quinta-feira, 20 de junho de 2024

E LA NAVE VA GIU


A DIFERENÇA ENTRE ESTADISTA E POLÍTICO É QUE O ESTADISTA 
PERTENCE À NAÇÃO E O POLÍTICO PENSA QUE A NAÇÃO LHE PERTENCE.

Em março de 2020, três meses depois de alcançar os 120 mil pontos, o Ibovespa pegou Covid e caiu para 63.569. Restabelecido, voltou ao patamar anterior em 2021 e 2022 e beirou os 135 mil pontos em dezembro de 2023. Mas o ano virou e o vento mudou. 

Depois que os gringos sacaram R$ 4,63 bilhões em apenas dois dias, os 125 mil pontos foram para o beleléu. Agora, o iBov sua a camisa para retornar à casa dos 120 mil — e, pelo andar da carruagem, deve encerrar o ano bem abaixo dos 200 mil preconizados anteriormente pelos analistas mais otimistas.

A meta de déficit zero de Haddad ficou para 2025. O ex-poste e ex-bonifrate do ex-corrupto amarga seu pior momento no Ministério da Fazenda. Além de convencer Lula da necessidade de equilibrar as contas públicas, ele precisa resgatar a própria credibilidade como fiador do arcabouço fiscal. E servir a dois senhores é uma missão quase impossível — perguntado sobre a fórmula do sucesso, JFK disse que ela não existia, mas que a do fracasso era tentar agradar a todos. 

O ministro esperava arrecadar mais de R$ 29 bilhões com a "MP do Fim do Mundo", mas ela foi devolvida pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco. No passado, os parlamentares aprovaram medidas que aumentaram a arrecadação; agora, recusam-se a compactuar com o aumento da carga tributária — não por estarem preocupados com a situação periclitante dos "contribuintes", mas porque haverá eleições em outubro. 

Haddad diz que não há plano B, mas vai ter de negociar com o Congresso para "encontrar" os R$ 26 bilhões de que precisa para compensar a desoneração da folha de salários de 17 setores da economia e dos municípios de até 156,2 mil habitantes. O problema e que ele e Simone Tebet estão isolados. A ministra sugeriu a revisão da vinculação do salário-mínimo aos benefícios previdenciários, mas foi desancada nas redes por Gleisi Hoffman, presidente do PT, e criticada por Rui Costa e outros ministros palacianos contrários ao corte de despesas em ano eleitoral. Ninguém se dignou de defendê-la.

O desgaste do ministro não interessa ao governo nem (muito menos) ao mercado. "Se quem entrar se meter a besta, a inflação começar a subir e o mercado perder a confiança, vai ser um grande e rápido fiasco político", ponderou Armínio Fraga, ex-presidente do BC. O custo político da demissão seria elevado, sem falar que de nada adianta trocar as rodas da carroça quando o problema é o burro. 

Rumores sobre a troca de comando na Fazenda levaram líderes governistas a defender a permanência de Haddad no cargo. O senador  Jacques Wagner — que elogiou a devolução da MP por Pacheco — foi um deles, e o próprio Lula disse que Haddad é um ministro extraordinário e que desconhece pressões sobre ele. Mas o presidente se irrita com as discussões sobre o déficit fiscal. Dias atrás, disse que o aumento da arrecadação e a queda da taxa de juros reduzirão o déficit sem comprometer o investimento público. Ato contínuo, a Bolsa caiu e o dólar fechou o dia em R$ 5,42

Segundo um velho ditado, os sábios aprendem com os erros alheios e os tolos aprendem com os próprios erros. Lula não aprendeu nada nos dois reinados anteriores nem nos 580 dias de férias compulsórias que gozou em Curitiba. Dirige o país com os olhos no retrovisor, mas não é capaz de enxergar a própria imagem refletida no espelho. Talvez "caia na real" quando se der conta de que o trono está em risco. 

Sempre existe a possibilidade de um presidente não concluir o mandato ou de não mais caminhar entre os vivos para disputar a reeleição, mas análise é análise, torcida é torcida e fato e fato, e o fato é que imbróglio da MP 1.227 ainda não produziu um choque de realidade. Em abril, o déficit nominal atingiu o recorde de R$ 1,043 trilhão no acumulado de 12 meses, e a mudança da meta do arcabouço fiscal para 2025 tornou pior o que já era ruim. 

As falas de Lula e de Haddad contribuem para a desconfiança sobre a leniência em relação ao avanço de preços às vésperas da troca de comando do BC. Lula repete ad nauseam que Campos Neto "tem lado político" e o culpa por tudo que deu errado no mundo desde as 10 pragas do Egito. Em seu penúltimo ataque, tentou terceirizar os desafios impostos à política econômica — "não tem explicação a taxa de juros do jeito que está" — e pisou no economista ao revelar sua inconformidade com o jantar de 70 convidados oferecido ale por Tarcísio Gomes de Freitas no Palácio dos Bandeirantes (detalhes na entrevista à CBN).

Lula não está fazendo nada diferente do que fez desde o início de seu terceiro (e queira Deus derradeiro) mandato, e o próprio Campos Neto forneceu a munição para as críticas, sobretudo ao participar do tal jantar — procedimento que não orna com o caráter independente do Banco Central. O xamã petista sabe muito bem como explorar esses episódios, mas o tiro pode sair pela culatra se ele acreditar realmente que o BC é a única coisa desajustada no país.

 
A irresignação presidencial não influenciou a decisão sobre a Selic, que ficou mantida em 10,5% ao ano encerrando um ciclo de sete cortes seguidos. A unanimidade na decisão, ao contrário do que ocorreu na última reunião. A decisão mostra um Copom alinhado com investidores, já que não cedeu à pressão política de Planalto. 
 
Com o cenho carregado, a voz roufenha e o dedo indicador em riste como a cauda de um escorpião antes do bote, Lula acusou Campos Neto de usar a autonomia do BC como trampolim para acrobacias políticas e mimetizar o comportamento de Sergio Moro, que trocou a 13ª Vara de Curitiba pelo Ministério da Justiça sob Bolsonaro. Trovejou que, "se for necessário", ele disputará um quarto mandato "para evitar que trogloditas voltem a governar o país".

Observação: Em atenção aos desmeriados e descerebrados de sempre, cumpre esclarecer que o morubixaba petista se referiu ao mico do bolsomínions, que bateu no iceberg das urnas em 2022 quando o conservadorismo civilizado trocou o Titanic do capetão pelo "arco democrático" que reconduziu o molusco de Garanhuns, e afundou na inelegibilidade da Justiça Eleitoral depois que a direita neandertal que o elegera em 2018 foi para a rua no 8 de janeiro de 2023

Num ambiente polarizado como o atual, cara feia, dedo e riste e chuva de perdigotos não bastam para evitar que a "direita não-troglodita" migre para Tarcísio em 2026Lula terá que exibir resultados efetivos. E aí que a porca torce o rabo.