Intimado pelas circunstâncias a exibir novas cartas, Bolsonaro recorre a blefes. Consolida-se a percepção de que o cerco jurídico-policial coordenado pelo ministro Alexandre de Moraes carbonizou o baralho. Esgotaram-se as mágicas. A prisão passou a ser mera questão de tempo.
Jogados no caldeirão em que borbulha a gosma quente do 8 de janeiro, golpistas miúdos e graúdos esperneiam igual e expelem as mesmas flatulências. A diferença é que os tubarões, mais perigosos, merecem cadeia, e os 1.156 bagrinhos, inocentes inúteis, camisa de força. O maior excesso que se pode cometer com essa gente é o excesso de moderação.
Mauro Cid vendeu um Rolex da Presidência e entregou o dinheiro ao ex-chefe. Moraes quebrou os sigilos bancário e fiscal de Bolsonaro e de sua mulher (cuja defesa o advogado abandonou). O escroque de Araraquara revelou as encomendas golpistas feitas pelo capitão por telefone e na mesa de café da manhã do Alvorada. Cercado, o chefe do clã das rachadinhas recorreu ao trapezismo moral. "Eu não peguei dinheiro de ninguém. Minha marca é a honestidade e sempre será".
As revelações dos últimos dias potencializaram o cenário que transforma, por contágio, a deterioração criminal de Bolsonaro na desmoralização das Forças Armadas. O Ministério da Defesa pediu à PF que informe os nomes dos militares que se reuniram com o hacker estelionatário para tramar contra urnas — o pedido é ofensivo porque caberia à pasta fornecer à PF os dados sobre perversões ocorridas nas suas dependências, não o contrário.
Os comandantes das FFAA sustentaram, numa conversa com Lula no escurinho do Alvorada, que é preciso esperar pelas sentenças judiciais para reagir. Alegaram que convém evitar uma "caça às bruxas". A protelação ofende porque o repúdio da corporação à delinquência independe do Judiciário. Com a complacência do alto-comando, Bolsonaro politizou os quartéis. Para desbolsonarizar suas atividades, os fardados terão que reagir no tempo da política. No Brasil, a Justiça tarda e nem sempre chega.
Em comunicado endereçado ao público interno, o comandante do Exército anotou que os soldados "devem pautar suas ações pela legalidade e legitimidade". No mesmo texto, a pretexto de "fortalecer as ações voltadas para o bem-estar da família militar", disse ter acionado o Estado Maior do Exército para articular medidas "visando à recomposição salarial dos militares". A impressão é de que as FFAA utilizam a brasa do bolsonarista para assar uma pizza integralmente feita de omissão e privilégios.
Cid e Delgatti atiram no imbrochável desde a prisão. Foram colocados lá por Alexandre de Moraes. Fugindo da pecha de novo Moro, o magistrado não quer parecer piromaníaco. Por ora, trabalha com a hipótese de prender o dito-cujo depois da sentença condenatória do STF. Mas a cadeia virá antes se ele colocar o pé fora do Código Penal, pressionando testemunhas, destruindo provas ou subvertendo a ordem pública. Moraes e a PF não têm pressa. Têm apenas perguntas e disposição para manter o cerco.