Faltando menos de um mês para as eleições municipais, Ricardo Nunes, Guilherme Boulos e Pablo Marçal estão tecnicamente empatados, Tábata Amaral aparece em 4º lugar e José Luiz Datena carrega a lanterninha. Pelo que se pôde inferir dos debates e do anacrônico "horário eleitoral gratuito" — gratuito para os partidos e candidatos, já que quem paga a conta somos nós — nenhum deles tem condições de administrar nem carrinho de pipoca, quanto mais a maior metrópole da América Latina. A proposta de Tábata é a "menos pior", mas, a julgar pelas pesquisas, a moça precisa de um milagre para chegar ao segundo turno.
No Brasil, presidente, governadores, prefeitos e senadores são eleitos com base no sistema majoritário, e deputados (federais e estaduais) e vereadores, pelas regras do sistema proporcional. Como eu comentei esses dois sistemas em outra postagem, vou resumir a ópera relembrando somente que, em municípios com mais de 200 mil eleitores inscritos, se nenhum candidato a prefeito obtiver 50% + 1 dos votos válidos no primeiro turno, os dois mais votados disputarão uma segunda eleição — conhecida como "segundo turno" — que é decidida por maioria simples, ou seja, vence o candidato mais votado.
Observação: Nos últimos 24 anos, o segundo turno das eleições paulistanas foi disputado por um candidato da esquerda contra um da direita. Mesmo em 2016, quando Dória venceu no primeiro turno, Haddad ficou em segundo lugar. Seguido esse padrão, um embate final entre dois candidatos da direita — no caso, Marçal e Nunes — é no mínimo improvável. Nesse cenário, Boulos deve representar a esquerda. Resta saber quem será seu oponente. Datena parece não ter a menor chance, e Tábata tem menos de um mês para se consolidar na disputa.
Situações desesperadoras exigem medidas desesperadas, mas abster-se de votar, votar em branco, anular o voto ou recorrer ao "voto útil" no primeiro turno é estupidez, mas a nefasta polarização vem produzindo pleitos plebiscitários, e um eleitorado despreparado, mal-informado e eivado de apedeutas e idiotas de carteirinha tende a votar não no candidato com quem mais se identifica, mas naquele que supostamente tem mais chances de derrotar o candidato "deles", o que acaba falseando o resultado final do pleito.
Magalhães Pinto ensinou que "política é como as nuvens; a gente olha e elas estão de um jeito, olha de novo e elas já mudaram" e Ciro Gomes, que "eleição é filme, pesquisa é frame". Se admitirmos que a opinião de alguns milhares de entrevistados representa fielmente o que pensam 9,32 milhões paulistanos aptos a votar, o resultado das pesquisas constitui um "instantâneo" do humor do eleitorado no momento da abordagem. O bom senso recomenda analisar os números com a devida cautela, mas explicar isso a quem sofre de cegueira mental é como dar remédio a um defunto.
Uma das características da democracia brasileira é produzir "salvadores da Pátria". Vimos isso em 1989 com Collor, em 2002 e 2006 com Lula e em 2018 com Bolsonaro. Talvez a história se repita em 2026, tendo como protagonista o "coach motivacional" que teve a candidatura ao Planalto barrada pelo TSE, conseguiu se eleger deputado federal, foi impedido de assumir e agora mira a prefeitura paulistana com um olho e a Presidência com o outro.
A exemplo de Bolsonaro em 2018, Marçal se vende como candidato "antissistema", mas já acena uma aproximação com o sistêmico União Brasil, que um dos principais partidos do Centrão. Se for eleito, cairá no colo do UB, exatamente como o "mito" caiu no colo do Centrão — e lhe deu o orçamento secreto em troca do engavetamento de 150 pedidos de impeachment.
Campanha eleitoral movida a ódio não é novidade por estas bandas, mas terminou mal todas as vezes que a raiva foi industrializada com propósitos políticos: Jânio renunciou, Collor foi impichado, Bolsonaro perdeu a reeleição, está inelegível, vive sob a sombra de uma sentença criminal esperando para acontecer enquanto posa de cabo-eleitoral de luxo. A diferença entre ele e Marçal é que as redes sociais dão a este um alcance maior que o daquele.
Campanha eleitoral movida a ódio não é novidade por estas bandas, mas terminou mal todas as vezes que a raiva foi industrializada com propósitos políticos: Jânio renunciou, Collor foi impichado, Bolsonaro perdeu a reeleição, está inelegível, vive sob a sombra de uma sentença criminal esperando para acontecer enquanto posa de cabo-eleitoral de luxo. A diferença entre ele e Marçal é que as redes sociais dão a este um alcance maior que o daquele.
Com a repetição do fenômeno de forma mais turbinada na seara municipal paulistana, resta torcer para que o eleitor despache a aberração antes que ela se consolide como um fenômeno eleitoral. A despeito de estar claro que se trata de um produto estragado, quem tem que comprá-lo ou não é o eleitor.