrantes da corte, anotou Chico Alves em sua coluna no UOL. Do lavajatista Fux ao bolsonarista Nunes Marques, passando por Barroso e Gilmar, todos elogiaram a competência e o saber jurídico do advogado*. No Senado, noves fora Sergio Moro e alguns oposicionistas, o nome proposto por Lula deve ser chancelado sem dificuldade (para assumir a vaga, o advogado do petista precisa de aprovação da CCJ e do plenário). 
 
Apesar do clima favorável, a nomeação é problemática e a argumentação para sustentá-la abre um precedente perigoso. Quem criticou o critério de Bolsonaro para indicar um ministro "terrivelmente evangélico" não deveria normalizar o parâmetro de Lula, que cita como primeiro atributo para a escolha o fato de Zanin ter sido responsável pela defesa de petista contra as "injustiças da Lava-Jato" (se o ex-capitão usasse o mesmo critério, teríamos no STF alguém como Frederick Wassef).
 
Observação: Nos últimos quatro anos, o PT pagou a Zanin R$ 2,9 milhões por "serviços de consultoria jurídica". No ano passado, o causídico desfez a sociedade com Ricardo Teixeira e abriu um escritório em São Paulo com a mulher, que atuou ao lado dele na defesa de Lula nos processos da Lava-Jato.
 
"Todo mundo esperava que eu fosse indicar o Zanin não só pelo papel que ele teve na minha defesa, mas simplesmente porque eu acho que o Zanin se transformará num grande ministro da Suprema Corte desse país", disse o presidente ao comentar a escolha. O trecho "não só pelo papel que ele teve na minha defesa" registra para a história a admissão do pretexto nada republicano para a indicação feita pelo petista. E não é bom para a democracia que o princípio da impessoalidade, que deveria reger todos os atos no serviço público, seja desprezado dessa forma.
 
Talvez Lula passe a se sentir mais protegido a partir de agora. Mas, diante do precedente aberto, a democracia brasileira ficará bem mais exposta. Segundo Deltan Dallagnol, a indicação reforça um temor de que a Lava-Jato possa ser afetada por vinganças pessoais.
 
* Segundo a Constituição Federal, o indicado para uma vaga no STF  precisa "ser brasileiro nato, ter entre 35 e 65 anos, reputação ilibada, notável saber jurídico". Mas é particularmente difícil enxergar "saber jurídico" em Zanin — não que ele não seja inteligente ou que não possa vir a ser um grande jurista, mas a Carta Magna não pede mero potencial jurídico nem se contenta com um talento a desabrochar. 
O termo "Notável" remete a conhecimento publicamente estabelecido, aferido pela respeitabilidade intelectual do indicado perante a comunidade por um histórico, profissional ou acadêmico, de sucessivos casos, julgamentos, livros etc. Até pouquíssimo tempo atrás, Zanin era um ilustre desconhecido, mesmo para a advocacia criminal paulistana. Quem já fez silêncio para ouvi-lo saiu sem escutar nada, ou quase nada. Isso é o oposto da notabilidade

Lula nos entregou uma caixinha de surpresas, com a promessa de que gostaremos do que sairá lá de dentro. Não custa lembrar que seu histórico não é de bom presenteador: da última vez que recebemos pacote semelhante, quem surgiu do embrulho foi Dias Toffoli.
 
Com Rafael Mafei