segunda-feira, 22 de janeiro de 2024

DA TERRA A LUA A BORDO DO CORPORATIVISMO

 
operação que mira o deputado bolsonarista Carlos Jordy mostra que o ministro Alexandre de Moraes finalmente percebeu que vai ficar mal na fita se continuar fisgando "bagrinhos" em vez de pescar tubarões. Todavia, depois de um ano e fumaça, só um imbecil não teria destruído todos os indícios que porventura o incriminassem. Resta saber quais e quantas são as provas que a PF já recolheu e o que mais os agentes esperam conseguir agora. Nesse entretempo, o candidato a réu contra quem ainda não há sequer denúncia continuará usando e abusando do jus sperniandi.
 
No Exército, a corrida pelas promoções a coronel é liderada por Mauro Cid. A menos que a PGR o denuncie e o STF o converta em réu, o ex-ajudante de ordens do capetão, mesmo enrolado em traficâncias que vão da gestão de recursos espúrios da família Bolsonaro à venda de joias da República, passando pela falsificação de cartões de vacina e pela cumplicidade na armação da tentativa de golpe, subirá um degrau na carreira militar.
 
Durante quatro anos, Cid foi remunerado para subverter as funções de ajudante de ordens. Nos quatro meses em que desfrutou do encarceramento especial, recebeu pelo exercício do ócio de prisioneiro. Libertado, passou a usufruir de recompensa pecuniária para desfilar uma tornozeleira diante dos olhares de contribuintes indefesos, mantendo o contracheque de mais de R$ 26 mil mensais. Sabe-se agora que ele pode ser alçado ao setor de operações lunares do Exército.
 
Desde julho de 1969, quando a Apolo 11 alunissou, somente quatro países além dos EUA conseguiram chegar à Lua: a ex-União Soviética, a China, a Índia e, na última sexta-feira, o Japão. Mas uma reportagem da Folha revelou que o Brasil está na bica de ingressar (metaforicamente) nessa seleta confraria. E com uma vantagem: as missões espaciais mais recentes, como a japonesa, não são tripuladas, mas o Exército brasileiro vai ao mundo da Lua com Mauro Cid.
 
Alega-se que o investigado está protegido pelo princípio constitucional da presunção de inocência. Nessa versão, somente a denúncia formal o retiraria da fila de promoção e apenas uma sentença condenatória definitiva o livraria da expulsão da caserna. Mesmo assim, ele continuaria pendurado no erário, pois sua família embolsaria a pensão proporcional a seu tempo de "serviço". 
No início da investigação, Cid era um mero um suspeito. A perícia realizada em seu celular empurrou para dentro do inquérito que corre no STF um sólido conjunto de indícios de culpa. A admissão voluntária de participação nas malfeitorias bolsonaristas guindou-o à condição informal de réu confesso, e o acordo de delação o converteu num culpado à espera da definição do prêmio judicial que pode atenuar sua pena. Nesse contexto, a inocência presumida é um direito esmaecido, algo que não orna com a preservação do contracheque. Assim, se a simples cogitação de promoção já é um acinte, a efetivação no posto de coronel seria um escárnio. 
 
Fica cada vez mais nítido que a legislação que ampara militares até na delinquência precisa ser submetida a uma lufada de ar fresco. Num país menos ilógico, a ausência de condenação definitiva jamais seria obstáculo para a fixação de punições intermediárias, compatíveis com a evolução do processo. Mas numa banânia onde a Justiça sempre tarda e nunca chega, o trânsito em julgado não é senão um ponto inatingível do calendário. 
 
Na eleição presidencial de 2022, a maioria do eleitorado decidiu retirar o Brasil da rota que leva ao universo da Terra plana. Não é concebível que, sob Lula, o Exército conduza o país ao mundo da Lua.

Com Josias de Souza