Na investigação sobre o assassinato de Marielle, o absurdo ganhou uma doce naturalidade. A polícia fluminense tratava Suel como figurante, mas a PF descobriu que ele é um empreendedor do submundo das milícias.
Como bombeiro, Suel ganhava R$ 10 mil por mês. Escorando-se em dados do Coaf, os investigadores verificaram que ele movimentou R$ 6,4 milhões entre março de 2019 e outubro de 2021, quando se dividia entre a farda de bombeiro, a venda clandestina de TV a cabo na Zona Norte e um varejo criminoso que incluiu o planejamento e acobertamento do assassinato da vereadora.
Num passado remoto, as milícias eram toleradas — e por vezes aplaudidas — porque executavam pivetes e "aviõezinhos" em troca de alguns caraminguás. Hoje, dividem regiões com o tráfico, operam em ramos variados — do transporte clandestino aos imóveis ilegais — e recrutam pessoal nas forças de segurança sob a proteção de governantes.
Quando menos se espera, um Suel qualquer surge no bololô em que se converteu o caso Marielle como a cereja podre de um bombeiro-ostentação. Morava bem e gastava muito. A plateia se pergunta: por que os investigadores haviam suprimido de seus hábitos o ponto de exclamação?
Nóbrega era considerado peça-chave nas investigações que envolvem a expansão das milícias fluminenses e o esquema de rachadinhas da Famiglia Bolsonaro, e logo surgiram dúvidas sobre os reais objetivos da operação policial — da qual participaram 70 homens equipados com fuzis, carabinas, pistolas, revólveres, espingardas, bombas de gás, drones, coletes e escudos à prova de bala, embora o foragido estivesse sozinho, seminu e armado apenas com uma pistola.
Familiares e conhecidos do ex-capitão da PM-RJ sustentaram a tese da execução. "Ele me ligou e disse que não adiantaria se entregar porque ninguém queria a sua prisão, mas sim a sua morte", disse a VEJA o advogado que defendia o defendia na Justiça. Uma semana antes da ação policial, Júlia Mello Lotufo, esposa da vítima, reiterou que o ex-PM foi assassinado: "Meu marido foi envolvido numa conspiração armada pelo então governador do Rio, Wilson Witzel, que queria matá-lo para queima de arquivo."
Observação: Em janeiro deste ano, a corporação informou que os documentos que poderiam ajudar a solucionar a suposta execução foram levados por uma grande chuva ocorrida 2010. Assim, o inquérito prescreveu sem que ninguém fosse responsabilizado.
Quando ainda era deputado, o ora senador dos panetones e das mansões milionárias contratou a mãe e a ex-mulher de Nóbrega para trabalhar em seu gabinete. Parte dos salários das duas irrigou o esquema de rachadinha operado por Queiroz, antigo parceiro de ronda do miliciano. Devido a essas conexões, a versão de "queima de arquivo" ganhou as ruas e as redes sociais. Em resposta, aliados dos Bolsonaro alegaram que o então governador fluminense Wilson Witzel teria dado prioridade à ação policial por temer que Nóbrega revelasse detalhes das relações de líderes das milícias com o poder público do Rio.